Sábado, 27 de Abril de 2024
Tecnologia
14/05/2017 11:28:00
Como o Facebook ganha dinheiro ajudando a espalhar notícias falsas
Anúncios publicados na rede social reproduzem desinformação e utilizam a marca de veículos jornalísticos para incentivar os usuários a clicar

Época/PCS

Imprimir
Mark Zuckerberg, em evento na Califórnia neste ano (Foto: David Paul Morris)

Há duas semanas, falamos na coluna semanal do Experiências Digitais na rádio CBN sobre as mudanças que Google e Facebook estavam fazendo para combater a proliferação de notícias falsas. O Google começou a "esconder" sites que comprovadamente estavam sendo usados para inventar notícias e, assim como o Facebook, prometeu cortar o dinheiro de anúncios gerados a partir da audiência desse tipo de página.

Mark Zuckerberg chegou a publicar uma carta mostrando que tinha uma preocupação pessoal com o fenômeno. O Facebook também investiu numa cartilha para orientar seus cerca de 2 bilhões de usuários a identificar notícias falsas e o que fazer com elas. Denunciar e, especialmente, não compartilhar.

Mas parece que nem o próprio Facebook segue a própria cartilha. Não é raro encontrar notícias falsas publicadas nas páginas da rede social em forma de anúncios e posts patrocinados.

O Facebook, assim, não apenas está sendo conivente, como ganha dinheiro com isso. Só para pegar os números mais recentes: nos três primeiros meses de 2017, a empresa teve um lucro de US$ 3 bilhões, um crescimento de 76% em relação ao mesmo período do ano passado. A maior parte desse dinheiro vem da venda de anúncios dentro da rede social. São diversos formatos, entre eles o de "posts patrocinados".

Funciona assim: você cria uma página no Facebook para divulgar o conteúdo que deseja para seus seguidores. Se quiser que ele alcance um número maior de leitores, você paga um determinado valor à rede social.

Nesse sistema, o Facebook, ao menos aparentemente, não consegue ter um controle de que estão "vendendo" em suas páginas. Vale também para anúncios inapropriados. Esses dias, por exemplo, navegava por minha página no final da manhã quando surgiu o anúncio de um jogo chamado "Choices" ("Escolhas", em inglês). Ele mostrava a cena de uma mulher pegando o marido no flagra com a amante na cama do casal.

Todos estavam seminus. Na cena, a mulher poderia escolher entre "acabar com tudo" ou "juntar-se a eles". Deixando qualquer puritanismo de lado, é o tipo de coisa que você não espera encontrar ao navegar por uma rede social de interesse geral, ainda mais naquele horário. Sem falar no conteúdo sexista e anacrônico.

Mas o caso mais grave, voltando ao título deste texto, ocorreu há poucos dias. Surgiu no meu perfil um anúncio de uma página especializada em testes. Sabe aqueles que usam suas informações para dizer com qual artista você é parecido ou qual é sua idade estimada? Só que o anúncio trazia uma notícia falsa, falando sobre um funcionário do McDonald's, que xingou o chefe e ganhou um bom dinheiro processando a rede.

A notícia usava o nome e a marca do canal GloboNews para tentar ganhar credibilidade. Mas era um boato, que nasceu nos Estados Unidos e foi desmentido em 2015. Em nota, a GloboNews diz que a proliferação de notícias falsas é preocupação constante de seus profissionais. Esclareceu que, sempre que sua marca for envolvida em qualquer episódio das chamadas “fake news”, usará os meios legais para impedir a publicação. Ser uma fonte confiável de notícias é nosso maior patrimônio.

O anúncio em si é tosco (confira abaixo), o que me leva a crer que não há um ser humano fazendo qualquer triagem. Tentei denunciá-lo, como é possível fazer com um texto não patrocinado. Mas o máximo que ele me ofereceu foi a possibilidade de removê-lo da minha página e dizer que era impróprio. Não recebi nenhuma mensagem falando que a denúncia estava sendo analisada pela equipe do Facebook, como ocorre em casos de textos publicados gratuitamente.

Notícia falsa usando a marca da GloboNews oferecida como anúncio dentro do Facebook (Foto: Reprodução)

Isso é ruim em muitos aspectos. O principal é saber que o Facebook continua, apesar de ter adotado um discurso de que combate notícias falsas, conivente com a proliferação desse tipo de conteúdo em sua rede. O outro é que parece que ele continua a ignorar as críticas de especialistas que analisam o impacto da rede social na sociedade. A estratégia de posts falsos patrocinados não é nova.

Numa entrevista a ÉPOCA no ano passado, a americana Catherine O’Neil, que estuda o impacto negativo de algoritmos na sociedade, já apontava o texto falso patrocinado como um dos aspectos mais nocivos do modelo de negócio no Facebook. Por não ter o mesmo critério de controle daqueles textos publicados em páginas comuns, sem pagamento, grupos políticos podem se aproveitar disso, por exemplo, para espalhar boatos por meio de anúncios. Por fim, o fato de ele estar ganhando dinheiro com tudo isso.

A reportagem de ÉPOCA entrou em contato com o Facebook na quinta-feira (11) com algumas perguntas. O objetivo era esclarecer como exatamente funciona o sistema de anúncios e se há algum tipo de fiscalização desse tipo de conteúdo. Em resposta, o Facebook nos enviou uma nota.

Segue:

“Estamos sempre trabalhando para entender quais publicações são consideradas enganosas, sensacionalistas ou spam e mostrar menos desses conteúdos. No início da semana, anunciamos uma atualização da plataforma de maneira que as pessoas vejam no Feed de Notícias menos publicações e anúncios que levem para sites com conteúdo de baixa qualidade. Também anunciamos medidas para diminuir qualquer incentivo financeiro que spammers possam ter e conter a desinformação.” – Porta-voz do Facebook

COMENTÁRIO(S)
Últimas notícias