Correio do Estado/LD
ImprimirO Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) autorizou nos últimos quatro anos a supressão de pelo menos 35 mil hectares de mata nativa do Pantanal em áreas de preservação, o que contraria a legislação ambiental e normas do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama).
O desmatamento da vegetação nativa ocorre – as licenças ainda produzem efeito – em três fazendas no município de Corumbá. Todas as licenças emitidas pelo Imasul são objeto de ações civis públicas ajuizadas no período pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul.
SÃO SEBASTIÃO
A ação civil pública mais recente, ajuizada no fim do ano passado, tenta impedir o desmatamento de 10.516 hectares da Fazenda São Sebastião, que pertence à empresa Majora Participações Ltda., de São Paulo (SP).
A promotora de Justiça de Corumbá, Ana Rachel Borges de Figueiredo Nina, afirma no pedido feito ao Poder Judiciário que existem falhas em omissões graves no laudo do Imasul, que poderão causar grande impacto ambiental.
A autorização emitida pelo Imasul, segundo a promotora, entre outras falhas, não respeitou o zoneamento econômico-ecológico do estado de Mato Grosso do Sul, as resoluções do Conama, tampouco o código florestal.
O documento do Imasul libera a retirada de 1,6 mil hectares de vegetação arbórea e de mais 8.087 hectares de pastagens nativas. O instituto estadual ainda autorizou a sapecagem (queima controlada) de mais 1,6 mil hectares.
Conforme a promotora de Justiça, entre outras falhas, o Estudo de Impacto Ambiental analisado e liberado pelo Imasul ofereceu uma compensação ambiental desproporcional, não ofereceu medidas mitigatórias e ainda omitiu todas as áreas de preservação permanente da propriedade.
“É inegável que a supressão vegetal e a substituição das pastagens nativas (...) poderão causar grande impacto ambiental no ecossistema da Bacia do Paraguai (Sub-Bacia do Rio Taquari), haja vista a possibilidade de causar o atropelamento e afugentamento de animais silvestres", afirmou a promotora.
"Além da alteração da qualidade do ar; a contaminação do solo; incêndios; a exposição do solo a intempéries; a perda do banco de sementes; a redução de matéria orgânica do solo; a dificuldade do fluxo gênico de fauna e flora; a extinção de espécies vegetais e animais; e a formação de processos erosivos”, continuou.
A Fazenda São Sebastião está localizada na Bacia do Taquari, região do Alto Paraguai, muito próxima a várias áreas que registram focos de incêndio.
SANTA MÔNICA
Em outra ação civil pública, a mesma promotora de Justiça acusa falhas semelhantes em uma área ainda maior: a Fazenda Santa Mônica.
Lá, o Imasul não teria observado a legislação ambiental vigente para liberar o desmate de 20,5 mil hectares de vegetação nativa, entre mata e pastagens.
A guerra de liminares, que seguiu desde a 1ª instância (que retirou os efeitos da licença ambiental do Imasul), só foi concluída neste ano, depois que o presidente do Tribunal de Justiça, Paschoal Carmello Leandro, julgou de forma contrária ao último recurso ajuizado pelo Ministério Público e liberou o desmatamento.
A Fazenda Santa Mônica, propriedade de 38,3 mil hectares no Alto Paraguai, localizada entre os rios Taquari e Piquiri, pertence ao fazendeiro e ex-vereador de Maracaju Elvio Rodrigues.
No processo em que Rodrigues e o Imasul são acusados, foi preciso o governo de Mato Grosso do Sul acionar a Procuradoria-Geral do Estado, via pedido de suspensão de liminar (um raro recurso, em que o governador endereça o pedido diretamente ao presidente do Tribunal de Justiça), depois que Elvio Rodrigues perdeu em recursos ordinários, como agravos, por meio de seu advogado.
CRUZ ALTA
Em maio de 2018, a mesma promotora questionou outro laudo do Imasul, que também não teria respeitado o Zoneamento Econômico-Ecológico do Pantanal.
Desta vez o alvo foi a Fazenda Cruz Alta, pertencente a várias pessoas da Família Burani, que residem em Campo Grande e em São Paulo (SP).
Nesta fazenda, a autorização do Imasul era para um desmate de 4,1 mil hectares de mata nativa e pastagem pantaneira. Para piorar a situação dos proprietários, o Ministério Publico constatou que 9,8 hectares de vegetação foram desmatados antes mesmo da expedição da autorização do Imasul, alvo da ação civil pública.
Além de não solicitar reposição florestal alguma e de não respeitar o zoneamento econômico, o Ministério Público aponta que os proprietários ainda não apresentaram estudos arqueológicos e autorização para estudos arqueológicos – embora exista a possibilidade de existência de sítios arqueológicos na área licenciada.
Também omitiram a presença de 109,52 hectares de vegetação nativa arbórea na área licenciada e ainda não fizeram e nem sequer apresentaram qualquer estudo sobre a fauna da região, entre mamíferos, aves e peixes, ameaçados de extinção.
“Outrossim, porque as atividades de supressão e alteração de pastagens não atendem ao nível de preservação da planície e as condições históricas de sua ocupação, haja vista que as vantagens são apenas financeiras e somente atendem ao interesse do empreendedor, ora requeridos”, finalizou a promotora.
Todos os processos ainda não foram transitados em julgado. Eles continuam tramitando na Comarca de Corumbá.