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Polícia
04/04/2016 06:30:00
Sem data para julgamento, caso Bernardo completa dois anos
Menino foi encontrado morto em Frederico Westphalen, RS, aos 11 anos. Processo está parado porque três réus tentam cancelar júri popular.

G1/PCS

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Cartazes e flores são deixados em frente à casa onde Bernardo morava (Foto: Rafaella Fraga/G1)

Há dois anos, a morte do menino Bernardo Boldrini, então com 11 anos, comovia o país. O caso, porém, ainda não teve um desfecho. Desde abril de 2014, os quatro réus estão presos, e atualmente aguardam julgamento: o médico cirurgião Leandro Boldrini, 40 anos, pai da criança, a madrasta Graciele Ugulini, 38, a amiga dela, Edelvânia Wirganovicz, 42, e o irmão Evandro Wirganovicz, 33.

A etapa das audiências já foi concluída. Em agosto do ano passado, o juiz Marcos Luís Agostini, de Três Passos, cidade gaúcha onde o menino morava, decidiu que o quarteto irá a júri popular. No entanto, ainda não há data para que isso aconteça. Enquanto isso, a defesa de três réus tenta reverter a decisão judicial. O recurso adia a marcação do julgamento.

Bernardo desapareceu no dia 4 de abril de 2014, data em que foi morto. O corpo do menino só foi encontrado dez dias depois, envolto em um saco plástico e enterrado em um buraco na área rural de Frederico Westphalen. A cidade fica a cerca de 80 quilômetros de Três Passos, onde ele nasceu e onde vivia com a família – o pai, a madrasta e a meia-irmã mais nova.

A Polícia Civil investigou e concluiu que o menino morreu em razão de uma superdosagem do sedativo midazolan. Graciele e Edelvânia teriam aplicado o medicamento que levou o garoto à morte. Depois, as duas teriam recebido ajuda de Evandro para fazer a cova e ocultar o cadáver. A denúncia do Ministério Público ainda apontou que Boldrini foi o mentor de todo o crime.

O processo do Caso Bernardo acumula mais de 6,6 mil páginas, distribuídas em 32 volumes. Ao todo, 53 pessoas foram ouvidas em audiências realizadas nos dois últimos anos. Foram 25 testemunhas de acusação, e 28 de defesa, em 18 audiências realizadas ao longo do ano passado.

Os quatro réus foram ouvidos em maio, em Três Passos. Graciele e Edelvânia preferiram se calar, mas Boldrini e Evandro falaram ao juiz. Ambos negaram qualquer participação no crime.

Boldrini detalhou como era a relação com o filho, como foi o dia da morte do menino e alegou ainda que foi traído por Graciele. Evandro se disse inocente e chorou durante o depoimento.

Sessão que julgará recurso dos réus pode ser retomada em abril A decisão sobre o júri popular saiu em 13 agosto de 2015. Para o juiz, há indícios suficientes de autoria do crime, em relação aos quatro denunciados. Assim, eles serão julgados pelo Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, onde os jurados decidirão se são culpados ou inocentes.

Os advogados de Boldrini, Graciele e Evandro, entretanto, contestam a decisão. Os defensores dos três recorreram, na tentativa de suspender o júri popular.

O recurso começou a ser apreciado em sessão na 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), em Porto Alegre, no dia 27 de janeiro deste ano. Porém, um pedido de vista do desembargador Honório da Silva Neto suspendeu a sessão, trancando o andamento do processo e impedindo, por exemplo, que a data do julgamento seja marcada.

A 1ª Câmara Criminal é formada por três desembargadores. O relator do Sylvio Baptista Neto negou o apelo dos réus, e a desembargadora Cláudia Maria Hardt não chegou a votar, e aguarda a vista do colega. As próximas sessões estão marcadas para os dias 6 e 20 de abril, mas não há garantias de que a pauta retorne para julgamento.

O assistente de acusação, e advogado de defesa de Jussara Uglione, a avó de Bernardo, não sabe o que esperar da decisão, e não descartou que haja alguma surpresa.

Bernardo e a mãe, Odilaine: polícia concluiu que ela se matou em 2010 (Foto: Reprodução/RBS TV)

"O processo tinha um procedimento de trâmite exemplar, agora está estranhamente parado com um desembargador que pediu vista. E pode vir qualquer tipo de decisão, tanto é que uma das defesas já alegou excesso de prazo (interpôs um habeas corpus). Tem algo que precisa ser apurado", ponderou Marlon Adriano Balbon Taborda.

Defesas não se pronunciam

O G1 procurou as defesas dos quatro réus para falar sobre o caso. Por meio de nota, os advogados Ezequiel Vetoretti e Rodrigo Grecellé Vares, que defendem Boldrini, afirmaram que "têm por princípio fazer todas as manifestações apenas nos autos dos processos, preservando o respeito ao juízo e mantendo a discussão apenas no âmbito judicial".

Por telefone, o advogado Vanderlei Pompeo de Mattos, que atua na defesa de Graciele, reforçou que prefere não se pronunciar. Os advogados Hélio Francisco Sauer, de Evandro, e Gustavo da Costa Nagelstein, de Edelvânia, não atenderam as ligações e também não responderam aos e-mails enviados.

Relembre o caso

  • Bernardo foi visto vivo pela última vez no dia 4 de abril de 2014. No início da tarde daquele dia, uma sexta-feira, Graciele foi multada por excesso de velocidade na ERS-472, em um trecho entre os municípios de Tenente Portela e Palmitinho. A mulher trafegava a 117 km/h e seguia em direção a Frederico Westphalen, que fica a cerca de 80 quilômetros de distância de Três Passos, onde a família residia. O Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM) disse que ela estava acompanhada do menino.

    • Bernardo morava com o pai, a madrasta e a filha do casal, à época com cerca de um ano, em uma casa em Três Passos. A mãe do menino, Odilaine, foi encontrada morta dentro da clínica do então marido em fevereiro de 2010. À época, a polícia concluiu que ela cometeu suicídio com um revólver. A defesa da mãe dela, Jussara Uglione, contestou a versão. O inquérito foi reaberto. Concluído em março deste ano, a nova investigação não apontou indícios de homicídio. Para a polícia, Odilaine se matou.

  • A relação do pai e da madrasta com Bernardo era conturbada. Vídeos gravados no celular do pai e recuperados durante a investigação da morte do menino mostram brigas na casa da família e evidenciam a tensão doméstica entre os três. Em um deles, o menino grita por socorro, e discute com Graciele, que o ameaça. Em outro, o garoto pega um facão na mão, e é provocado pelo pai. As imagens são de 2013, um ano antes da morte de Bernardo.

Ele aparece deixando a caminhonete da madrasta, e saindo com ela e com Edelvânia. Quase duas horas depois, as duas retornam para o mesmo local, mas sem Bernardo (assista ao lado). O vídeo foi decisivo para as investigações, porque mostra a madrasta chegando com Bernardo e retornando sem ele, esclarecendo também a participação de Edelvânia no caso, que dias depois revelou o local onde o garoto foi enterrado.

  • O menino foi dado como desaparecido. O pai procurou a polícia para registrar o sumiço do filho no dia 6 de abril, um domingo. O corpo dele foi encontrado no dia 14 de abril, enrolado em um saco plástico e enterrado em uma cova rasa, em um matagal de Frederico Westphalen.

  • Para a Polícia Civil, Bernardo foi morto com uma superdosagem do sedativo midazolan. Graciele e Edelvânia teriam aplicado o remédio que causou a morte do garoto e depois teriam recebido a ajuda de Evandro para cavar a cova e enterrar o corpo.

  • A denúncia do Ministério Público ainda apontou que o pai atuou como mentor do crime, juntamente com Graciele. Segundo o MP, interceptações telefônicas (ouça os áudios) e laudos periciais comprovam. Boldrini nega.

    • Em vídeo divulgado pela defesa de Edelvânia, ela mudou sua versão sobre o crime. Nas imagens (assista ao lado), ela aparece ao lado do advogado e diz que a criança morreu por causa do excesso de medicamentos dados pela madrasta. Na época em que ocorreram as prisões, Edelvânia havia dito à polícia que a morte se deu por uma injeção letal e que, em seguida, ela e a amiga Graciele jogaram soda cáustica sobre o corpo,para dissolver a pele do menino e eliminar provas. A mulher ainda diz que o irmão, Evandro, é inocente. A defesa de Graciele não comentou a nova versão.

  • Em 16 de maio de 2014, a Justiça aceitou a denúncia contra os quatro, que tornaram-se réus no processo. Boldrini, Graciele e Edelvânia respondem por homicídio quadruplamente qualificado (motivos torpe e fútil, emprego de veneno e recurso que dificultou a defesa da vítima) e ocultação de cadáver. O pai também responde por falsidade ideológica. Já Evandro é acusado de homicídio simples e ocultação de cadáver.

  • Um ano e três meses depois, saiu a sentença de pronúncia, que determinou o julgamento popular dos quatro réus. Ainda não há data para o julgamento. Enquanto isso, os advogados de Boldrini, Graciele e Evandro recorreram da decisão judicial. O recurso não foi apreciado.

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