Quarta-Feira, 24 de Abril de 2024
Comportamento
10/12/2017 09:31:00
“Decidi ser feliz como sou”, afirma blogueira plus size
Renata Poskus Vaz é dona do Blog Mulherão e não vê problema algum em ser chamada de gorda

Terra/PCS

Imprimir

Renata Poskus Vaz, 99 kg e 1,72 m de altura, é dona do Blog Mulherão, que criou há quase 10 anos, como um diário pessoal, em que contava de maneira bem-humorada, as tentativas fracassadas de emagrecimento. Hoje, o site é um canal para a valorização e a autoestima da mulher gorda, palavra que Renata não acha nem um pouco ofensiva.

Aos 35 anos, Renata prova que os negócios relativos ao mercado plus size é um nicho em crescimento (Foto: Divulgação)

“Gorda é uma palavra que identifica uma característica física, só isso. Usá-la como um adjetivo normal, adotá-la, empregá-la em frases com seu real significado, ajuda a desconstruir o lado ofensivo que ao longo dos anos foi conferido a essa palavra.”

Aos 35 anos, Renata prova que os negócios relativos ao mercado plus size é um nicho em crescimento. Criadora do evento Fashion Weekend Plus Size, que já está em sua 17ª edição, viu o evento crescer de 10 para 16 grifes desde sua primeira edição em 2010, além de aumentar de 15 para 80 modelos plus size e de 400 pessoas para 1,5 mil na plateia. Ela também realiza o Dia de Modelo Plus Size, ensaio fotográfico com mulheres gordas, e o Mulherão Fashion Tour, que terá 40 grifes com vendas diretas ao consumidor final, em dezembro.

Em entrevista ao Terra, Renata fala como a autoestima das pessoas gordas pode ser minada dentro da própria casa, como reagir com bom humor a comentários inconvenientes e que, sim, os gordos podem comer um X-Tudo sem culpa. Confira suas ideias.

“Vi que era possível ser um mulherão”

“No início, o Blog Mulherão era um diário em que eu contava, de maneira bem-humorada, as minhas tentativas fracassadas de emagrecimento. A verdade é que eu já estava cansada de tentar emagrecer. Foram 27 anos tentando atingir o corpo e peso que os outros julgavam ideal para ser feliz, sempre sem sucesso. A cada dieta, eu ficava mais fraca, doente e frustrada. Até que decidi tentar ser feliz como sou. E é aí que o blog fez toda a diferença. Pude contar pelo que passava, rir de mim mesma e me propor a um novo recomeço, com menos encanação com relação ao meu peso e celebrando meu corpo como é. Troquei experiência com outras leitoras e vi que era possível sim realizar o meu sonho de ser um mulherão.”

“Manual de sobrevivência para as mulheres acima do peso”

“O Manual de Sobrevivência para Mulheres Acima do Peso, slogan do site, é uma brincadeira com quem acha que não é possível ser feliz não tendo as medidas de uma capa de revista. A começar pelo próprio termo: 'acima do peso’. Sempre reforço que devemos questionar o que é este tal acima do peso. A medicina já comprova que o IMC não é uma medida que de fato indique saúde. Afinal, nem todo magro é saudável e nem todo gordo é doente.

Renata Poskus Vaz, 99 kg e 1,72 m de altura, é dona do Blog Mulherão, que criou há quase 10 anos, como um diário pessoal, em que contava de maneira bem-humorada, as tentativas fracassadas de emagrecimento (Foto: Divulgação)

“ Sou muito vaidosa, quando eu quero”

“Outro dia eu estava conversando com amigos, no barzinho em frente ao meu prédio, de cara lavada e uma roupa confortável, quando um vizinho com quem nunca conversei na vida e que até então nem sabia que existia, veio me perguntar o que estava acontecendo comigo. Pois, segundo ele, eu andava sempre tão arrumada e agora andava "daquele jeito". Eu, bem-humorada, respondi: ‘De que jeito? Confortável e feliz?’. Ele ficou sem saber o que falar, então complementei: ‘Eu não tenho obrigação de andar montada 24h por dia para você’.

A mulher gorda tem que ter muita autoestima para se permitir comer um X-Tudo na frente de todo mundo, de andar sem maquiagem, chinelo e camisetão. Não temos obrigação de andar superproduzidas o tempo todo para compensar a ausência de um corpo ‘perfeito’. Sou sim, muito vaidosa, adoro uma roupa nova e um salto alto, mas quando eu quero e porque eu quero.”

" Não me calo, não ignoro"

“Cadeiras de plástico já quebraram comigo. Há cadeiras de restaurante com braços em que eu não consigo sentar. Meu vestido já ficou preso na catraca de ônibus. Eu reclamo. Antigamente não reclamaria, pois me sentiria culpada por estar gorda e ficaria com medo de ouvir (como já ocorreu), que a solução seria eu emagrecer. Mas, hoje, penso em mulheres que são maiores que eu, que sofrem de fato a gordofobia todos os dias. Eu não brigo só por mim, brigo por elas. Eu reajo respondendo, encarando. Não me calo, não ignoro. Ser bem resolvida não nos poupa de escutar de um cara que tem vergonha de se relacionar com a gente, de ouvir piadas de amigos, de não caber em cadeiras... O que muda, quando se tem autoestima, não é o que você vai viver ou escutar, é como reagirá a tudo isso. Não é o fim do mundo.”

Gorda, sim

“Gorda é uma palavra que identifica uma característica física, só isso. Usá-la como um adjetivo normal, adotá-la, empregá-la em frases com seu real significado, ajuda a desconstruir o lado ofensivo que ao longo dos anos foi conferido a essa palavra. Ainda tenho leitoras dando seus primeiros passos rumo ao resgate da autoestima e que se sentem ofendidas com a palavra gorda, me corrigem, dizem que sou mal-educada ao me referir às minhas leitoras gordas como gordas. Eu respondo: ‘Mas você é gorda, aceite’. Elas preferem eufemismos: fofinha, gordinha, cheinha... Repare, são sempre nomes no diminutivo, que nos infantilizam.“

"Preguiçosa, relaxada, feia"

“Quando conheço algum paquera em aplicativo, se refiro-me a mim mesma como gorda, logo escuto: 'Você não é gorda, é linda". E respondo: "Eu não disse que era feia, só disse que sou gorda". Acho importante mostrar para as pessoas a diferença. Crescemos acreditando que a mulher gorda é preguiçosa, relaxada, feia. Então, é comum que homens não queiram assumir que se sentem atraídos por uma mulher gorda. Mesmo que estejam com uma, preferem dizer que estão com um mulherão, uma cavala, uma mulher grandona, nunca usam o termo gorda. Não tenho nada de preguiçosa, trabalho 18 horas por dia. Não sou relaxada, tampouco feia. Aceitar a palavra gorda como uma característica física, um adjetivo, desarmou aqueles que desejavam me ofender e me fez perceber o quanto sou ainda mais especial.”

Renata fala como a autoestima das pessoas gordas pode ser minada dentro da própria casa, como reagir com bom humor a comentários inconvenientes e que, sim, os gordos podem comer um X-Tudo sem culpa (Foto: Divulgação)

Namorado com vergonha

“Logo depois de criar o Blog Mulherão, eu tomei um fora de um namorado que vivia me colocando para baixo. Ao longo de três anos de namoro, ele sempre fazia questão de me colocar defeitos, de me comparar com a ex-namorada dele que, segundo suas palavras, era muito linda e gostosa e chamava a atenção de todos. Enquanto amigas ganhavam flores no Dia dos Namorados, eu ganhava compostos emagrecedores e tênis de presente, para me estimular a andar mais a pé. Eu me sentia feia, gorda, insuficiente e culpada por ser tratada mal e menosprezada enquanto mulher.”

Dia de Modelo Plus Size

“Quando ele finalmente me deixou, ao invés de seguir minha vida, só pensava em reconquistá-lo, pois, na minha cabeça, ninguém iria gostar de mim gorda e feia, como eu acreditava ser. Eu não tinha fotos sozinhas nas redes sociais, estava sempre escondida atrás dele ou de alguém, com vergonha do meu corpo. Foi aí que tive a ideia de reunir algumas leitoras do blog para fazermos um Dia de Modelo Plus Size. Achava que com fotos novas, o ex-namorado viria atrás de mim. Contratei fotógrafo, equipe de maquiagem e penteado, reuni um acervo de roupas para gordinhas e, com minhas leitoras, fiz um ensaio fotográfico incrível. E aconteceu o que eu esperava. O ex-namorado veio atrás de mim. Mas eu já não o queria mais.”

Pazes com o espelho

“Aquela experiência foi transformadora, pois eu vi naquele ensaio fotográfico mulheres que tinham quase o dobro do meu tamanho, que usavam manequins maiores, super bem resolvidas, amadas por seus maridos... Elas foram a minha inspiração para que eu fizesse as pazes com o espelho. O Dia de Modelo se tornou um negócio. Até hoje ele existe. Já produzi ensaios fotográficos para mais de 2 mil mulheres de todo o país. Conquistei minha independência financeira fazendo outras mulheres felizes.”

COMENTÁRIO(S)
Últimas notícias