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ImprimirNo dia 1º de abril, o mentor de Dunga comemorou 70 anos de vida. Natural de Fusignano, uma cidade italiana da região de Emília-Romanha, Arrigo Sacchi não quis ser entrevistado pessoalmente, mas aceitou, de forma cordial, um papo por telefone: “Se fizer pessoalmente todas as entrevistas que me pedem não tenho mais tempo para mim nem para a minha família. Quero usar o meu pouco tempo livre para outras coisas”, respondeu ele, que apesar de estar afastado dos gramados, desde que deixou de colaborar com o setor juvenil da federação italiana em 2014, se mantém muito ativo no dia a dia do Calcio e do futebol internacional. Atualmente, o ex-treinador de Milan, Parma, Atlético de Madrid e Itália colabora com rádios, jornais e televisões italianas.
Durante a Copa do Mundo no Brasil, Sacchi estreitou os seus laços com Dunga. Os dois trabalharam juntos para um canal de TV internacional e passaram muitas tardes conversando sobre futebol, o papo favorito do italiano. Ele nem se importou que o brasileiro tenha trocado tantas vezes o seu nome por “Enrico Sacchi” quando foi apresentado como treinador do Brasil pela segunda vez. O mentor só reserva elogios ao pupilo e pede paciência com o comandante canarinho.
- É um ótimo treinador. É inteligente. Tem ideias claras. Mas você veja, como é que uma nação joga uma Copa do Mundo em casa, chega a uma semifinal com tanto sacrifício, jogando bem mais ou menos e ainda toma sete gols. Isso significa que o Brasil inteiro vive um momento difícil e o Dunga também está recolhendo essas dificuldades. Eu digo que a paciência é uma grande virtude, a torcida, os jornalistas, a crítica precisam ser pacientes com Dunga, porque em 2014 o Brasil bateu no fundo, chegou ao pior momento da sua história. Eu vi que o time sentiu dificuldades contra todas as seleções que enfrentou. Infelizmente os jogadores brasileiros interpretam o futebol como um jogo individual, mas é um esporte de equipe. Quando você joga 1 contra 11, você perde e vai perder sempre.
Os dois estiveram em lados opostos em um momento decisivo: a final do Mundial de 1994. Como capitão do Brasil, Dunga converteu o pênalti, Roberto Baggio, não. Sacchi, que comandava a Azzurra, perdeu a oportunidade de coroar a sua carreira com a Copa. O atual técnico da Seleção ergueu o troféu mais desejado no futebol. A admiração pelo camisa 8 da Seleção não começou ali. O italiano revelou que tentou contratá-lo quando comandava o poderoso Milan de Van Basten, Gullit e Rijkaard.
- Eu quis contratá-lo quando treinava o Milan. Gostava muito do Dunga, acho que ele jogava no Pisa nessa época (1987-1988). Sempre acompanhei a carreira dele com muita atenção - revelou ao GloboEsporte.com.
Confira a entrevista completa com Arrigo Sacchi:
O senhor acabou de celebrar 70 anos. O “Calcio” ainda é muito importante na sua vida?
- Digo sim, porque enquanto eu trabalhar com o futebol, eu vou querer sempre fazer bem as coisas, ser profissional e dar o máximo de mim.
Ainda pode voltar a trabalhar num clube ou numa seleção?
- Não penso. Nunca podemos dizer não na vida, mas não creio.
O Dunga diz que o senhor é o mentor dele no futebol. Vocês ainda conversam?
- Sim, foi um ótimo jogador, muito inteligente e é um treinador inteligente. Acho que conhece muito bem o futebol. Aliás tenho a certeza disso. Trabalhamos juntos para uma televisão durante a Copa de 2014 e conversamos muito. Eu gostava muito dele como jogador, pense que eu quis contrata-lo quando estava no Milan. Gostava muito do Dunga. Acho que ele atuava no Pisa nessa época (1987-1988). Sempre acompanhei a carreira dele como muita atenção.
Mas como é que o senhor vê este momento da seleção brasileira?
- Dunga tem a missão de recuperar prestígio e resultados que até agora não apareceram. É um ótimo treinador. É inteligente. Tem ideias claras. Mas você veja: como é que uma nação joga uma Copa do Mundo em casa, chega a uma semifinal com tanto sacrifício, jogando bem mais ou menos e ainda toma sete gols. Isso significa que o Brasil inteiro vive um momento difícil e o Dunga também está recolhendo essas dificuldades. Eu digo que a paciência é uma grande virtude, a torcida, os jornalistas, a crítica precisam ser pacientes com Dunga, porque em 2014 o Brasil bateu no fundo, chegou ao pior momento da sua história. Eu vi que o time sentiu dificuldades contra todas as seleções que enfrentou. Infelizmente os jogadores brasileiros interpretam o futebol como um jogo individual, mas é um esporte de equipe. Quando você joga 1 contra 11, você perde e vai perder sempre.
Mas para o senhor, Dunga é a pessoa certa para guiar o Brasil?
- Absolutamente sim.
O que é que você pensa do afastamento do Thiago Silva da seleção?
Quando uma equipe não joga bem, todos os jogadores parecem ser piores daquilo que são. Isso aconteceu com o Thiago Silva no Brasil. Viram mais os defeitos do que as virtudes. A Seleção tem ótimas individualidades, aliás quase todos são muito bons, mas jogam para eles mesmos. Assim, vai ser difícil o Brasil competir contra outras equipes mundiais ou sul-americanas, até com menos técnica, mas que jogam com 11. Veja que Messi é o maior quando atua no Barcelona, mas na Argentina não é esse fenômeno. Não podemos dizer que a Argentina seja fraca, claro que não. Mas o bom jogo coletivo de um time multiplica a qualidade dos jogadores. A sinergia do Brasil em 2014 foi cada um por sua conta: o David Luiz jogando sozinho contra todos, o Marcelo igual. Mas os jogadores têm de entender que o futebol é e será sempre um esporte de equipe. Acho que devem deixar o Dunga trabalhar, mas os clubes também têm de dar a sua contribuição, impondo essa mentalidade de jogo coletivo e não apostando só em individualidades no Campeonato Brasileiro.
Com tanta qualidade técnica e pouco jogo coletivo, o que é que um treinador pode fazer para dar um jogo ao Brasil?
- Não é só o treinador. Eu vejo jogadores com muita qualidade, mas pouca disponibilidade. Os jogadores também têm de se doar mais.
O senhor acha que não é tanto um problema dos treinadores brasileiros, mas uma aposta sua por um técnico brasileiro no passado não deu resultado. Se arrepende de ter levado Vanderlei Luxemburgo para Madri quando era o diretor técnico do Real Madrid em 2004?
- Não, claro que não. É um ótimo treinador. Mas ele foi treinar o Real num momento complicado. O Real Madrid também é o tipo de clube que aposta muito nas individualidades e não é fácil comandar o time merengue.
O que achou de Real Madrid e Barcelona nas quartas de final da Champions?
- Foram todos jogos muito interessantes, equilibrados e com surpresas. O Wolfsburg bateu claramente o Real Madrid e ninguém imaginava isso a começar pelos próprios jogadores. Mas nenhum resultado é definitivo. Os jogos estão todos em aberto. O próprio Bayern sofreu com o Benfica e mesmo o Barcelona, que se o Torres não tivesse sido expulso, provavelmente não teria ganho aquele jogo.
Qual jogador brasileiro você admira neste momento?
- Gosto muito do Thiago Silva. O nível dos jogadores brasileiros é muito elevado. Fisicamente também são muito preparados, mas repito: sentem muita dificuldade para participar do jogo coletivo.