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ImprimirDepois de não conseguir uma vaga na Libertadores de 2017, o Corinthians terá um fim de ano bastante agitado nos bastidores. Quase dois meses depois de deixar a cúpula do futebol por não ter sido comunicado sobre a contratação do técnico Oswaldo de Oliveira, o ex-diretor adjunto de futebol Eduardo Ferreira abre o jogo sobre sua saída do departamento e faz duras críticas ao atual gerente de futebol Alessandro Nunes.
– É minha maior decepção. Se você pegar entrevistas minhas, parecia que o Alessandro não sabia. Eu desabafei com ele antes de viajar e em Cuiabá. Depois fiquei sabendo que ele sabia de tudo o que estava acontecendo. Ele participou da contratação. Para mim, foi uma traição. Uma grande decepção. Falei por cima com ele, mas uma pessoa desse tipo não quero nem perto de mim mais – disse Eduardo.
Procurado pela reportagem antes desta publicação, Alessandro optou por não se pronunciar sobre as declarações do antigo colega de diretoria.
Aliado político do ex-presidente Andrés Sanchez, Ferreira diz nesta entrevista exclusiva ao GloboEsporte.com que se sente como um dos responsáveis pela má campanha da equipe no Brasileirão, reconhece que o grupo não "deu liga" nesta temporada após tantas contratações, mas faz questão de frisar:
– Não dá para ter 100% de certeza, mas para mim é muito claro que se tivéssemos mantido o Fábio Carille e toda estrutura daquele momento estaríamos classificados.
GloboEsporte.com: Que balanço faz da sua passagem pela diretoria? Eduardo Ferreira: Foi positivo, apesar desse último ano ter sido tenso. Não foi como esperávamos. Eu aprendi muita coisa. Saí com um título brasileiro (2015). Quantas pessoas passaram pelo futebol e não conseguiram?! Só lamento por não ter tido melhores resultados este ano. Foi tumultuado. Começamos o ano sem seis titulares, depois perdemos o Tite e uma parte da comissão técnica. Fábio Mahseredjian (ex-preparador físico do clube) tem um trabalho muito bom dentro e fora de campo com os jogadores. O time não tinha se encontrado e ainda perdeu outros titulares (Bruno Henrique e Elias) no meio do ano. Agora é tentar manter a base e reforçar. Tem tudo para melhorar no ano que vem.
Agora fora da diretoria, você acha que dava para evitar o desmanche do time campeão brasileiro de 2015? Era impraticável devido aos salários. Sobre os caras que foram para a China não dá nem para comentar. O mínimo que saiu daqui foi ganhando mais de R$ 1 milhão por mês. Vagner Love recebeu uma proposta do nada com grande salário, foi uma surpresa. Seguramos o Felipe em duas janelas, não tinha mais como segurar. Bruno Henrique, graças a Deus, não aceitou ficar. Perdemos a cabeça. O que oferecemos para ele ficar entre luvas e salários é para perder a cabeça. Infelizmente, isso faz parte do futebol sul-americano.
Nenhum dos jogadores contratados em 2016 se firmou. Foi um erro de planejamento? Se você trouxesse três Messis e três Neymares em fevereiro seria complicado. A estrutura foi desmontada. Como o time não encaixou até hoje, fica complicado analisar. Ninguém conseguiu mostrar mais do que ano passado em seus clubes. Isso também se deve a essa mudança de estrutura no Corinthians. O único cara que cresceu e que já vinha bem foi o Rodriguinho. Temos de esperar ano que vem para poder julgar melhor. Se passar mais de um ano e não encaixar, e os jogadores não produzirem, você pode analisar de outra maneira. Nós tentamos o melhor, mas não deu certo.
Por conta de todas as mudanças, você acha que a campanha no Brasileiro foi satisfatória? Não estou aqui para tirar minha culpa, mas foi um ano atípico, com muitas mudanças. Apesar disso, poderíamos ter ficado com essa vaga na Libertadores. O time não deu liga. Não dá para ter 100% de certeza, mas para mim é muito claro que se tivéssemos mantido o Fábio Carille (auxiliar técnico permanente) e toda estrutura daquele momento estaríamos classificados. Quero pedir desculpas ao torcedor por não termos feito um bom trabalho, mas também temos de saber que não é fácil manter um time campeão todo ano.
Você é criticado no clube e por torcedores pela contratação do centroavante Gustavo, que pouco jogou... Todos os jogadores contratados, desde uma promessa até um grande jogador, passam pela comissão técnica. O diretor não fala que vai lá buscar o jogador. Isso é mentira. Passa pela comissão, pelo Mauro (da Silva, observador), pelo Alessandro. Todos passam por esse processo. O diretor só vai lá para contratar. Eu ajudei e briguei para contratar jogadores mais novos, como Jean, Luidy e o próprio Gustavo, porque acho que o Corinthians precisa ter esse planejamento de contratar jogadores baratos. Não dá para contratar atletas de R$ 10 milhões. Por mim, traria muito mais jogadores novos para que daqui a seis meses possam virar grandes atletas.
Sua saída está atribuída à contratação do Oswaldo de Oliveira. Foi isso mesmo o que aconteceu? Não é que eu não queria o Oswaldo. O nome dele não chegou a ser comentado comigo. No começo de outubro, ficou definido que iríamos com o grupo atual até o fim do ano. Fizemos uma reunião com o Fábio Carille sobre isso. Não fui consultado que chegaria o Oswaldo ou outro treinador. Fiquei muito chateado e magoado. Foi a gota d´água. Mas já passou, conversei com o Roberto.
Como ficou sabendo da negociação? Foi um momento muito ruim naquela semana, porque fiquei sabendo por outras pessoas que o Oswaldo estava vindo. Lembro que dias antes do meu último jogo, contra o Santa Cruz, em Cuiabá, fui atrás de algumas coisas que chegaram a mim e vi que foi o modo errado. Estava conversando com Alessandro e Fábio, que iria até o final do ano com ele. Aí, sim, no fim do ano teria um treinador. Mas foi uma surpresa, sim, uma decepção, mas a vida segue. É o futebol.
O Alessandro sabia da negociação com o Oswaldo de Oliveira? É minha maior decepção. Se você pegar entrevistas minhas, parecia que o Alessandro não sabia. Eu desabafei com ele antes de viajar e em Cuiabá. Depois fiquei sabendo de que ele sabia de tudo o que estava acontecendo. Ele participou da contratação. Para mim, foi uma traição. Uma grande decepção. Falei por cima com ele, mas uma pessoa desse tipo não quero nem perto de mim mais.
Você se sente enganado? Não digo enganado. Logicamente, ele foi respeitar o presidente. Quem tinha uma relação próxima com ele era eu nesses cinco ou seis meses, quase 24h por dia. A relação com ele sempre foi boa. Por isso, a decepção é ainda maior.
Alessandro está recebendo muitas críticas no clube pela forma de trabalho. Há pressão para que o Roberto o demita... É complicado falar, ele pode achar que é algo pessoal. Mas ouço muito isso no clube e no futebol, com jogadores, empresários e funcionários. Mas eu não estou mais lá. É uma questão para o Roberto e o Flávio Adauto (diretor de futebol) resolverem. Se eu tivesse poder, ele não ficaria. O departamento de futebol está precisando de umas chacoalhadas. Não vou aqui falar quais seriam, isso cabe ao presidente. Mas que precisa, não tenha dúvida.
O que está achando do trabalho do Oswaldo? Hoje estou longe, só na arquibancada. É cedo para julgar. Gostaria de esperar para julgar mais para frente. Seria injusto fazer algum julgamento agora.
Mas você queria outro treinador? Roger Machado e Eduardo Baptista eram suas opções? Nós estávamos começando a ver alguns nomes, mas não tínhamos nada na mesa. Tínhamos uma série de nomes. Como havíamos decidido que o Fábio Carille seria o treinador até o final do ano, poderíamos pensar melhor.
Você também foi muito criticado pela entrevista em que garantiu a permanência do Cristóvão Borges mesmo que ele viesse a perder o clássico contra o Palmeiras. Depois do jogo, ele foi demitido. Foi um erro? Essa entrevista eu assumi no peito e resolvi fazer porque achava necessário dar moral para o treinador, principalmente pelo jogo que teríamos em três dias contra o Palmeiras. Eu repetiria se fosse preciso. Estávamos arriscando tudo para o jogo. Em um clássico você tem de fazer um trabalho diferenciado internamente, colocar um pouco de pressão, transformar em um jogo mais forte. Eu fiz isso sabendo que poderia ter essa possibilidade. É arriscar tudo.
A demissão dele foi precipitada? O Cristóvão chegou ao primeiro lugar na tabela (17ª rodada), mas uma coisa muito estranha era a rejeição que ele tinha. Era assustador. O que mais assustou foi no 1 a 1 contra o Cruzeiro, no Pacaembu. Ele foi xingado e vaiado. Nós comentávamos e não entendíamos. Parecia que estava derrubando o time para 15º ou 18º. A saída foi por uma soma de fatores. Ele é uma grande pessoa e tem um jeito diferente para lidar com os jogadores. Ele entrou em um momento de turbulência, onde o time não estava bem. Depois perdeu mais jogadores, dois titulares no meio do campeonato. É complicado. São coisas internas, análise. Pode ter sido precipitado ou não, mas são coisas internas.
Conselheiros reclamam que o Edu Gaspar, hoje na seleção brasileira, continua sendo ouvido pela diretoria do Corinthians sobre algumas decisões... Não posso afirmar, mas é um caminho. Acho que isso ocorre, sim. O Roberto tem uma boa relação com ele, o Alessandro também. Fico sabendo que ele passa às vezes no CT. Mas se é bom ou ruim é com o Roberto. Eu acho que amizade é uma coisa, mas não deveria mais opinar. É com qualquer pessoa. O cara tem outros pensamentos, agora está na Seleção. Não está mais no dia a dia do clube para saber o que estava precisando.
Que avaliação você faz do pedido feito pela oposição pelo afastamento do presidente Roberto de Andrade? Quem mais está tumultuando são conselheiros da própria situação. Tem alguns que estao querendo fazer mais do que deve. Acho que tem de cobrar sim, viver o dia a dia, saber dos problemas, mas de forma interna. Não precisa externar em Facebook, levar para a imprensa. Acho que isso não cabe. Atrapalha o Corinthians e não o Roberto. Temos de ter mais cuidado. Não cabe neste momento cogitar a saída.
Você era um dos líderes do "Movimento Fora, Dualib" em 2007. Hoje, como conselheiro do clube, como reagiu ao ver a foto do Andrés Sanchez e do Roberto de Andrade com o Alberto Dualib? Doeu demais ver Roberto e Andres neste evento, não precisamos disso. Doeu não só em mim, mas para vários amigos e conselheiros que fizeram parte da oposição naquele momento Hoje o clube vem com novas pessoas participando, lógico que com algumas mais experientes ao lado ajudando. Mas tudo na vida e ou na política tem limite.
Você voltaria ao futebol se fosse chamado no futuro? Com certeza, voltaria. Não dá para cravar se serei chamado. Eu não entrei cru, sempre vivi perto de pessoas do clube, do Andrés, Duílio, Bussab, Sérgio Alvarenga, entre outros. Queria conhecer e aprender mais. Eu peguei muito fácil a rotina do futebol. Com toda humildade, acho que fiz um bom trabalho. Acho que um dia voltaria para contribuir. Ano passado fomos campeões com seis ou sete meses de direitos de imagem atrasados. Diretor está lá para resolver problemas. Aprendi muito desde o ano passado. Este ano conseguimos levar muita coisa que poderia piorar.