Terça-Feira, 22 de Outubro de 2024
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21/10/2024 12:00:00
Especialistas alertam sobre uso indiscriminado de remédios para emagrecer, como o ozempic

AB/LD

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Aquela barriguinha ou a manifestação repentina de uma papada podem até indicar que você está além do peso recomendado. Mas não é qualquer pneuzinho que, do ponto de vista médico, indica obesidade.

Para isso, é necessário saber o índice de massa corpórea (IMC) do indivíduo, informação a ser obtida mediante exames clínicos. Se o IMC for igual ou maior que 30 quilos por metro quadrado (kg/m²), trata-se de um indivíduo obeso – e não importa a aparência física.

Com o aumento no Brasil e no mundo da população com excesso de peso, tornou-se uma mania o uso de medicamentos como o ozempic, que ajudam a pessoa a “secar” em um intervalo de mais ou menos um ano, supostamente sem esforço físico. Mas como esse remédio age no organismo e quais os seus possíveis efeitos colaterais? Essas e outras questões serão respondidas, a seguir, por duas especialistas no assunto.

No mais recente Congresso Internacional de Obesidade (ICO), realizado em São Paulo (SP), em junho deste ano, pesquisadores afirmaram que, a partir das tendências atuais, quase metade dos adultos brasileiros (48%) terá obesidade até 2044 e mais 27% terão sobrepeso.

Ainda, 56% dos adultos brasileiros têm obesidade ou sobrepeso atualmente (34% com obesidade e 22% com sobrepeso). O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) vem sistematicamente recomendando políticas públicas mais eficazes para o combate a essa disfunção.

De acordo com a Secretaria de Estado de Saúde, a população obesa de Mato Grosso do Sul é de 36,6%. Por aqui, a prevalência de obesidade entre homens é de 21,8% e entre mulheres, de 29,5%.

Já Campo Grande, em quinto lugar no ranking (27%), está entre as capitais do País com os maiores índices de obesidade. São números que preocupam e que merecem atenção – isso sem falar no aumento do consumo de medicamentos para superar o problema.

PROMESSAS MILAGROSAS

Para começar, não se engane. Uma pessoa obesa raramente goza de plena saúde. “Difícil de isso acontecer, pois, mesmo com exames normais, a obesidade é um fator de risco para diversas doenças, entre elas câncer”, afirma a endocrinologista Lilian Bianca Martelo.

Segundo a médica, a população obesa não para de aumentar em decorrência do estilo de vida sedentário, do aumento do tempo das crianças perante as telas e do crescimento no consumo de alimentos industrializados.

“O ozempic ou a semaglutida agem no organismo diminuindo o esvaziamento gástrico [e reduzindo os níveis de glicose], dando uma sensação maior de saciedade, e sinaliza para o cérebro reduzir a alimentação e a fome. E pode provocar, como efeitos colaterais mais comuns, náuseas, vômito e diarreia”, diz a especialista, que mantém uma clínica no centro da Capital e é professora do curso de Medicina da Uniderp.

O que ocorre se houver a interrupção do remédio após a perda de peso? “Como a obesidade é uma doença crônica, o uso da medicação deve ser prolongado e, juntamente a ela, deve haver uma mudança do estilo de vida, pois sem a medicação o retorno do peso pode ocorrer”, afirma Lilian.

Uma eventual redução da dosagem pode ajudar a manter o peso conquistado? “Depende do paciente e de sua sensibilidade à medicação. Manter o peso é sempre mais difícil do que perder”, responde a doutora.

A médica pontua que ainda não é possível afirmar sobre a necessidade de se tomar o remédio indeterminadamente. “Não temos esse estudo ainda, mas sabemos que o consumo pode ser por dois ou três anos pelo menos. E sim, há o risco de se perder peso além do recomendado. Sempre que a medicação não está sendo indicada corretamente e sem acompanhamento médico, esse risco existe”, alerta Bianca, que reforça: “Afinal, é uma medicação vendida sem receita médica”.

A endocrinologista retoma o assunto dos efeitos colaterais para os casos de quem interrompe e volta a tomar o ozempic. “Os efeitos colaterais podem reaparecer, sim, se a pessoa parar e em seguida retomar o remédio. Vai depender da dose de reinício”, ressalta a especialista.

“Com a febre das medicações para obesidade e a busca do corpo perfeito, o uso abusivo das medicações com doses erradas e protocolos milagrosos estão por toda internet. A mais nova é o uso de medicação manipulada sendo vendida a custos muito elevados em algumas clínicas”, frisa .

Não sabemos como estão sendo feitos [esses remédios], se a patente da medicação não está liberada. Cuidado com promessas milagrosas”, avisa Lilian, que ainda aconselha: “As medicações sempre têm que ser associadas com dieta adequada e exercícios físicos”.

CELEBRIDADES

Durante a pandemia de Covid-19, a enfermeira Sara Marinho chegou a engordar cerca de 15 kg. Desejando baixar o seu peso, ela recorreu a um médico que lhe receitou o ozempic.

A medicação tinha acabado de ser lançada no Brasil, vinda dos Estados Unidos. Na época, uma caixa custava cerca de R$ 600 e só podia ser comprada com receita médica.

O tratamento começou com uma dosagem de 0,25 miligramas e aumentou gradativamente. A enfermeira conta que perdeu cerca de 8 kg em dois meses, mas não esperava por alguns efeitos colaterais. “Eu fui inventar de beber porque era o meu aniversário. Passei muito mal, vomitei muito. Foi horrível e traumático. Além disso, tive diversos efeitos colaterais, como sudorese e fraqueza”, conta Sara.

O desafio de manter o peso ideal e a busca pela magreza foram fatores que impulsionaram o aumento significativo no uso de medicamentos para emagrecimento como o ozempic. Esse fármaco – indicado clinicamente para o controle da diabetes tipo 2 e desde 2018 para a obesidade – atua diretamente no controle do apetite.

“Ao controlar os níveis de glicose no sangue e promover a sensação de saciedade no cérebro, o ozempic reduz o apetite e a ingestão de alimentos, levando assim ao emagrecimento”, explica a farmacêutica Rayssa Bueno, que também é professora da Wyden e do Instituto de Educação Médica (Idomed).

Com os resultados positivos, as vendas do medicamento dispararam. Dados da indústria farmacêutica indicam que o consumo de ozempic aumentou 91% no ano passado. Esse crescimento também se deve à influência de celebridades que relataram o sucesso na perda de peso com o uso do medicamento.

No entanto, Rayssa destaca os riscos do uso indiscriminado: “O uso do ozempic sem prescrição médica e para fins estéticos é desaconselhado. Pode provocar efeitos colaterais como obstrução intestinal, pancreatite, gastroparesia, redução da mobilidade do trato gastrointestinal e até mesmo câncer”, alerta.

A especialista faz uma recomendação para aqueles que consideram o uso de ozempic para a perda de peso.

“Os pacientes devem buscar o acompanhamento contínuo de profissionais médicos, que ajustarão as doses conforme a realidade clínica de cada um. Mudanças no estilo de vida, com uma melhor alimentação, a inclusão de atividades físicas e um equilíbrio emocional são cruciais para o sucesso do tratamento”, conclui.

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