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Brasil
16/04/2017 08:27:00
É visível o silêncio das ruas em relação a Lava Jato, diz cientista político

Terra/PCS

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Para professor da PUC-RJ, as ruas estão em silêncio e o atual momento do país tem como protagonistas a mídia e o judiciário (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil )

Professor de Ciência Política da PUC-RJ, Luiz Werneck Vianna avalia que as delações da Odebrecht têm tido repercussão muito maior na imprensa do que nas casas dos brasileiros.

"É visível o silêncio das ruas em relação a tudo isso", afirma Vianna, que já lecionou na Unicamp e na Universidade Federal de Juiz de Fora e é autor de livros como A judicialização da política e das relações sociais no Brasil (1999) e Democracia e os três poderes no Brasil (2002).

Para ele, a abertura de investigações contra dezenas de líderes partidários citados pela empreiteira abre espaço para outsiders na política, mas não deve provocar transformações tão radicais em Brasília.

Em entrevista à BBC Brasil, ele afirma que grandes partidos abalados pelas delações - como PT, PSDB e PMDB - deverão passar por uma renovação, mas continuarão relevantes.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

BBC Brasil - Quais consequências as delações da Odebrecht terão para o governo?

Luiz Werneck Vianna - O governo Temer deve sobreviver - acho que ele deve cumprir o seu mandato. E deve também fazer as reformas com as quais vem se identificando. O apoio do Congresso continua forte.

BBC Brasil - A forma como a política é feita vai mudar? Haverá mudanças na relação entre partidos e empresas?

Vianna - Isso certamente vai sofrer uma mudança radical. Mas não creio que esse expurgo da classe política assuma a mesma proporção que asumiu na Itália [após a Operação Mãos Limpas, nos anos 1990]. Vai ser forte, mas não com a radicalidade da situação italiana. Acho muito difícil que partidos mais enraizados, como PT, PSDB e PMDB, saiam do mapa. Acho que eles ficarão, porque inclusive fora deles não há nada de novo surgindo.

Vianna, depois da delação da Odebrecht ter sido tornada pública: "É visível o silêncio das ruas em relação a tudo isso" (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil )

BBC Brasil - Novos partidos, como Rede, PSOL e Partido Novo, não são capazes de preencher espaços?

Vianna - Dificilmente. Eles não têm quadros, não têm programa. O PSOL é muito parecido com o que o PT foi em determinado momento, com a denúncia da corrupção e [a defesa da] ética na política. Mas qual o programa econômico do PSOL?

BBC Brasil - Com a crescente rejeição popular à política tradicional, há possibilidade de surgimento de outsiders ?

Vianna - O outsider é uma possibilidade real - para o bem e para o mal. Tem vários tentando furar esse nevoeiro e se projetar como alternativa. Por ora, nenhum deles é muito atraente.

BBC Brasil - Haverá algum esforço dos grandes partidos para estancar danos?

Vianna - Acho que sim, a reforma política vem aí. Não vem de forma muito aprofundada porque as circunstâncias não permitem. A cláusula de barreira deve vir, assim como a interdição das coligações eleitorais nas eleições proporcionais. Isso já tem um efeito muito saneador do quadro atual.

Luiz Werneck Vianna: "O PSOL é muito parecido com o que o PT foi em determinado momento" (Foto: Agência Brasil )

BBC Brasil - Na história brasileira, momentos de grande turbulência - como as revoltas do século 19 - se intercalam com momentos de acomodação de interesses e transições pacíficas, como na Independência. Qual característica vai predominar na crise atual?

Vianna - A grande massa, por ora - e isso pode mudar -, está apenas sentindo e observando de longe esses fatos. Esses fatos têm tido muito peso, muita vocalização na mídia. Uma coisa que se tem de considerar na política brasileira hoje é que a mídia se tornou ator político de peso considerável, mas ela não tem braço, não tem mãos. Tem apenas voz.

Não tivemos ainda as crises da Regência [período de grande turbulência entre a abdicação de dom Pedro 1º e o governo de seu filho, Pedro 2º]. Elas (as pessoas) não estão se manifestando. É visível o silêncio das ruas em relação a tudo isso.

Mas os partidos, as personalidades políticas sobreviventes podem procurar um caminho de salvação mútua. Isso está em curso. Será possível? Não sei, dependerá da habilidade e criatividade deles e, ao mesmo tempo, de que aceitem perdas. Esses partidos não poderão mais ser o que eram, vão ter que passar por mudanças.

Haverá uma renovação de pessoas. Não talvez com a carga necessária, porque se se olha toda movimentação que tem havido, há pouquíssimos quadros novos. Não surgiu quase ninguém [com os protestos] em junho de 2013.

A política brasileira tem sido muito pouco permeável a novas lideranças. Essa hora poderá ser a da grande mudança geracional? Tomara, mas depende de como vem essa geração. Porque, a tomar por algumas manifestações, elas não suscitam muita esperança.

BBC Brasil - O grande público não está tão abalado pelos acontecimentos?

Vianna - Se olharmos o registro das ruas, acho que não.

BBC Brasil - Como a situação atual se compara com outros grandes momentos da história brasileira?

Vianna - Certamente tudo isso vai ser lembrado. Agora, o que temos de novo aí? Primeiro o protagonismo da mídia. Segundo, do Judiciário. Ambos parecem que vieram para ficar. Mas a política deve reagir a isso.

O Brasil é muito grande. É muito diverso. É muito difícil haver formas muito vertebradas de expressão, no sentido de que unifiquem classes e regiões, dada a diversidade e a desigualdade existentes.

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