Época/PCS
ImprimirCaio Diniz Dupin Galvão tem 17 anos e, como a maioria dos brasileiros de sua idade, se prepara para prestar os exames vestibulares no segundo semestre do ano. Ao contrário de boa parte de seus colegas, porém, ele não está preocupado apenas com a chegada das provas. Isso por conta de mudanças nas bolsas da Olimpíada Brasileira de Matemática (OBMEP). Desde que ganhou sua primeira medalha na competição, há quatro anos, ele recebe um apoio mensal de R$ 400 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que ajuda a custear seus estudos, além de uma série de cursos e materiais didáticos. O problema? Ele pode parar de recebê-la no mês que vem.
Devido a um déficit orçamentário de R$ 330 milhões, determinado pela lei orçamentária do ano passado, o órgão diz já ter gasto 88% de seus fundos até o momento. A situação é tão grave que Marcos Pontes, o ministro da Ciência e da Tecnologia, pasta que controla o CNPq, já foi a público pedir uma intervenção ao ministro da economia, Paulo Guedes. Até segunda ordem, contudo, 88 mil pesquisadores, mestrandos, graduandos e alunos do ensino básico como Galvão vivem a angústia de não saber até quando receberão o benefício.
“Não sou ninguém sem as provas. E a bolsa incentiva muito a participar delas”, ponderou o jovem estudante de Magé, na Região Metropolitana do Rio, que já conquistou 12 medalhas em competições escolares desde seu primeiro bronze na OBMEP, em 2015. Aluno de escolas públicas da região rural do Rio, Galvão contou que pagou boa parte das inscrições dessas provas com a bolsa recebida pelo CNPq, além de pagar a conexão de internet da própria casa. Disse também que foi devido ao reconhecimento das medalhas que já recebeu ofertas de universidades como a Fundação Getulio Vargas, onde quer cursar administração no ano que vem.
Segundo Galvão, que se inscreveu na OBMEP quando ainda estava no 8º ano por sugestão da própria escola, o apoio oferecido pelo governo o impulsionou a se dedicar mais ao estudo da matemática e outras áreas como a física. Com isso, por exemplo, ele conseguiu ser medalhista de ouro na Olimpíada Nacional de Física (OBF) e conquistar prêmios em outras competições, como a Olimpíada Nacional de Astronomia (OBA) e a Canguru.
“Antes era um estudo mais amplo, sem foco. Não tinha um objetivo. Mas as provas ajudaram a dar um foco. Só de ganhar a medalha já é um grande sentimento, mas o incentivo econômico sempre ajuda a gente a se esforçar ainda mais. É o caso da bolsa que estou recebendo para poder complementar minha entrada na faculdade”, explicou Galvão. Ele destacou também a importância dos pais — Luis Galvão, que trabalha nos Correios, e Liliane Diniz, dona de casa. “O maior incentivo veio de casa.”
Ainda assim, ele faz questão de salientar a importância do apoio oferecido aos medalhistas. É o caso da bolsa do Programa de Iniciação Científica Jr. oferecida com exclusividade a alunos do ensino público pelo CNPq em parceria com o Instituto de Matemática Pura e Avançada (Impa). Sediado no Rio de Janeiro, o Impa também oferece acompanhamento individual aos 6.500 medalhistas da competição, com cursos presenciais ou on-line com foco em áreas de seu interesse, envio de material didático e de ofertas de bolsas e competições no Brasil e no exterior.
Aplicada em 99,71% dos municípios do Brasil, 18 milhões de alunos participaram da OBMEP em 2019, oriundos de 54 mil escolas. Os estudantes fazem as provas em suas respectivas escolas. Os 46 mil melhores colocados recebem menções honrosas, enquanto 4.500 alunos ganham o bronze, 1.500 a prata e 500 recebem a medalha de ouro. Professores também são premiados com o desempenho dos alunos, podendo receber cursos de especialização.
“Estou tendo aula de cálculo integral pelo Impa, uma matéria que me dava problemas. Mesmo não sendo essencial na OBMEP, ela é importante para a Olimpíada de Física”, destacou Galvão. Liliane Diniz, sua mãe, faz coro à importância da OBMEP e da bolsa na vida do filho.
“Existe vida inteligente mesmo na área rural. Isso abre outras portas. Meus filhos sempre foram de escola pública. Eu tinha medo do que seria deles pela falta do incentivo à educação. Estou aqui sempre estudando com eles. Mas e depois? Como vão disputar? A OBMEP botou meu filho dentro de uma faculdade como a Getulio Vargas. Ela permite que ele tenha cota em faculdades como a Unicamp (Universidade de Campinas)”, contou Diniz.
Por meio do projeto, Galvão pôde ter contato com uma série de matérias na matemática a que não teve acesso na escola, como vetores, derivadas e integrais, além de complemento em áreas como química e física.
“É um suporte para você crescer. O começo foi a matemática, mas a bolsa está dando toda uma assistência de vida. Uma oportunidade. Eles querem incentivar o aluno a estudar, dar um apoio à base. Como é que não tem dinheiro para as idades mais tenras? Como é que não se preparam para isso?”, desabafou Diniz, que destacou a importância da bolsa do CNPq para que o filho fosse capaz de concorrer a vagas anteriormente impossíveis.
Segundo ela, o sucesso do filho também incentivou outros alunos da região, incluindo a própria filha Lara, de 16 anos, que também foi medalhista da competição e recebeu menção honrosa na competição do ano passado.
Concorrendo em processos seletivos com bolsa para escolas internacionais — as inscrições pagas com o dinheiro guardado do benefício do CNPq —, Lara relembrou que o sucesso do irmão a incentivou a percorrer o mesmo caminho.
“Depois que ele ganhou, fiquei pensando muito nisso. Queria conseguir também, já que sempre estudei muito. A ideia da bolsa, que me ajudaria a ter meu espaço, me incentivou muito. E no final das contas me fez estudar mais”, contou ela, que diz estar se preparando para tentar ganhar uma medalha na OBMEP outra vez.