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ImprimirUm levantamento da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul sobre as audiências de custódia, realizadas entre março e agosto deste ano, em Campo Grande, aponta que 79% das pessoas custodiadas não tinham sequer concluído a educação básica. Conforme o coordenador do Nucrim (Núcleo Criminal da Instituição), defensor público Gustavo Henrique Pinheiro Silva, foram analisados os perfis de 1.350 pessoas. Destas, aproximadamente 88% foram presas por fatos cometidos sem violência ou grave ameaça e 70% por pessoas tecnicamente primárias.
“Quando o recorte estatístico passa a ser a escolaridade do indivíduo, temos que 79% das pessoas custodiadas não tinham concluído a educação básica (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio). Ainda mais trágico foi verificar que cerca de 50% das pessoas presas não tinham sequer o ensino fundamental completo (46,33%) ou simplesmente não haviam estudado (2,80%). Isso reflete uma realidade de baixíssima escolaridade entre os custodiados”, detalhou.
Diante dos dados, o defensor lembra que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação destaca que a educação básica tem por finalidade desenvolver o educando e assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania.
“A interrupção dos estudos, ainda na fase da educação básica, pode ter por consequência a formação insuficiente do indivíduo em sua condição humana, compreensão dos valores que fundamentam a vida em sociedade, a formação ética e o pensamento crítico”, reflete.
Renda
Quando o recorte estatístico passa a ser a renda média do indivíduo, 20% estavam desempregados, 21% tinham renda menor do que 1 salário mínimo (ganhavam até R$ 1.099), e 44% ganhavam entre 1 e 2 salários mínimos (ganhava entre R$ 1.100 a R$ 2.200). Apenas 11% tinham renda superior a 2 salários mínimos, e os demais 4% não informaram a renda. Com isso, temos que 85% dos custodiados tinha renda igual ou inferior a 2 salários mínimos”, detalhou.
Reflexão
Para a reflexão dos dados de escolaridade e renda, considerando um viés econômico, o coordenador do Nucrim destaca que deve ser levado em conta a Portaria Interministerial nº 3 de 2020, que dispõe que o Brasil deve investir, por ano, R$ 3.349,56 por aluno.
Para Mato Grosso do Sul, de acordo com a mesma Portaria, o valor destinado a um aluno do ensino fundamental ou médio varia de R$ 4.040,00 a R$ 5.252,00, a depender da série do ensino básico, se é em área urbana ou rural e se o ensino é integral ou não.
Os custos envolvidos na criação de uma vaga prisional, conforme o Relatório de Auditoria do Tribunal de Contas da União (TC 003.673/2017-0), variam de cerca de R$ 32 mil (custo para criação de uma vaga em MS), a mais de R$ 100 mil em alguns outros estados da federação. A estimativa é que o custo médio de manutenção de um preso no Brasil seja algo em torno de R$ 30 mil por ano, conforme divulgado pelo PNUD/ONU (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).
“Assim, verifica-se que ‘investimos’ cerca de oito vezes mais para encarcerar as pessoas que para educá-las, e essa baixa escolaridade, como notório, tem reflexos diretos na renda pessoal. É possível notar efeitos diretos na baixa escolaridade e/ou baixa renda com o maior encarceramento das pessoas”, reflete.
Caso
Exemplo do que foi apontado nas estatísticas é um caso ocorrido em abril de 2021, em que um jovem foi preso em flagrante pela suposta prática de tentativa de furto de uma motocicleta. O rapaz, de 19 anos, tinha apenas o ensino fundamental incompleto e estava trabalhando em uma borracharia, com renda de R$ 900 por mês. Era usuário de drogas desde os 10 anos.
Em audiência de custódia, embora tecnicamente primário e sem antecedentes, em uma acusação sem violência ou grave ameaça à pessoa, a decisão judicial foi pela manutenção da prisão. Posteriormente, pelos fatos acima narrados, ele foi denunciado e passou a responder ao processo criminal. No início de agosto de 2021, e passados cerca de 3 meses, o assistido foi absolvido e, só então, foi determinada sua soltura.
“Interessante notar que a motocicleta que teria sido objeto da suposta tentativa de furto era avaliada em cerca de R$ 2.500. O jovem apontado como suposto autor — e que, ao final do processo foi absolvido — permaneceu preso por mais de 3 meses. Estima-se que tal encarceramento desnecessário tenha custado ao Estado mais de R$ 7.500”, diz.