Quinta-Feira, 25 de Abril de 2024
Brasil
24/02/2018 10:41:00
'Tensão é permanente’, diz general que atuou em missão de paz no Haiti

O Globo/LD

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O plano de ação para a intervenção no Rio de Janeiro deve ser apresentado na semana que vem pelo general Walter Souza Braga Netto, responsável pela missão. Na avaliação do ex-comandante da missão de paz da ONU no Haiti, general da reserva Augusto Heleno Ribeiro, a situação no Rio é mais complexa que a do país caribenho. Ainda de acordo com o militar, é necessário um "exemplo vindo de cima" para resolver a crise no estado. Confira a entrevista com o ex-comandante Heleno Ribeiro.

Quais lições e aprendizados da experiência do Exército no Haiti devem ser levadas em conta na intervenção atual no Rio e por quê?

A permanente tensão, o contato com a população e a dificuldade de progressão se repetem, mas, aqui, com um grau de dificuldade bem maior. O risco de efeitos colaterais é evidente, e deve ser tratado com extrema atenção. A topografia é bem diferente, e a organização urbana é mais complexa no Rio de Janeiro.

A operação no Haiti foi elogiada inicialmente, mas, depois, foi alvo de questionamentos devido a suspeitas de abusos sexuais envolvendo as tropas, segundo a ONU. Como evitar que esses incidentes se repitam no Rio?

Não houve problemas desse tipo com a tropa brasileira. Provavelmente, não ocorrerão durante a intervenção.

O general Eduardo Villas Bôas (comandante do Exército) anunciou que as tropas precisam agir sem o risco de uma nova Comissão da Verdade. Por quê?

A Comissão da Verdade nasceu ideologicamente comprometida e agrediu a história do Brasil, distorcendo fortemente os fatos. Limitou-se a apreciar, com parcialidade evidente, causas e consequências do período que se propôs a averiguar; desconsiderou os crimes cometidos pela luta armada e limitou-se a investigar, de forma preconcebida, um dos lados do problema. O Exército se submete às fiscalizações previstas em lei e não vê razões para ser alvo de patrulhamento ideológico ou político do que insistem, erradamente, em chamar de sociedade civil.

A fala de Villas Bôas não pode soar como chancela para ações violentas das tropas que participam da intervenção?

Jamais. Em 13 anos no Haiti, isso não aconteceu, o que demonstra a índole dos militares e o apego à legalidade. Por que esse tipo de comportamento aconteceria e seria chancelado em território nacional? Há instrumentos para acompanhar de perto o comportamento dos participantes da intervenção. Espera-se que isso ocorra com isenção e sem ranço ideológico.

Esta semana também se discutiu muito sobre os mandados coletivos de busca e apreensão, instrumentos que já foram utilizados, mas que causaram grande repercussão na sociedade e no meio jurídico. Não são uma ofensa aos direitos individuais e de propriedade da população mais carente?

Gostaria que essa opinião fosse reavaliada depois que esses juristas e advogados se dispusessem a acompanhar uma operação e verificassem, in loco, as razões da solicitação de um mandado de busca coletivo em determinadas situações.

Por que não se vê mandados coletivos em bairros nobres da cidade, onde também há atuação do tráfico?

Porque a urbanização desses locais define perfeitamente quais imóveis deverão ser objetos de investigação.

Como fazer para que a violência e outros problemas sociais não voltem após a intervenção no Rio?

A intervenção, a meu ver, não vai dispor de tempo nem meios para resolver, de forma permanente, os inúmeros desafios que permeiam a segurança pública do Rio. Pode, isso sim, levá-la a um nível aceitável. Resultados duradouros requerem anos de gestão competente, honesta e focada. Dois pontos me parecem cruciais: exemplos vindos de cima e investimentos em educação, saúde e saneamento básico.

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