Globo Esporte/LD
ImprimirO goleiro Igor Lemos Cajuhy, do Operário (MT), denunciou ter sido chamado de "macaco" por um torcedor durante a partida contra o Tombense (MG) pela rodada da série D do Campeonato Brasileiro neste domingo (7) no Estádio Antônio Soares de Almeida, em Tombos, na Zona da Mata de Minas Gerais. O caso ocorreu dias depois que o Grêmio foi excluído pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) porque a torcida fez comentários ofensivos contra o goleiro Aranha, do Santos, pela Copa do Brasil. O presidente do clube de Cuiabá, Geovani Banega, afirmou ao G1 que a assessoria jurídica foi procurada para que sejam tomadas providências. O caso está com a Polícia Civil de Tombos e o delegado responsável informou que irá repassar detalhes sobre o assunto na tarde desta segunda-feira (8).
O goleiro, que foi expulso na partida após lançar bola contra a torcida, registrou Boletim de Ocorrência (BO) na Polícia Militar da cidade. O suposto agressor indicado por ele também foi conduzido para prestar depoimento. Segundo a PM, o caso foi registrado como "atrito verbal", mas todas as denúncias do goleiro de injúria racial constam na ocorrência. No entanto, o torcedor apontado como agressor desmentiu a acusação em depoimento. O árbitro da partida Antônio de Carvalho Schneider relatou o episódio e as reclamações do goleiro na súmula, disponibilizada nesta segunda-feira (8) no site da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Procurada pelo G1, a diretoria do Tombense disse que vai divulgar um posicionamento na tarde desta segunda.
A versão do goleiro
“Ele me chamava de macaco e dava risada”, desabafou Igor Lemos Cajuhy, goleiro do Operário-MT ao G1. Ele alega ter sido vítima de injúria racial durante a partida contra o Tombense. “Primeiro fui chamado de afrodescendente, foi um “elogio”, digamos assim. Aí em seguida, de Aranha. E por último, de macaco, duas, três vezes. Está na minha memória, não sai”, contou.
O goleiro afirmou ainda que o árbitro Antônio de Carvalho Schneider demorou a agir diante das reclamações dele. “Estou ainda mais revoltado porque eu pedi para ele intervir, para fazer alguma coisa. Ele não fez nada. Como é que o juiz faz isso? Eu sou um ser humano. Pedi que ele resolvesse. Se ele tivesse colocado o policiamento antes, nada disso teria acontecido”, analisou. Por ter chutado a bola na torcida adversária, Igor Lemos Cajuhy foi expulso da partida aos 37 minutos do 1º tempo. “Eu chutei a bola na direção do torcedor que estava me falando palavras racistas. Não faria isso à toa. Havia pai de famílias e crianças no local que não tinham a ver com isso. Eu fui expulso. Tenho 31 anos e 17 de profissional, nunca fui expulso na minha vida”, disse, ainda indignado. Agora, o goleiro afirmou que não vai deixar o caso parado. ““Eu estou revoltado com a situação, porque não sou o primeiro nem o último a passar por isso. Eu gostaria que se tomasse uma providência. Eu vou procurar os meus direitos como cidadão, como atleta, e vou atrás disso”, garantiu. O presidente do Operário-MT, Geovanni Banegas, afirmou que o clube apoia a reclamação do goleiro. “Foi muito na cara, a torcida o xingou em vários momentos do jogo”, contou. Segundo ele, o clube está buscando orientações para saber como agir a partir de agora. “A gente está conversando com o jurídico pra saber todo o procedimento correto para não sair lesado com esta situação”, ressaltou. Além disso, Geovanni Banegas espera resposta da CBF e do STJD. “O agressor foi identificado e levado para a polícia. Fizemos o que tínhamos que fazer. Agora quem tem que fazer a parte dela é a CBF. Cabe agora ao STJD julgar e decidir. Eu espero que seja feita justiça”, resumiu.
A versão do torcedor
O homem de 32 anos apontado pelo goleiro como o autor dos insultos de cunho racista foi levado pela Polícia Militar (PM) para o quartel para prestar depoimento. O homem, que não teve o nome divulgado, negou as acusações do goleiro. Na versão do torcedor, ele disse que viu o goleiro se desentender com o juiz no meio do campo por causa de uma falta polêmica. Neste momento, ele disse que, junto com a torcida, começaram a cantar “frangueiro”, quando o goleiro chutou a bola em direção à torcida. Ainda no relato do torcedor à PM, ao perceber que seria expulso, o goleiro o acusou pelos xingamentos como justificativa para o descontrole. Consta no BO que o torcedor disse que estava acompanhado da mãe no estádio e apresentou várias testemunhas que reforçaram a versão de que ele não teria feito nada. O homem disse ainda que por ser de cor parda jamais xingaria outra pessoa de "macaco", afrodescendente e aranha. Na saída, ele negou a acusação à equipe da TV Integração. “Nunca que eu que ia fazer isso. A gente é humilde, você acha que a gente vai falar? Olha a minha cor. Vou chamar disso?”.
Apuração do caso
De acordo com a Polícia Militar (PM), o caso foi registrado como “atrito verbal”, uma qualificação que pode ser alterada no decorrer das apurações. “Não houve, a princípio, uma prova material clara ou testemunhal. No primeiro momento, foi uma discussão entre um torcedor e o jogador. No entanto, destacamos que a denúncia do goleiro de ter sido vítima de injúria racial consta no BO”, disse o tenente da PM, Wallace Miranda.
Ele destacou que o patrulhamento nos jogos no Estádio Antônio Soares de Almeida sempre foi tranquila. “Há três anos, eu trabalho no estádio e é a primeira vez que acontece um fato desta natureza. Sempre foi muito tranquilo. Neste domingo, a partir do momento em que o goleiro chutou a bola em direção à torcida e houve uma agitação, nós agimos para evitar um mal maior, uma invasão do campo. A partir disso, o rapaz indicado pelo torcedor foi identificado e retirado do estádio sem problemas”, esclareceu. Ainda segundo o policial militar, até a desavença o jogo transcorria normalmente. “Os militares que faziam o patrulhamento na área próxima não ouviram nada de diferente. E o juiz, antes do ocorrido, não nos chamou para intervir”, afirmou.
O tenente Wallace Miranda destacou ainda que o BO possui a íntegra dos dois depoimentos, do goleiro e o do rapaz indicado por ele como o agressor. “Todas as versões estão na íntegra na ocorrência, conforme foram relatadas pelos dois. Passamos para a Polícia Civil. Não descartamos nem afirmamos que houve a injúria racial. Depende agora das apurações por parte da Polícia Civil”, afirmou.
Em texto enviado ao G1, a PM explicou ainda que não teve acesso à súmula do jogo e nem a nenhuma imagem que pudesse comprovar os fatos. Segundo a PM, após depoimento, o goleiro e o rapaz indicado por ele como o agressor foram liberados. O G1 entrou em contato com a delegacia e foi informado de que o delegado responsável pelo caso dará detalhes sobre o assunto na tarde desta segunda.
A súmula do juiz
Na súmula do jogo, o árbitro Antônio de Carvalho Schneider relata que a partida ficou paralisada por 11 minutos para as providências a respeito da denúncia do goleiro. No texto, o juiz relata que foi chamado pelo goleiro por volta dos 37 minutos do 1º tempo. "Vindo em minha direção e de maneira muito exaltada, prolatou as seguintes palavras: 'Estão me chamando de macaco. O senhor não vai fazer nada? Estão me chamando de macaco'", diz o texto.
O árbitro disse que impediu o prosseguimento da partida e foi ao policiamento de campo pedir a medida mais correta. Neste meio tempo, foi informado pelo assistente João Luiz Albuquerque que o goleiro pegou a bola ao lado da meta e a chutou violentamente contra a torcida do Tombense. E, por isso, ele foi expulso imediatamente. Também está na súmula o relato de que, antes de sair de campo, o goleiro identificou o torcedor que o teria chamado de macaco. Depois que os dois foram conduzidos pela PM para a delegacia, o juiz explicou que deu prosseguimento à partida.
No relatório do assistente na súmula consta apenas que "Aos trinta e sete minutos da primeira etapa informei ao árbitro da partida que o goleiro da equipe do Operário/MT, Sr. Igor Lemos Cajuhy pegou a bola que estava ao lado de sua meta e a chutou violentamente contra a torcida do Tombense que estava situada na arquibancada atrás de sua meta".