EXTRA/LD
ImprimirAposentado desde 2012, o técnico em radiologia Gilson Alves, de 69 anos, tem saudade do tempo em que recebia do Estado do Rio seu salário em dia. Segundo ele, nunca lhe faltou nada. O aluguel era pago em dia, a feira enchia a despensa e o dinheiro dava para bancar todas as obrigações. A crise, porém, passou como um furacão em sua vida. Com dois salários atrasados — maio e junho —, Seu Gilson ficou sem condições de bancar o aluguel. Ele “morou” na rua, por poucos dias, antes de ser acolhido pelo abrigo Stella Maris, na Ilha do Governador, administrado pela Prefeitura do Rio.
— Quero que o governo pense um pouco na situação que estamos passando. Ninguém chega no armazém ou no mercado e diz que vai pagar em dois ou três meses. Estamos vivendo um dia pior que o outro — disse o aposentado, que recebeu a reportagem do EXTRA em uma visita ao abrigo. O aposentado, que perdeu a perna esquerda em um acidente aos 5 anos, recebe toda a assistência necessária no abrigo.
— Tive uma vida boa, de forma humilde. Não tenho parentes. Com os problemas no nosso pagamento, acabei aqui dentro (no abrigo). Sou querido por todos aqui— festejou.
Segundo Tereza Bergher, secretária Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, o número de pessoas em situação de rua triplicou entre 2013 e 2016 — passou 5.580 para 14.279. Bergher lembrou que o atraso sobre os salários dos servidores contribuiu decisivamente para esse aumento.
— Acho que toda essa crise do Estado teve um reflexo no município. É uma situação humilhante para quem trabalhou a vida toda. Esse é apenas um entre os vários casos anônimos que existem pela cidade — lamentou a secretária.
Pensionato vira destino
Também aposentada pelo Estado, Elza de Souza Braz, de 54 anos, viu ruir, em pouco tempo, a tranquilidade da vida que levava na Ilha de Paquetá. Servidora da secretaria de Fazenda por 33 anos, ela trocou a casa em um condomínio fechado na Ilha, por um pensionato em Botafogo. Ela conta que perdeu tudo diante do atraso do pagamento de sua aposentadoria.
— Eu tinha uma vida tranquila. Estava planeja minha mudança para Portugal. A crise começou e minha vida mudou. Tenho três cartões de crédito e a dívida acumulada é de R$ 50 mil. Não tenho dinheiro para pagar o mês do pensionato em que estou morando — desabafou a servidora.
Segundo Elza, a situação tem afetado sua saúde:
— Estou deprimida. São 200 mil famílias nessa situação. Contei com a ajuda de amigos para receber pouco mais de R$ 200. Usei parte desse valor para pagar as quentinhas que compro no dia a dia.
A decisão do Estado de priorizar o pagamento dos servidores ativos, e deixar boa parte dos aposentados e pensionistas com salários atrasados foi criticada pela secretária Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, Tereza Bergher.
— É um absurdo deixar os aposentados e pensionistas em salário. É um momento em que a pessoa está fragilizada. Precisando ir ao médico, se cuidar. Justamente nessa fase, existe a ausência do Estado. É dramático. É desumano — avaliou.