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12/02/2019 15:32:00
Helicóptero em que estava Boechat tentou fazer pouso forçado após pane no motor, dizem especialistas

G1/LD

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Um problema técnico inesperado no motor, como perda de potência, pane elétrica ou falha em uma peça, foi possivelmente o que levou o piloto Ronaldo Quattrucci a tentar um pouso forçado na Rodovia Anhanguera, em São Paulo, nesta segunda-feira (11), segundo especialistas ouvidos pelo G1.

A aeronave acabou colidindo frontalmente com um caminhão, que vinha a 40 km/h, segundo o motorista em depoimento à polícia. Além do piloto, o jornalista Ricardo Boechat, da Band, morreu no acidente.

A pedido do G1, peritos e investigadores analisaram imagens e vídeos do acidente e foram unânimes em apontar que o comandante Quattrucci teria se deparado com uma falha no motor ou no rotor e optado por um procedimento de urgência chamado de “autorrotação”. Nesta técnica, busca-se forçar um pouso e, em seguida, deslizar sobre uma superfície (no caso, a rodovia), "correndo" de forma semelhante a um avião. O objetivo é que, mesmo que haja a destruição da aeronave, os tripulantes e passageiros sobrevivam.

Mas, um caminhão, com placas de Caxias do Sul (RS), havia acabado de passar pelo posto de cobrança automática do pedágio da Anhanguera, sentido Castello Branco, e estava na rota do helicóptero.

A carroceria frontal do veículo foi totalmente destruída e o caminhoneiro João Adroaldo Tomackeves, de 52 anos, ficou preso nas ferragens, sendo retirado do local com ferimentos leves.

“Tudo indica que houve uma pane no motor ou no rotor do helicóptero, que fez o piloto optar por um pouso forçado. Uma perda de potência ou uma peça pode ter se quebrado, ou alguma falha no combustível, algo repentino pode ter acontecido. Ele não teve muito tempo para escolher outro lugar (para pousar), optou por fazer o pouso na pista da rodovia mesmo, o que tinha à frente naquele momento e mais seguro”, diz o coronel da reserva da FAB Luis Claudio Lupoli, que foi investigador Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), órgão responsável por apurar acidentes aéreas no Brasil.

Câmeras do Rodoanel registraram o helicóptero fazendo uma trajetória descendente. Para Lupoli, o piloto tentou, primeiro, pousar em uma área verde, no meio da curva de subida da Anhanguera para o Rodoanel, para, em seguida, "voltar a acelerar para tentar pousar mais à frente na rodovia, ou ao lado dela".

“Pelas imagens e a forma como ocorreu a colisão com a caminhão, parece que o piloto tentou pousar na rodovia mesmo, entre as duas pistas do Rodoanel Mário Covas. Há alguns boatos que falam que ele poderia ter tentado pousar em cima, no Rodoanel mesmo, mas isso é pouco provável. Para mim, ele tentou pousar na rodovia embaixo, até porque que era mais seguro para o helicóptero, o que facilitaria a condição de deslizar na pista, até porque há casas e áreas residenciais próximas”, acrescenta o investigador.

“Ele escolheu ali porque não tinha condições de seguir mais adiante, de escolher um lugar melhor. E era rezar para não vir um carro, ou que o veículo tivesse tempo de desviar”, entende Lupoli.

Marcas da aeronave no asfalto e a forma como ela se despedaçou e se espalhou pela Anhanguera irão ajudar os investigadores a determinar se havia ou não potência no motor e a velocidade do helicóptero no momento da colisão com o caminhão e se era ou não a intenção do piloto o pouso forçado com autorrotação.

Pilotos de helicópteros ouvidos pela reportagem concordam com a hipótese de Lupoli. “Parece-me que houve algum problema técnico e o comandante tentou fazer um pouso de emergência, e ele viu que a alça de acesso do Rodoanel era o melhor lugar. Houve azar de vir um caminhão pela frente”, diz o engenheiro aeronáutico Shailon Ian.

“Se não tivesse o caminhão, o piloto tentaria uma autorrotação, ele faria um pouso corrido e ia escorregar no asfalto, até parar”, diz o engenheiro.

O helicóptero saiu de Campinas, no interior de São Paulo, onde Boechat participou, na manhã de segunda, de um evento, e seguia para a sede do Grupo Bandeirantes, no Morumbi, Zona Sul da capital. O piloto tinha 56 anos é considerado experiente por amigos e pela Associação Brasileira de Pilotos de Helicóptero (Abraphe), que salientou que Quattrucci "seguiu à risca as doutrinas de segurança até o último momento, na tentativa de preservar a vida da tripulação a bordo do helicóptero".

"Importante destacar, ainda, a experiência de quase duas décadas do comandante, as licenças regulares, bem como as características e potencial da aeronave que comandava", disse a entidade em nota.

'Pulo' do helicóptero

O ex-investigador do Cenipa entende ser “pouco provável” a hipótese do passageiro, no caso o jornalista Ricardo Boechat, ter “saltado” do helicóptero, na tentativa de se salvar. A vendedora Leilaine Rafael da Silva, de 29 anos, estava na garupa de uma moto, ao lado do caminhão, e relatou ter presenciado o acidente.

“Uma pessoa pulou do helicóptero. O piloto ficou dentro do helicóptero. A pessoa que caiu na pista era o que tinha pulado. Ele pulou na pista, caiu no chão, e o helicóptero caiu em cima dele", disse a vendedora à polícia.

Para Lupoli, porém, o mais provável é que o passageiro “tenha sido arremessado” para fora do helicóptero após a colisão com o caminhão.

“Difícil ter pulado. Quando você pega uma testemunha visual de acidentes deste tipo, ela, às vezes, pode perder o tempo certo das coisas, pode ter confundido que ele foi jogado para fora com tentado saltar. No momento da tentativa de pouso, em velocidade acelerada, seria difícil alguém saltar. Pelas imagens do vídeo também tudo leva a crer que ele foi jogado na colisão”, entende o investigador, que foi o representante do Brasil na apuração internacional realizada para descobrir as causas da queda de um Airbus da Air France no Oceano Atlântico em 2009, deixando 228 mortos.

Manutenção

Um dos fatores que será analisado pelo Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Seripa-4), órgão do Cenipa que irá apurar o caso em São Paulo, é a situação de manutenção do helicóptero, já que o Bell havia sido fabricado em 1975. Segundo o site da empresa proprietária, RQ Serviços Aéreos Especializados Ltda, de propriedade do piloto que conduzia o helicóptero, a aeronave tem um alcance de 500 km e velocidade de 170 km/h.

“O fato de ser de 1975 quer dizer muito pouco sobre a aeronave, já que ela pode ter sofrido muitas mudanças de peças e de motor ao longo dos anos. O Bell é uma aeronave segura e reconhecida pela qualidade. O importante para a investigação será analisar quando foi a última manutenção e o histórico da aeronave”, diz Lupoli.

O engenheiro aeronáutico Shailon diz ainda que, os detalhes técnicos de histórico de manutenção do helicóptero irão fornecer informações adicionais, como a quantidade de horas de voo e a referência a problemas, recentes ou não, que poderão ajudar em inspeções ou perícias adicionais.

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