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Brasil
12/02/2018 18:41:00
Quando ela deixará de ser a eterna herdeira?

IstoÉ/PCS

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Marina Silva herdou o espólio social de Chico Mendes quando o ambientalista foi assassinado. E não capitalizou. Em seguida recebeu o legado político de Eduardo Campos e, mesmo assim, não conseguiu levar adiante a sua candidatura. Desta vez, assumirá os votos da esquerda que iriam para Lula. Ela irá desperdiçar novamente esse precioso trunfo?

Que a ex-senadora Marina Silva possui luz própria é inegável. A intensidade do brilho é que poderia ter sido mais vigorosa, se a presidenciável da Rede não fosse pródiga em desperdiçar as oportunidades que, não raro, desabam em seu colo. Mais precisamente, os espólios políticos herdados quase que de bandeja, ao longo de sua trajetória política. Cavalo encilhado não passa duas vezes, reza o provérbio popular. Marina já extrapolou a cota. Recebeu a visita da sorte duas vezes.

Foi assim na década de 80, quando despontou como liderança no vácuo da popularidade do ex-líder seringueiro Chico Mendes e, em 2014, quando deslanchou na corrida presidencial a partir do trágico acidente aéreo envolvendo o ex-governador Eduardo Campos. Nas duas ocasiões, frustrou aliados e apoiadores que apostavam todas as fichas em vôo mais altos da política acreana. Agora, como numa reprise, Marina morena se pinta para a guerra eleitoral com importante vantagem sobre seus oponentes. Desponta como a principal beneficiária da saída de Lula da disputa pelo Planalto nas eleições de outubro. Sem o ex-presidente na disputa, ela alcança 16% das intenções de voto e fica muito perto de uma vaga no segundo turno.

A Rede, de Marina, ainda não traçou estratégias para fidelizar o eleitorado lulista. Ideia, agora, é ampliar alianças

Apesar do cenário favorável, nem a Rede, sua legenda, e nem a própria Marina traçaram estratégias para fidelizar o eleitorado órfão a partir da saída do petista do páreo. “O voto não está em uma cesta do Lula ou da Marina. O eleitor dá seu voto e depois recolhe para si próprio. Ele tem que votar em quem acredita”, desdenha a própria pré-candidata. O deputado Aliel Machado (Rede-PR) vê com naturalidade a transferência de votos de Lula para Marina Silva, por terem histórias de vida parecidas. Mas reconhece que é preciso consolidar essa herança para construir uma candidatura forte. “Apesar de a Marina ser uma candidata conhecida, hoje ela é maior que a Rede. O partido é pequeno, mas ela tem muito potencial e força política. Precisa consolidar isso”, afirmou.

Os obstáculos

Com estilo discreto, muito criticado por opositores que a acusam de só aparecer em ano eleitoral, Marina terá que superar pelo menos três barreiras para se firmar como legatária dos votos de Lula: pouco tempo de propaganda no rádio e na televisão, estrutura partidária frágil e menos recursos para financiar a campanha – a Rede deve receber cerca de R$ 10,7 milhões do fundo eleitoral, o 22º maior valor entre os 35 partidos registrados no TSE.

Para isso, nas últimas semanas, os articuladores de sua candidatura entabularam conversas na tentativa de ampliar o leque de alianças. Se não lançarem candidatos próprios, o PPS e o PSB são alvos em potencial. Setores do partido defendem a união com legendas com as quais ela se coligou em 2014: PHS, PSL e PRP. O problema é que o PSL já está de casamento marcado com Jair Bolsonaro, que hoje margeia os 20% nas pesquisas, restando apenas o papel passado. “É cedo para afirmar, mas não vejo a Marina como favorita nesta eleição”, cravou Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas.

O maior obstáculo, no entanto, reside no próprio comportamento da ex-ministra do Meio Ambiente. “É uma pessoa maravilhosa, séria e encantadora. Mas não é fácil lidar com ela, politicamente falando. A postura, muitas vezes, é de anti-candidata”, reclama um conhecido apoiador. Ela pouco viaja pelo País, aparece de vez em quando em programas de televisão e se comunica mal com o eleitorado. Quando demonstra desenvoltura, o faz pelas redes sociais. É naquele ambiente que Marina se sente mais confortável para disparar ataques aos partidos tradicionais. “PT, PSDB, PMDB e DEM precisam de quatro anos sabáticos para reler seus programas. São partidos que deram suas contribuições, mas se perderam no apego ao poder”, escreveu.

A vocação de herdeira de Marina começou no Acre, na década de 80, quando ela conheceu o líder seringueiro Chico Mendes, então presidente do Sindicato dos Seringueiros de Xapu. Foram muito amigos e companheiros de luta por anos. Juntos, fundaram CUT do Acre, em 1985. No ano seguinte, Marina se filiou ao PT e compôs chapa com Mendes: ela se candidatou à deputada federal e ele a deputado estadual. Ambos foram derrotados. E o movimento dos seringais desidratou. Na eleição de 1988, Marina se elegeu vereadora por Rio Branco.

No mesmo ano, Chico Mendes foi assassinado. Em 2014, Marina era a vice na chapa do ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Um acidente aéreo levou à morte de Campos ainda no início da campanha. Marina, então filiada ao PSB, assumiu o posto e concorreu à Presidência. Cresceu nas pesquisas e, em alguns cenários, apareceu em segundo lugar, à frente de Aécio Neves (PSDB-MG). Apesar de conquistar 22 milhões de votos, não chegou ao segundo turno. Mudar a história é possível, mas exigirá da candidata mais do que apenas gerir um legado que ela sempre deixou escapar por entre os dedos.

A trajetória de Marina

Infância difícil

Nascida em um seringal próximo a Rio Branco, no Acre, em 1958, Maria Osmarina Marina da Silva Vaz de Lima é filha de um seringueiro e uma dona de casa. Vivendo em meio à precária produção de borracha, sobreviveu a doenças como hepatite, leishmaniose e malária. Aos 16 anos, mudou-se para a capital acreana onde foi alfabetizada pelo Mobral

Entrada na política

Professora de ensino médio, Marina debutou no movimento sindical e fundou a CUT no seu estado ao lado do ativista Chico Mendes. Filiou-se ao PT na década de 1980. Na primeira eleição da qual participou, em 1986, foi derrotada na disputa por uma vaga na Câmara Federal. Dois anos depois, elegeu-se vereadora de Rio Branco

Senadora precoce

Depois de um mandato como deputada estadual, Marina foi eleita ao Senado Federal. Com apenas 36 anos, tornou-se a senadora mais jovem da história da República

Eleições 2010 e 2014

Lançou-se candidata à Presidência da República pelo PV. Apesar da pouca estrutura, conquistou o coração de quase 20 milhões de eleitores.Em 2013, tentou registrar no TSE a Rede Sustentabilidade, mas não conseguiu a aprovação. Filiou-se, então, ao PSB, sendo incorporada à chapa de Eduardo Campos como candidata a vice. Após a morte do pernambucano, em trágico acidente aéreo, assumiu a cabeça de chapa. Chegou a liderar as pesquisas, mas despencou na reta final e não chegou nem ao segundo turno

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