Correio do Estado/LD
ImprimirUm levantamento do Ministério da Saúde revela que 69% da população de Mato Grosso do Sul apresenta excesso de peso, e 36% dos que vivem no Estado são obesos. Na Capital, 11% possuem sobrepeso ou obesidade.
Entre as crianças de MS com idade entre cinco e nove anos, 12,3% são obesas, segundo dados também divulgados pelo ministério.
São números que servem de alerta a todos e que, no caso dos mais jovens, devem ganhar atenção redobrada da parte de pais e responsáveis.
Uma das principais frentes, em Campo Grande, para tratar desse tipo de disfunção é o programa de Terapia da Obesidade Infantojuvenil (TOI), do Hospital Regional de MS, que completa duas décadas de funcionamento em agosto.
O programa envolve uma equipe de especialistas – pediatras, endocrinologistas, nutricionistas, psicólogos e professores de Educação Física – com o objetivo de desenvolver, nos pacientes, a reeducação dos hábitos de vida, tanto no aspecto alimentar quanto na agenda de atividades físicas e comportamentais.
Faltando apenas duas semanas para a volta às aulas, um tema associado deve fazer parte da lista de cuidados dos pais e educadores: a obesidade infantojuvenil e o bullying, que consiste em atos de agressão e intimidação repetitivos contra uma pessoa.
A situação ocorre comumente nos grupos escolares, mas não se limita a esses ambientes.
CENTRO-OESTE: 4º LUGAR
As crianças e os jovens com sobrepeso, quase sempre, precisam lidar não somente com a necessidade de uma maior atenção à saúde e à qualidade de vida, mas também com o preconceito.
De acordo com informações do Ministério da Saúde, divulgadas em setembro do ano passado, a obesidade em crianças e adolescentes é multifatorial, e as condições genéticas, individuais, comportamentais e ambientais podem influenciar no estado nutricional.
Relatório público do Sistema Nacional de Vigilância Alimentar e Nutricional, com dados de pessoas acompanhadas na Atenção Primária à Saúde (APS), aponta que, até meados de setembro de 2022, mais de 340 mil crianças de cinco a 10 anos de idade foram diagnosticadas com obesidade.
Em 2021, a APS diagnosticou obesidade em 356 mil crianças dessa mesma idade.
A Região Centro-Oeste ocupa o quarto lugar no ranking nacional, com aproximadamente 9,4% das crianças e jovens com sobrepeso e obesidade. A Região Sul do Brasil lidera, com mais de 11,5% da população infantojuvenil obesa.
A Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) reconhece a obesidade como um problema de saúde pública. Por ser multifatorial,a doença exige intervenções integradas de diversos setores, além da saúde, paradeter o avanço e garantir o pleno desenvolvimento durante a infância.
EPIDEMIA
“A obesidade infantil hoje ganhou um patamar de epidemia, por conta do número elevado de casos em todo o mundo. A causa é multifatorial, o que fez aumentar esse índice é a mudança no estilo de vida do mundo moderno. Ou seja: sedentarismo, alimentação incorreta, falta de sono e ainda podemos apontar a ansiedade ou a depressão. Outro ponto importante é a atividade física, já que as brincadeiras das crianças mudaram no decorrer dos anos”, aponta o médico Hugo Alessy, especialista em Medicina do Esporte.
“Há alguns anos, as crianças brincavam nas ruas, correndo e pulando, enquanto hoje elas passam muito mais tempo sentadas no sofá, de olho nos televisores, laptops ou videogames. Houve uma drástica mudança nos comportamentos alimentares das casas em todo o mundo, e as crianças e jovens passaram a ter contato com alimentos industrializados e hipercalóricos e se afastaram da alimentação saudável, como frutas, saladas e alimentos ricos em nutrientes”, avalia.
É comum, segundo o médico, o relato de crianças e adolescentes que sofrem preconceito e até mesmo práticas violentas em razão da obesidade. O apoio e a orientação emocional às vítimas é essencial para evitar danos maiores.
BULLYING: 40%
De acordo com levantamento da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 40% dos estudantes brasileiros – adolescentes em sua maioria – admitiram já ter sofrido com a prática de bullying, baseado nas mais variadas causas.
“O bullying é muito presente na infância, principalmente quando relacionado a alguma característica física, sendo pior para as crianças obesas. A melhor forma de tentar combater essa prática é com muito acolhimento e menos julgamento. O diálogo e a conscientização são essenciais”, afirma o especialista.
“É preciso que a rede de apoio de pais, professores, colegas e demais atores sociais esteja alinhada para prestar o cuidado adequado tanto à vítima do bullying como também ao agressor, pois essa agressividade pode estar camuflando outras necessidades. O bullying nessa fase pode tanto acentuar o quadro de obesidade como desenvolver sérios danos em toda a vida adulta”, orienta o médico.
“GORDINHA”
Tão preocupante quanto a violência do bullying e os riscos relacionados à obesidade precoce é a falta de atenção dos pais ou responsáveis, que, segundo Alessy, ainda acreditam que “a criança forte” é mais saudável.
“Poucos pais se atentam à situação e buscam suporte médico. Infelizmente, ainda há a cultura de que criança ‘gordinha’ é sinônimo de saúde. É mais comum pais levarem as crianças ao consultório preocupados que seus filhos estejam magros demais, que não comem, chegando até a pedir medicação para abrir o apetite das crianças, quando na verdade elas estão com o peso adequado para a idade”, prossegue.
HÁBITOS
Emagrecer não é tarefa fácil e exige disciplina e apoio, em especial para crianças e adolescentes. Manter o peso ideal não se trata de questões estéticas e, sim, de atenção à fase determinante da vida, na qual o ser humano está em formação física e emocional.
“A família é a base de tudo, e os pais ou responsáveis são quem devem orientar a alimentação dos filhos. A criança vai comer o que lhe é ofertado, e se na casa a alimentação não é saudável, não há como os filhos seguirem uma rotina de alimentação adequada. Cabe ainda aos pais incentivar a prática de atividades físicas, os esportes, as brincadeiras longe da televisão, do computador e dos celulares, e até mesmo limitar o tempo de uso desses eletrônicos”, recomenda Alessy.
O protocolo para tratar a obesidade e o sobrepeso consiste na mudança do estilo de vida, pois o acompanhamento das crianças envolve vários aspectos e é sobretudo comportamental, com ênfase na reeducação nutricional, na prática de atividade física e, uma vez mais, na redução do uso de eletrônicos.
E mais: toda a família deve estar envolvida.
O descascar alimentos é sempre muito mais saudável que o desembalar. Os biscoitos, snacks e salgadinhos podem e devem dar vez às frutas ou saladas de frutas.
Assim como os nuggets, fast foods e alimentos ultraprocessados devem ser substituídos por alimentos ricos em fibras, vitaminas e componentes indispensáveis para a saúde das crianças e de seu corpo e mente em formação.
Aquela caminhada, o passeio de bike, a partida de futebol ou a queimada entre familiares e amigos são muito mais saudáveis, sob todos os aspectos, do que horas diante das telas e dos jogos eletrônicos.