Agência Brasil/LD
ImprimirDa noite para o dia, João Nogueira virou pai de seis! Eduarda, Eduardo, Ana Clara, Maria Luíza, Mariana e Yasmin (Eduarda, a mais velha, tem 12 anos; Yasmin, a mais nova, está com 6) vieram para mudar radicalmente a vida do pedagogo de 29 anos e da então esposa, Thamara, também pedagoga, de 30.
O amor entre eles nasceu por meio do trabalho. João conheceu Eduardo no abrigo Aldeias Infantis SOS, em Brasília. Ele tinha sido escalado para ajudar o menino, que apresentava problemas de comportamento e socialização. “Comecei com ele um trabalho de imagens, de fotopoemas, para ressignificar esse lugar de abrigo. Quando chegava em casa, ia decupar e analisar as imagens feitas por ele e tanto nos vídeos quanto nas fotografias, os irmãos estavam muito presentes. Minha esposa viu e ficou encantada com as imagens. Decidimos então nos tornar padrinhos afetivos de todas elas”, lembra.
Depois de passarem as festividades de fim de ano (2013) na casa deles, as crianças voltaram ao abrigo em que moravam desde que foram acolhidas das ruas. João e Thamara, que já tinham desejo de adotar, sentiram o vazio do lar. Dois dias depois, deram entrada no processo de adoção.
Aí, então, o esforço foi o de estabelecer laços de confiança. “Isso é o mais difícil de ser conquistado. Imagine na perspectiva das crianças: ‘se minha mãe e meu pai que me geraram me abandonaram, e eu tive que passar por tantas situações que me fizeram sofrer, imagina esse estranho que agora chega e diz que vai ser meu pai, minha mãe’. Então, essa parte de provar a qualidade do afeto é muito importante”, destaca João.
Resolvida toda a burocracia do processo, da compra de casa e carro maiores, a família estava completa. “Eu sou realizado enquanto pai. Não vou romantizar e falar que é fácil, que não dá trabalho, até porque são seis! Mas não consigo me imaginar em outra situação. Me sinto realizado enquanto objetivo no mundo. Amo meus filhos. Minha vida seria chata sem eles”, resume.
A busca pelo filho biológico
Para Ronaldo Vieira, de 42 anos, professor de português e diplomata de carreira, a realização do sonho veio com Ulysses, nascido em agosto de 2015. Antes mesmo de se casar e de conhecer a pessoa ideal para constituir uma família, tinha certeza da sua escolha. Depois da união com o químico Marllon de Oliveira, de 27 anos, em janeiro de 2013, o plano começou a virar realidade.
Resolveram ter um filho por meio de inseminação em uma barriga solidária. “Uly foi gerado pela prima do Marllon, em São Gonçalo [RJ]. Muito longe de nós, que já morávamos em Paris. Foi uma angústia sem fim, mas fizemos de tudo, mesmo de longe, para estar perto e acompanhando a gravidez”, conta Ronaldo.
Não foi fácil. Surgiram problemas financeiros (de gastos com clínica, acompanhamento da gestante, advogados e hospitais); psicológicos (devido ao sofrimento da distância, da expectativa, preocupação com o bem-estar e aceitação da gestante); de logística (já que Ronaldo é de Uberlândia, em Minas Gerais, e Marllon, de São Gonçalo, ambos morando em Paris); jurídicos (por todas as incertezas e desafios, já que, da licença-maternidade ao direito de registrar a criança no nome dos dois pais, dependia-se da sentença do juiz e das famílias, que foram pegas de surpresa, tanto com o casamento quanto com a gravidez).
“Creio que, para nossas famílias, tudo parecia brincadeira ou caso de novela. Não houve agravo, raiva, ou qualquer desentendimento. A dificuldade residia em entender esse processo de dois homens se casarem, depois dois homens terem filhos... Foi um sufoco, mas, aos poucos, muito aos poucos, nossos familiares foram se adaptando ao processo e, ao fim, foram muito presentes nas horas finais da gravidez e no cuidado com o Uly recém-nascido”, descreve Ronaldo.
Como qualquer casal, enfrentaram também a cansativa rotina de ter um bebê em casa. “Ser pai (e no nosso caso, ser mãe também), significa trabalho, muito trabalho. Significa também dar uma chance ao futuro. Significa revisitar o passado e desconstruí-lo. É gostoso, apesar das noites maldormidas, dos sustos, das raivas (porque criança não é só candura...). Eu achava que era frio e incapaz de amar intensamente, o Uly (e o Marllon) provaram que estava errado, completamente errado. Cada dia que passa, é mais amor”, sintetiza Ronaldo.
"Quero ser pai"
Eles resolveram levar uma vida itinerante. Rodrigo Iezze é publicitário. Henrique Foizzer, maquiador profissional. Aventureiros natos, decidiram rodar o Brasil oferecendo cursos e serviços na área de beleza. Mas, depois do casamento, em 2013, um desejo maior os fez repensar a rotina andarilha.
“Percebemos que nossas vidas estavam estabilizadas, e as realizações pareciam incompletas. Em 2016, adotamos um cachorro e tivemos a certeza disso, após derrubar toneladas de amor, cuidado e ternura nele. Este ano, 2017, é o ano efetivo da nossa dedicação ao processo da paternidade, pois a adoção legal no país exige endereço fixo. Decidimos, então, dar um giro no Brasil para escolher o lugar em que vamos morar e ter nosso filho”, conta Rodrigo. O casal continua a peregrinação. Está, agora, em Pernambuco avaliando várias possibilidades por lá.
Segundo eles, a decisão de adotar uma criança vai além da vontade de aumentar a família. “Nós nos sentiríamos um pouco egoístas de colocar mais pessoas no mundo com tantas precisando de pais. Assim, conseguimos proporcionar um impacto social do resgate, da esperança”, explicam. A paternidade, para eles, é uma oportunidade de construir um mundo melhor.
Mudando valores
A paternidade sonhada e experimentada por esses homens exige determinação e desprendimento, como aconselha João Nogueira, o pai dos seis irmãos adotivos, aos pretendentes: “Pense duas vezes. Nossa sociedade machista ensina os homens a serem conquistadores. Pense se você quer abrir mão dessa ideologia. Abrir mão da própria individualidade por um projeto de paternidade que o faz ver um mundo novo que não é baseado na sua conquista, mas naquela criança de quem você está cuidando e com quem troca conhecimento no dia a dia. Se você está disposto a rever seu mundo, está apto a iniciar seu processo de ser pai”, conclui.