G1/LD
Definição do Google mencionava 'professora' como 'prostituta' — Foto: Reprodução Definição do Google mencionava 'professora' como 'prostituta' — Foto: Reprodução
Definição do Google mencionava 'professora' como 'prostituta' — Foto: Reprodução
O resultado da busca no Google para a palavra "professora" virou alvo de críticas nas redes sociais e entre entidades ligadas aos docentes. Além do significado tradicional, que é “mulher que leciona”, o site exibiu uma segunda definição logo depois da principal: “prostituta que inicia os adolescentes na vida sexual”. Após a repercussão negativa, o site de buscas editou o verbete e removeu nesta quarta-feira (23) a segunda definição, considerada pejorativa.
Na terça (22), a assessoria de imprensa do Google havia informado que o site estabelece parcerias com dicionários, por exemplo, “para fornecer informações e serviços que os usuários procuram”. “Licenciamos seu conteúdo para oferecer respostas úteis diretamente na página de resultados da busca”, afirmou a nota. Em outras palavras: o Google apenas apresentaria o significado elaborado por dicionários.
Segundo nota do Google enviada ao G1, a empresa diz que a mudança no resultado da busca é reflexo de decisão tomada por um parceiro de conteúdo.
"Em relação à palavra 'professora', a Oxford University Press, nossa parceira que trabalha com tradicionais editores de dicionário no Brasil, determinou que a segunda definição está em desuso e não é atual o bastante para ser incluída. A Oxford University Press removeu a definição e essa mudança está refletida nos resultados de dicionário exibidos na Busca para 'professora'." - Google
Em consulta feita pelo G1 à página de três dicionários, o emprego e a ordem de exibição da definição criticada são os mesmos que apareceram no Google.
Registro do uso informal
Professores de português consultados pelo G1 e as editoras do Aurélio e do Houaiss explicam que os dicionários têm a opção de registrar o uso informal da língua – e isso inclui termos preconceituosos ou depreciativos, palavrões e regionalismos. Não significa que as instituições que publicaram essas obras aprovem, por exemplo, que alguém utilize o termo “professora” para se referir a prostitutas.
“Culpar o dicionário por isso é o mesmo que culpar o termômetro pela febre. A obra apenas faz um registro do uso da palavra em determinado contexto. No Houaiss, no Michaelis e no Google, há a sigla sinalizando que é uma variante informal típica do Nordeste”, explica Henrique Braga, autor de português do Sistema Anglo de Ensino.
Antunes Rafael, professor de língua portuguesa e diretor do Colégio Oficina do Estudante (SP), explica que é preciso fazer uma reflexão sobre o emprego da palavra na sociedade. “O dicionário não está concordando nem dizendo que é o significado real do termo. Apenas escancara a opinião de grupos que ainda usam uma conotação sexual para se referir à mulher”, diz Rafael.
“As professoras são alvo de preconceito em salas de aula e em escolas. É uma abordagem que precisa ser combatida – mas o problema não é o dicionário.” - Antunes Rafael, professor de língua portuguesa.
No uso corrente de um idioma, é comum que as palavras adquiram novos sentidos. Sérgio Nogueira, mestre em língua portuguesa, lembra, por exemplo, que é comum ouvir jogadores se referirem ao técnico como “professor”.
“Os dicionários são independentes e têm o direito de escolher se registram o uso informal de uma palavra. Rapariga, por exemplo, em Portugal, é ‘moça’. Em determinadas regiões brasileiras, é ‘prostituta’. Registrar isso não significa concordar com a ideia”, explica.
Editoras justificam verbete
Em nota, o Aurélio afirma que "inserir um regionalismo como uma das acepções possíveis para uma palavra é ação natural de um dicionário, que deve apresentar o maior número possível de significados para um termo".
"Quanto ao público-alvo da obra, é importante destacar que a obra Aurélio 5ª edição está indicada para um público que pode acessar palavras como essas. No Míni Aurélio 8ª edição, indicado para crianças e jovens, o verbete 'professora' tem apenas uma acepção: 'mestra'", explica o texto.
O Instituto Antonio Houaiss segue o mesmo raciocínio:
"Os dicionários não usam as palavras que registram para ofender, menosprezar ou caçoar de ninguém. Apenas registram o que encontram no uso da língua", diz a nota.
E prossegue: "são como um espelho que reflete os conceitos mais nobres e belos, tanto como os mais agressivos e grosseiros que encontram, e fazem-no cientificamente, sem julgamento de valor".
O Houaiss também afirma que não adianta omitir um significado do dicionário. "Varrê-los para debaixo do tapete não significaria eliminá-los da língua, infelizmente", diz.
Já a editora Melhoramentos esclarece que atualizará a versão digital do "Michaelis" e a próxima edição da obra impressa. "O termo pejorativo faz parte do livro 'Dona Flor e seus dois maridos', de Jorge Amado (1966), e é adotado por dicionários desde a década de 70. Mas a língua está sempre em movimento, mudando, adaptando-se", informa.
Apeoesp faz notificação
A Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) chegou a protocolar, na terça-feira (22), uma notificação extrajudicial contra o Google.
A presidente do órgão, deputada Professora Bebel, afirma que o provedor é responsável pelas publicações elencadas na ferramenta de busca. Por isso, exigiu que o conteúdo fosse retirado imediatamente do ar, por causar "grande constrangimento e revolta de todos que respeitam as professoras deste país".