IstoÉ/PCS
Apesar da concessão de medidas emergenciais de proteção à mulher vítima de violência pelo Poder Judiciário, como proibição de contato do agressor e afastamento dele do lar, outras ações necessárias, como a definição de pensão alimentícia à vítima, não são deferidas, o que demonstra falhas na aplicação integral da Lei Maria da Penha, segundo a pesquisa O Papel do Judiciário na Concessão das Medidas Protetivas. O levantamento foi divulgado hoje (12) pelo Núcleo de Defesa da Mulher (Nudem) da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ).
O trabalho analisou 295 casos em que houve atuação da Defensoria Pública e foi verificado que em 67,46% houve a concessão de medidas protetivas e apenas em 13,9% os pedidos foram totalmente negados. Mas nenhum pedido relacionado à prestação de alimentos provisionais ou provisórios foi autorizado no juizado de violência doméstica.
Segundo a autora do trabalho, a socióloga e diretora de Estudos e Pesquisas da DPRJ, Carolina Haber, o objetivo da pesquisa foi dar um panorama para os defensores que atuam na área sobre como essas medidas estão sendo tratadas pelo Judiciário. “A gente verificou que as medidas protetivas concedidas acabam sendo sempre as mesmas, como afastamento do lar, e alguns pedidos nunca são concedidos, como o de alimentos, o que obriga a mulher vítima da violência a recorrer a outras esferas no Judiciário para resolver o problema dela, por exemplo, ir a uma vara de família.”
A partir desta constatação, a segunda etapa da pesquisa levantou nas varas de família os processos que tiveram a atuação do Nudem. Do total, 55% duraram entre 56 e 290 dias até a homologação e 28% foram extintos sem resolução do mérito. Apenas em um caso houve a decretação da prisão do acusado e a suspensão do direito de visitar os filhos.
“A gente verificou quanto tempo ela [mulher vítima] demora, por exemplo, para ter um pedido de alimentos concedido. A média é quatro meses. Olhando para as duas etapas, a gente vê que, primeiro, ela não tem esse tipo de pedido atendido nos juizados e precisa recorrer à vara de família. E na vara da família demora quatro meses.” A demora, segundo Carolina, piora a situação de vulnerabilidade das vítimas.
Para a diretora, a aplicação das mesmas medidas sempre demonstra que os juízes não se aprofundam nos casos. “Acaba não individualizando a situação da mulher, acaba que o juiz prefere dar as medidas mais fáceis de serem aplicadas, porque não demanda uma precessão mais profunda do caso por ele.”
Proteção limitada
De acordo com a coordenadora do Nudem, Arlanza Rebello, a Lei Maria da Penha precisa ser aplicada integralmente, o que não vem ocorrendo. “A Lei Maria da Penha pensa numa defesa integral a essa mulher. Hoje o que percebemos é que as medidas protetivas deferidas são medidas parciais. Notadamente proibição de aproximação, proibição de contato e, quando muito, afastamento do lar. Outras medidas previstas na Lei Maria da Penha, como alimentos provisórios, guarda provisória, revogação de procurações e outras que a mulher necessitar não têm sido analisadas pelo Judiciário, isso têm sido entendido como desnecessário, digamos assim.”
“O que a gente vê hoje é que até as medidas protetivas estão sendo encolhidas, existe um rol imenso de medidas protetivas e apenas três são as medidas deferidas”, acrescentou.
Este mês, quando se comemora o Dia do Defensor Público, no dia 19, a DPRJ promove uma série de debates sobre como melhorar a aplicabilidade da Lei Maria da Penha.
“Já fizemos um primeiro encontro sobre feminicídio, que muitas vezes são mortes anunciadas. Estamos discutindo o dever de proteção à mulher, que é um dever estatal, o Brasil, como signatário de tratados internacionais, assumiu. É uma resposta que a gente ainda não tem, estamos atuando, essa é uma discussão, de que maneira a gente pode dar mais efetividade à Lei Maria da Penha na proteção à mulher.”