IstoÉ/PCS
ImprimirO senador já foi denunciado três vezes à Justiça, além de responder a inúmeros processos e a mais de dez procedimentos judiciais, mas continua livre, leve e solto. O cerco contra ele, contudo, se fecha. Agora, é suspeito de receber parte de propinas na compra de um poço seco da Petrobras na África
Denunciado três vezes na Justiça, das quais duas em ações criminais e uma cível, respondendo ainda a uma ação de improbidade administrativa e a vários inquéritos, num total de mais de dez procedimentos judiciais, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) coleciona problemas com a lei. Apesar disso, o líder do PMDB no Senado segue livre, embora já haja previsões feitas por investigadores de operações como a Lava Jato de que isso não vai durar muito tempo. Afinal, aumentam os 75indicativos contra ele em várias frentes de investigação.
Um grupo de pessoas e lobistas beneficiários de dinheiro rastreado pela força-tarefa da Lava Jato é o mesmo que aparece em vários depoimentos prestados em colaboração premiada como pagadores de propinas para políticos do PMDB, entre os quais Renan Calheiros aparece com destaque. Esses lobistas podem encrencar Renan e outros senadores que o rodeiam, como Jader Barbalho, Eunício Oliveira, Romero Jucá e Edison Lobão, que estão no mesmo esquema que já mandou para a cadeia o ex-deputado Eduardo Cunha. É o que mostra cruzamento de informações feito por ISTOÉ a partir da Operação Poço Seco, a 41ª fase da Lava Jato, e de delações já prestadas perante o Supremo Tribunal Federal e a 13ª Vara Federal de Curitiba, do juiz Sérgio Moro.
O lobista Milton Lyra, o Miltinho, é um dos operadores que ligam Renan e boa parte do grupo de peemedebistas ao esquema de corrupção que acabou no desvio de US$ 66 milhões (R$ 211 milhões) da Petrobras durante a compra de um poço de petróleo seco em Benin, na África, de acordo com investigadores da Lava Jato. O advogado Flávio Calazans fechou delação premiada e narrou pagamentos milionários suspeitos obtidos de empresas a pedido de Miltinho.
A suspeita é que o dinheiro lavado tenha os políticos peemedebistas como destinatários finais das propinas recebidas no negócio. Dois outros depoimentos confirmam que o lobista é quem mandava as empresas pagarem valores na “conta-ônibus” do escritório do advogado Calazans. Um deles é do ex-banqueiro do banco BVA José Augusto Ferreira Santos, preso na semana passada pela Operação Cui Bono, por ordem do juiz Vallisney Oliveira, no mesmo caso que levou para a cadeia o ex-ministro do Turismo Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).
Poço seco
Na Operação Poço Seco, as investigações do Paraná – que foram compartilhadas depois com a Procuradoria Geral da República (PGR) em Brasília – trilharam o caminho dos US$ 66 milhões que saíram dos cofres da Petrobras, passaram por um poço petrolífero inútil em Benin e caíram na conta do lobista do PMDB João Augusto Henriques na Suíça. De lá, uma parte da propina, US$ 21,75 milhões, foi distribuída a outros políticos do PMDB. Eduardo Cunha foi pego com US$ 1,5 milhão e hoje cumpre 15 anos de prisão no Paraná. Outros braços do rastreamento mostram US$ 131 mil em conta nos EUA da filha do lobista Jorge Luz, preso em fevereiro pela Lava Jato junto com seu filho Bruno. Para o MPF do Paraná, a dupla opera propinas “em favor de agentes políticos do PMDB”.
Depoimentos do ex-senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) revelaram que Renan e Jader “recebiam vantagens ilícitas” por meio de Jorge Luz, que “falava em nome” do líder do PMDB, de acordo com o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Renan contou à PF que conhece Jorge Luz desde os anos 80, mas garantiu não vê-lo “há 25 anos”. À ISTOÉ, Renan disse que a “história é requentada e inventada por gente que gostaria mas não tem acusações a me fazer”. O ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró afirmou que o lobista Miltinho foi “o encarregado de pagar ao senador Renan” e a Jader uma propina no valor de US$ 6 milhões de dólares por um negócio da Petrobras na Argentina.
Uma segunda pista do rastreamento mostra o repasse de US$ 1,1 milhão para o ex-banqueiro do BVA José Ferreira Santos, apontado como operador de Romero Jucá numa negociação de suborno. Além disso, Santos repassou R$ 794 mil para o advogado Calazans a pedido de Milton Lyra. Calazans listou aos procuradores da PGR empresas que depositaram milhões em sua conta sob orientação de Miltinho, mediante a realização de contratos fictícios. Depois disso, Calazans repassava o dinheiro para empresas de Victor Colavitti e Rodrigo Brito e AP Energy, apontadas por outros delatores como meios de pagar propinas a Edison Lobão. Um trecho do material em poder do MPF mostra 24 empresas de ao menos oito setores, como planos de saúde, terminais portuários e corretoras, que fizeram 45 pagamentos totalizando R$ 15 milhões apenas nos doze meses que antecederam as eleições presidenciais de 2014.
Advogados de Miltinho asseguraram a ISTOÉ que ele “não cogita fazer delação premiada” e que não comentaria os depoimentos de Ferreira Santos e Calazans, ligando-o aos pagamentos suspeitos. “A defesa aguarda com serenidade o momento processual adequado para fazer sua defesa específica às acusações que lhe forem formuladas”, afirmaram Eduardo Toledo e Rodrigo Muniz. O senador peemedebista pode esperar, como diz aquele cântico provocativo que ecoam nas arquibancadas estádios afora. A sua hora, cedo ou tarde, vai chegar.