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Imprimir"Ó, o Maconha e o LK me bateram por conta disso, aí eu chamei a polícia e eles correram. Mas eu acho que eles estão putos comigo, eu vou ter que sair daqui", enviou Gabriela de Oliveira Belentani em um aplicativo de mensagens, horas antes de morrer.
A jovem, de 18 anos, executada no dia 10 deste mês, foi a sétima vítima de feminicídio de Campo Grande em 2023.
Um dos responsáveis pela sua morte, identificado como Anderson, o "Mmaconha", foi preso no último fim de semana. Era ele quem pilotava a moto que carregava Lucas Henrique, o "LK", que efetuou os disparos contra Gabriela no momento em que ela pegava carona para deixar o bairro onde morava.
Na manhã desta segunda-feira (20), as delegadas Elaine Benicasa e Analu Ferraz, da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) falaram em coletiva de imprensa sobre o caso.
Segundo Benicasa, a vítima já teria mantido relacionamento amoroso com ambos os citados, e na madrugada do dia 10, por volta das 2 horas da manhã, ela teria dito que contaria do envolvimento com Maconha à sua atual namorada, chamada Jéssica, o que gerou certa "ira" no rapaz.
Ele convocou então seu comparsa, LK, para ir até a casa de Gabriela. Ao chegar no local, eles agrediram a vítima, que pediu socorro à polícia.
"Em virtude dessas agressões, Gabriela acionou a Polícia Militar, que compareceu no local e chegou a ir atrás dos dois autores, porém sem sucesso, porque ambos acabaram se evadindo do local, pulando o muro, inclusive se machucando. Por esses motivos, eles se iraram ainda mais", afirmou Benicasa.
Os homens retornaram às 19h do mesmo dia, no momento em que Gabriela saía de carona com um vizinho para deixar o bairro. Ambos estavam na mesma motocicleta, pilotada por Maconha. LK, que estava na garupa, foi o responsável por efetuar os disparos.
Gabriela chegou a ser socorrida, mas não resistiu aos ferimentos. Os dois homens empreenderam fuga, e até agora apenas o condutor da moto foi preso.
Troca de mensagens
"Ela já estava temerosa que pudesse acontecer alguma coisa com ela, por isso que ela estava tentando sair do bairro naquele dia", avaliou a delegada Analu Ferraz.
Foram as mensagens no aparelho celular da vítima que ajudaram a compreender o caso.
"O Maconha disse no interrogatório que ele nunca chegou a ter nenhum tipo de envolvimento com a Gabriela, mas em conversas no aparelho celular da vítima é possível ver que eles tinham um relacionamento, ele ficava com ela às vezes, e ela fez com que isso chegasse aos ouvidos da da da atual companheira do Maconha. Foi o que gerou toda a discussão, porque ela também tinha um envolvimento com o LK", disse a delegada.
As agressões sofridas pela vítima também foram comentadas por ela através de mensagens.
"Na madrugada que começou a discussão eles se juntaram e bateram na Gabriela, e aí, no celular dela, ela enviou 'ó, juntaram o Maconha, o LK e me bateram por conta disso, e aí eu chamei a polícia e eles correram, mas eu acho que eles estão putos comigo eu vou ter que sair daqui'", revelou Analu.
Testemunhas
Inicialmente, a principal suspeita era de que o ex-namorado de Gabriela, que não teve o nome divulgado, pudesse ter sido o autor dos disparos. A primeira testemunha ouvida, o senhor que dava carona para Gabriela, havia feito descrição do autor, que também "combinava" com o perfil do ex-companheiro da vítima. Sendo assim, foi pedida a prisão temporária.
No decorrer das investigações, foi identificado que o suspeito não se tratava do ex-namorado de Gabriela. Apesar da revogação do mandado de prisão, o homem foi identificado e encaminhado à delegacia. Mesmo não estando envolvido no crime, ele testemunhou a execução, e seu depoimento ajudou nas investigações.
"Ele foi ouvido, mas foi solto no mesmo dia, porque saiu o alvará de soltura dele, então ele não chegou a ficar preso. Mas o depoimento dele foi de suma importância para a decretação da prisão dos outros, porque ele estava na rua no momento dos fatos, então ele viu a execução", afirmou Analu.
Foi o rapaz quem identificou que Maconha conduzia a moto, e que LK efetuou os disparos.
Foragido
O autor dos disparos, o LK, segue foragido. As delegadas reforçam que o homem, além de possuir mandado de prisão pela morte de Gabriela, também já era procurado por uma tentativa de homicídio.
"A PM já estava atrás dele por ter tentado tirar a vida de uma senhora dias atrás. Então são autores que não são primários, e que na sua prisão precisamos ter certa cautela para que nada saia do controle", afirmou Benicasa.
Orientação
"Se a mulher foi agredida, ela tem que pedir Socorro. Ela tem que acionar. Parachegar no feminicídio é muito imprevisível, você não tem como esperar ou não pedir ajuda", defendeu Analu Ferraz.
As delegadas avaliaram que Gabriela agiu corretamente ao pedir por socorro quando sofreu as agressões.
"Ela agiu corretamente, né? Ela pegou e chamou a polícia. A polícia militar compareceu ao local, tanto que ambos fugiram. Mas, infelizmente, retornaram e acabaram tirando a vida dela. É realmente algo imprevisível. A gente tenta com os acionamentos corretos, evitar o máximo possível, mas muitas vezes, infelizmente, é inevitável", avaliou Benicasa.
NÚMEROS
Em vigor desde 2015, a Lei do Feminicídio nº 13.104 não impede que mulheres de Mato Grosso do Sul continuem sendo mortas pela condição de sexo feminino.
Conforme noticiado antetiormente pelo Correio do Estado, o ano passado foi o ano recorde em feminicídios no Estado desde que a lei foi instituída. Foram 49 vítimas.
Neste ano, 26 mulheres já morreram por feminicídio em Mato Grosso do Sul, sendo sete delas de Campo Grande e 19 do interior do Estado.
"Nós éramos o estado em que mais havia crimes de feminicídio. Creio eu que isso possa, se Deus quiser, diminuir em razão de todo o trabalho desenvolvido. Esse ano infelizmente tivemos 7 vidas perdidas em Campo Grande, mas em comparação com o ano passado, foram 14 vidas de mulheres perdidas. Então é importante essa reflexão pra manter todo esse trabalho que vem sendo desenvolvido por toda a rede e a Deam faz parte", destacou Benicasa.
COMO DENUNCIAR
A Central de Atendimento à Mulher – pelo número 180 – presta escuta e acolhida qualificada a mulheres em situação de violência. O serviço registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgãos competentes.
A ligação é gratuita e o serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana. Em caso de emergência, a mulher ou alguém que esteja presenciando alguma situação de violência podem pedir ajuda por meio do telefone 190, da Polícia Militar.