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ImprimirA ministra Maria Isabel Gallotti, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), respaldada por um relatório da Polícia Federal, destacou indícios de que o desembargador Divoncir Schreiner Maran, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), teria se comprometido a conceder um habeas corpus ao chefão do Primeiro Comando da Capital (PCC) no estado, Gérson Palermo, conhecido como ‘Pigmeu’, antes mesmo de o pedido de liberdade ser formalizado e distribuído a seu gabinete.
A PF levanta suspeitas de que o desembargador tenha recebido propina e praticado lavagem de dinheiro por meio da modalidade conhecida como ‘gado de papel’, tendo seu filho envolvido no esquema.
A defesa de Divoncir Maran preferiu não se manifestar, considerando que os autos do processo estão sob sigilo.
O desembargador, que se aposentou em abril ao completar 75 anos de idade, está sob investigação por suposta venda de decisão em favor de ‘Pigmeu’, que cumpre pena por tráfico de entorpecentes e outros crimes, incluindo o sequestro de um Boeing da antiga Vasp (Viação Aérea São Paulo) em 2000, no Paraná.
De acordo com a ministra do STJ, há indícios de que o desembargador já estava ciente de que o pedido de habeas corpus seria apresentado em seu dia de plantão no tribunal em 2020.
Ao receber o pedido da defesa de ‘Pigmeu’, ele teria ordenado a concessão da ordem, mesmo diante da falta de comprovação da doença alegada pelo réu e de seu extenso histórico criminal.
As suspeitas que pairam sobre a conduta do desembargador foram detalhadas em uma decisão da ministra do STJ, que optou por não analisar o pedido de indiciamento de Divoncir Maran feito pela Polícia Federal.
Segundo ela, a competência do caso já não pertence mais ao STJ devido à aposentadoria do magistrado. O caso agora será avaliado por uma Vara Criminal de Campo Grande.
Despacho
No despacho assinado recentemente, a ministra Gallotti descreveu os principais elementos levantados pela PF ao longo das investigações, dando destaque aos relatos de dois assessores do desembargador: Fernando Carlana, conhecido como ‘Bob’, ex-assessor-chefe do magistrado, e Gabriela Soares, responsável por redigir a decisão em benefício do líder do PCC, sob ordens do desembargador.
Fernando ‘Bob’ revelou ter recebido do desembargador uma série de informações sobre o habeas corpus e repassou os dados para Gabriela, juntamente com a determinação de Divoncir Maran de que o pedido deveria ser aceito.
A PF concluiu que o desembargador já havia tido acesso ao documento antes mesmo da distribuição a seu gabinete.
Ao analisar as mensagens trocadas entre Fernando ‘Bob’ e Gabriela, os investigadores constataram que ela comunicou ao ex-assessor-chefe de Divoncir Maran ter realizado uma “gambiarra” para minutar a decisão nos termos orientados pelo desembargador. Mesmo diante da falta de comprovação da doença alegada por ‘Pigmeu’ e de seu histórico criminal, Fernando ‘Bob’ indicou que assinaria a liminar, ignorando as observações de Gabriela.
A ministra Gallotti observou que, quando os investigadores apreenderam o celular do desembargador, todas as mensagens haviam sido apagadas, o que, segundo a Polícia Federal, reforça a hipótese de que o magistrado teria atuado para favorecer o líder do PCC.
Em relação à lavagem de dinheiro, o relatório da PF detalha como a propina pela decisão teria sido paga ao desembargador, envolvendo inclusive a suposta participação de um filho do magistrado.
A ministra Gallotti vê indícios de lavagem de dinheiro por meio da modalidade ‘gado de papel’.
A remessa do caso para uma das Varas Criminais de Campo Grande segue o parecer do Ministério Público Federal e abre espaço para a discussão sobre o foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal (STF).
A ministra alertou para a possibilidade de revisão de posições e ressaltou que a movimentação não gera risco de nulidade do processo.
Quanto ao pedido de indiciamento de outro desembargador, Marcos Brito, a ministra não viu indícios suficientes até o momento para sustentar tal medida.