Sábado, 23 de Novembro de 2024
Economia
01/04/2019 08:11:00
Reforma da Previdência do presidente Jair Bolsonaro é um desastre
Idosos de baixa renda, trabalhadores rurais, pescadores, mulheres e professores serão afetados

*Abilio Junior Vaneli

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Abilio Junior Vaneli, Advogado previdenciarista e vereador pelo Partido dos Trabalhadores na Câmara Municipal de Coxim (MS)

Idosos pobres terão de esperar até 70 anos.

Jair Bolsonaro propôs mudanças severas no Benefício de Prestação Continuada (BPC/Loas), pago atualmente a pessoas com deficiência e idosos a partir de 65 anos e de baixa renda (garantido no Estatuto do Idoso, Lei 10.741/2003). O projeto propõe o pagamento de R$ 400,00 para pessoas com 60 anos. Aos 65 anos, o idoso passaria a receber R$ 750,00. Somente brasileiros com 70 anos ou mais receberiam o valor integral de um salário mínimo – hoje de R$ 998,00. A nova proposta representa um retrocesso social, pois a Constituição garante que o benefício social a idosos e portadores de deficiência deve ser no valor de 01 salário mínimo (art. 203, inciso V).

Outra mudança significativa é o endurecimento dos requisitos para ter acesso ao benefício, atualmente o cálculo da renda per capita (soma de toda a renda auferida pelos membros do grupo familiar) considera pobre quem possui renda de até 1/3 do salário mínimo (hoje R$ 332,66), sem incluir no cálculo outros benefícios sociais ou previdenciários de até 1 salário mínimo. A reforma (art. 41, § 3º da PEC – Proposta de Emenda à Constituição) proíbe a acumulação do benefício assistencial com qualquer outro benefício (ex. bolsa família, vale renda, etc.) e com qualquer outro benefício do Regime Geral de Previdência (aposentadoria, pensão por morte). E para verificar o chamado critério de miserabilidade será computado também o patrimônio da família que não poderá ser superior a R$ 98 mil reis (art.42, inciso I da PEC).

Quem está aposentado corre risco?

Caso o regime de capitalização pretendido por Guedes e Bolsonaro seja realmente aprovado, quem já está aposentado também corre riscos. Isso por que nesse regime, em que cada trabalhador é responsável por poupar para sua aposentadoria, pode ocorrer a total falta de recursos do INSS. “A capitalização não determina esse tipo de contribuição e vai desidratar a Previdência pública. Isso ameaça, sim, quem já está aposentado”, afirma a economista Patricia Pelatieri, do Dieese, à Rede Brasil Atual . O Regime Geral da Previdência (RGPS) foi responsável por 93,5% dos benefícios concedidos em 2017. Desse total, 68,4% correspondem a aposentadorias do INSS.

A Capitalização só traz vantagens para os bancos.

Pelo modelo de capitalização proposto por Jair Bolsonaro, as contribuições de cada trabalhador ou trabalhadora serão aplicadas no sistema financeiro, para render juros e correção. Este método já é utilizado nos planos de previdência complementares, administrados por bancos. Se a proposta do governo Bolsonaro for aprovada, os bancos passarão a ‘cuidar da aposentadoria dos trabalhadores’, que será alvo da especulação financeira. Segundo dados recentes da Subsecretaria do Regime de Previdência Complementar, 55% do dinheiro é destinado à renda fixa, tipo de investimento que tem nos títulos da dívida pública sua principal fonte de rendimentos. Isso significa aplicar em papéis desvinculados de atividades que geram trabalho e renda e que só beneficiam os próprios bancos.

A Reforma dificulta aposentadoria rural.

A reforma de Jair Bolsonaro também dificulta a aposentadoria de trabalhadores rurais. Na regra atual os trabalhadores rurais da agricultura familiar e pescadores artesanais se aposentam aos 55, se mulher, e aos 60 anos, se homem. Desde que comprovem 15 de atividade rural. Pela proposta, a idade mínima passa a ser de 60 anos para ambos (causando grande prejuízos às mulheres, desconsiderando a submissão destas à dupla e até tripla jornada de trabalho) e aumentando de 15 para 20 anos o tempo mínimo de contribuição. A reforma cria, ainda, a contribuição mínima anual por grupo familiar no valor de R$ 600,00 reais (art. 35 da PEC).

Vale lembrar ainda, que a Medida Provisória 871 retirou dos sindicatos a prerrogativa de emitir as Declarações de Exercício de Atividade Rural para comprovação de trabalho rural, devendo os pedidos de aposentadoria serem homologados por uma empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (ex. Emater, Agraer, etc.), credenciada no Plano Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural. Esta medida além de dificultar a obtenção da documentação necessária pelos trabalhadores rurais, pode aumentar a corrupção e até servir para o uso do chamado “voto de cabresto” em pequenos e médios municípios, onde estes órgão são controlados ou influenciados por ‘coronéis’ da política local.

“Pedágio” de quem está quase se aposentando.

Jair Bolsonaro vai cobrar um “pedágio” de quem já está quase se aposentando. A reforma prevê uma regra de transição para quem está a dois anos de cumprir o tempo de contribuição mínimo para ter direito à sua aposentadoria – 30 anos, se mulher, e 35 anos, se homem. Essas pessoas poderão optar pela aposentadoria sem a exigência de idade mínima, como é atualmente, mas terão que cumprir um “pedágio” de 50% sobre o tempo que falta para se aposentar (ex. se faltam 2 anos para o segurado se aposentar ele terá que trabalhar mais um ano, totalizando 3 anos, em vez de os 2 anos iniciais para ter direito ao benefício)

Você vai trabalhar mais tempo para ter aposentadoria integral.

Com a reforma de Bolsonaro o tempo de contribuição mínima já saltou de 15 para 20 anos. E isso é para o trabalhador receber apenas 60% do benefício (e mais 2% para cada ano que exceder os 20 - art. 24, § 3º da PEC). Caso o contribuinte queira se aposentar com o valor integral – o teto que hoje é de R$ 5.839,00 -, ele terá que trabalhar (contribuir) por 40 anos. Se o trabalhador contribuir pelos atuais 35 anos, da regra que está em vigor, ele terá direito somente a 90% do benefício. Reforma de Bolsonaro prejudica professores.

Bolsonaro propôs uma idade mínima de 60 anos para professores poderem se aposentar. Além disso, essa categoria terá que ainda contribuir por 30 anos (art. 12, § 4º, inciso I da PEC). Atualmente, não há uma idade mínima para a aposentadoria de professores, bastando o tempo de contribuição de 30 anos para homens e 25 para mulheres.

Agora, Jair que unificar a contagem para 30 anos, prejudicando as professoras do Brasil. A proposta prejudica novamente as mulheres que terão que ter 30 anos de contribuição, mesmo tempo dos homens. E se for servidor público terá que comprovar ainda 10 anos no serviço público e 5 anos no cargo. O valor do benefício será limitado ao salário mínimo e ao teto do Regime Geral (art. 12, § 7º, inciso I da PEC).

Trabalhadores informais não vão se aposentar.

A reforma trabalhista aprovada no governo Temer com o voto do então deputado Jair Bolsonaro precarizou (criou subempregos, baixos salários, contratação fragmentada, etc.) as relações de trabalho, criando por exemplo o trabalho intermitente e o governo Bolsonaro continua vendendo a ideia neoliberal de que a CLT e os direitos trabalhistas atrapalham o crescimento do Brasil e que a “previdência vai quebrar”, incentivando a informalidade (já pensam até em lançar uma carteira de trabalho verde e amarela). A proposta de reforma não altera a situação de trabalhadores informais, portanto, um brasileiro que não contribuir ao INSS por pelo menos 20 anos, nunca irá se aposentar. Segundo dados do IBGE 34,3 milhões de trabalhadores estão fora do mercado de trabalho formal e esse número pode aumentar com a “nova previdência”.

Fim da aposentadoria por tempo de contribuição, sem idade.

A proposta de Bolsonaro extingue a aposentadoria por tempo de contribuição. Hoje o segurado do Regime Geral pode se aposentar, independentemente da idade, aos 35 anos de contribuição, se homem, e aos 30 anos de contribuição, se mulher. A grande vantagem deste benefício é que a renda mensal é equivalente a 100% do salário de benefício.

A pensão por morte ficará menor.

Pela proposta, o valor da pensão por morte ficará menor. Tanto para trabalhadores do setor privado quanto para servidores públicos, o benefício será de 50% do valor mais 10% por dependente adicional (art. 8º. § 1º da PEC). Desta forma, se o beneficiário tiver apenas 1 dependente, receberá os 60%, se tiver 2 dependentes, receberá 70%, até o limite de 100% para cinco ou mais dependentes.

Hoje, a pensão por morte pode ser de até 100% para segurados do INSS, respeitando o teto de R$ 5.839,45. Para os servidores públicos, além deste percentual, o segurado recebe 70% da parcela que superar o teto. Pela proposta, em caso de morte por acidente de trabalho, doenças profissionais e de trabalho, a taxa de reposição do benefício será de 100%.

Fim da multa de 40% do FGTS.

A proposta do governo Jair Bolsonaro também prevê que o empregador não será mais obrigado a pagar a multa de 40% sobre o saldo do FGTS quando o empregado já estiver aposentado pela Previdência Social. As empresas também não terão mais que recolher FGTS dos empregados já aposentados (art. 10, § 4º ADCT - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Art. 2º da PEC 06/2019).

Menos direitos e mais flexibilização.

A proposta de reforma retira da Constituição as regras gerais de acesso aos benefícios previdenciários, de cálculos do seu valor inicial e posteriores reajustes, ao estabelecer que estas regras serão definidas por lei complementar. Como se sabe mudanças por lei complementar são mais fáceis de serem implementadas no Congresso Nacional, trazendo mais insegurança e instabilidade para os segurados, o que na prática pode significar a retirada de mais direitos.

*Abilio Junior Vaneli: Advogado previdenciarista e vereador pelo Partido dos Trabalhadores na Câmara Municipal de Coxim (MS).

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