BBC/PCS
ImprimirRobert J Klink passou sua vida perto d'água. Ele cresceu nos anos 1950, no South Long Lake, em Minnesota, Estado americano conhecido como a terra dos 10 mil lagos. Caçar e pescar nas margens desses reservatórios naturais era a paixão de sua vida.
Pouco antes da morte dele por câncer do cólon e do fígado, em março, sua esposa Judi Olmsted foi a uma funerária local - a Bradshaw Celebration of Life Center - e disse que seu marido queria ser cremado.
No estabelecimento, ofereceram dois tipos de cremação: a tradicional, com fogo, e um novo tipo, que usa água no processo. Um panfleto explicava que era uma "cremação alternativa e ecológica" que usava uma solução alcalina feita a partir de hidróxido de potássio.
"De início, pensei 'bem, eu não sei nada sobre isso'", disse Olmsted. "Mas quanto mais eu pensava sobre aquilo, mais eu acreditava que era a melhor opção."
Impacto ambiental
Quando somos enterrados, usamos os recursos do planeta uma última vez - com a madeira do caixão, o algodão do forro, a pedra da lápide, além de outros recursos.
A cremação também tem impacto ambiental. Para queimar um corpo, o equipamento crematório produz calor suficiente para aquecer uma casa durante uma semana no inverno congelante do Minnesota.
A funerária local é um dos 14 estabelecimentos do mundo a oferecer a opção "verde" - acredita-se que a hidrólise alcalina é ambientalmente mais correta do que a cremação tradicional.
Eles oferecem ambos os serviços pelo mesmo preço, mas dizem que o novo tipo de cremação revelou-se um sucesso inesperado. Dos clientes que optam por não enterrar seu familiar, metade do total, 80% preferem a hidrólise alcalina.
O benefício ambiental não, porém, é o único fator a influenciar a decisão.
Ao escolher a cremação verde, Judi Olmsted pensou na paixão que Klink tinha pela água e relacionou o método aquoso ao batismo, o que achou comovente.
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O homem que tem ossos mais fortes que o granito
O processo transforma os ossos em pó, que, no caso de Klink, foi depositado próximo a flores, fotos e um pato de madeira numa igreja luterana no subúrbio de St Paul, em Minnesota. Outras motivações
A BBC perguntou à diretora de funerais da Bradshaw, Anne Christ, sobre outras razões as pessoas citavam para escolher a hidrólise alcalina.
"Há algumas pessoas com um interesse científico e, claro, interessadas no fator ambiental", diz. "Mas é mais uma questão emotiva. Eu diria que a maioria das pessoas toma a decisão com base numa intuição de que a água é mais suave."
Mas dissolver o corpo com substâncias químicas realmente é mais suave do que queimá-lo? As pessoas se dão conta de como funciona a hidrólise alcalina?
"Tem coisas que eles não sabem", afirma Christ, rindo discretamente.
O equipamento de hidrólise e as salas para acompanhar o processo foram instalados há cinco anos por um custo de US$ 750 mil (R$ 2,4 milhões).
"Poderíamos ter gastado menos", diz Jason Bradshaw, também diretor do centro. "Mas pensamos que, como éramos os primeiros na área, e um dos primeiros no país, deveríamos investir mais. Temos grupos que visitam o lugar, de instituições psiquiátricas a igrejas. Ou simplesmente de pessoas que querem ver como a máquina funciona."
Ele conduz a reportagem ao subsolo, até um cômodo circular com uma cascata tilintante. Na parede cor de ocre, há uma porta de vidro deslizante que leva a outro espaço.
Bradshaw desaparece, acende a luz no outro cômodo e abre a porta.
O equipamento de hidrólise alcalina tem 1,8 m de altura, 1,2 m de largura e 3 m de profundidade. A aparência industrial da máquina contrasta com a intensidade sombria da sala de visualização.
Não é difícil imaginar quem escolheria assistir seu parente ou amigo sendo colocado num máquina que é conhecida como "digestor de tecidos". Em seguida, Bradshaw e seu colega, David Haroldsen, movem um corpo pela porta.
O corpo - que não me foi identificado - é colocado na máquina. Bradshaw opera o equipamento por uma tela de computador - depois de trancada, a máquina se enche de água.
'Processo natural'
Formado em biologia e química, ele explica que a máquina pesa cada corpo e calcula o quanto de água e hidróxido de potássio adicionar. A solução alcalina, com um pH de 14, é aquecida a 150 °C, mas como é pressurizada, não chega a ferver.
"A hidrólise alcalina é o processo natural pelo qual o corpo passa quando é enterrado. Aqui recriamos as condições ideais para isso acontecer muito, muito mais rápido", diz Bradshaw.
Num cemitério, o processo leva décadas. No equipamento, são 90 minutos - embora o processo subsequente de enxaguamento leve mais tempo.
Depois de três a quatro horas, a porta é destrancada e o diretor funerário vê ossos molhados espalhados numa bandeja de metal. Num compartimento longe da vista, são depositados os restos líquidos dos tecidos dissolvidos.
O cômodo onde está a máquina tem um cheiro parecido com o de um lavanderia. Mas a eliminação desses resíduos e o tratamento da água ainda preocupam as pessoas.
Bradshaw seca os ossos numa secadora de roupa doméstica. "Funciona melhor", explica.
Os ossos são, então, colocados numa máquina usada na cremação regular. A diferença é que o pó resultante é mais fino e mais claro, parecido com o da farinha - e produz 30% a mais em quantidade.
Até agora, o digestor de tecido de Bradshaw processou mais de 1,1 mil corpos, quase um por dia.
Espaço para mortos
Há países, como Japão e Grécia, onde há cada vez menos espaço para enterrar seus mortos. Além disso, há impacto ambiental no solo do cemitério, e o próprio enterro exige recursos naturais.
Ativistas dizem que, nos Estados Unidos, as estruturas para armazenar os caixões usam mais de 1,6 milhão de toneladas de concreto e 14 mil toneladas de aço por ano.
Na cremação, o equivalente a 320 kg de CO2 é gerado. A menos que medidas especiais sejam tomadas, substâncias tóxicas são liberadas, como o mercúrio do preenchimento dental.
Sendo assim, como a hidrólise alcalina se compara do ponto de vista ambiental?
Para a pesquisadora Elisabeth Keijzer, que coordena dois estudos para a Organização Holandesa para Pesquisa Aplicada, o processo é muito melhor.
Ela analisa 18 parâmetros ambientais - como destruição do ozônio, mudanças climáticas e toxicidade marinha - e conclui que a hidrólise alcalina é melhor em 17 deles comparada às outras técnicas. Além disso, emite sete vezes menos CO2 que a cremação.
Mesmo que seu trabalho não chegue a considerar o método uma "cremação verde", conclui que é ambientalmente mais correto do que o enterro e a cremação tradicional.