IstoÉ/PCS
A PF o trata como testa de ferro da família Chater, dona do Posto da Torre, que deu origem à Operação Lava Jato, e que agora é acusado de movimentar ilegalmente US$ 2 bilhões
É uma pessoa muito humilde, sem vaidade e ostentação. Esse é seu Sebastião Corrêa, segundo seu advogado. De fato, ele é um homem de idade avançada, que mora num apartamento de um hotel decadente em Brasília, o Bay Park, no qual a PF encontrou “mobiliários simples e um tanto desorganizados”, além de “poucas peças de roupas puídas e manchadas”. Mas foi lá também que os policiais tiveram uma surpresa. Em meio à bagunça do lugar, a PF apreendeu US$ 25 mil e R$ 129 mil em dinheiro vivo num cofre, moedas pelo chão e uma caixa com R$ 5 mil em notas de R$ 2, assim como um revólver 38 com seis balas. Foi com esse paradoxo que a PF descreveu Sebastião Corrêa em seu relatório de busca e apreensão realizada em 26 de abril, quando o prendeu em flagrante por posse irregular de arma de fogo – ele foi solto no mesmo dia após pagar fiança de R$ 1 mil.
Os agentes da PF foram até o Bay Park, à beira do Lago Paranoá, no Setor de Hotéis e Turismo Norte em Brasília, como parte da Operação Perfídia, que investiga a atuação empresarial do genro de Sebastião Alves Corrêa, Tony Chater, e a irmã dele, Cláudia Chater – ambos são primos do doleiro Carlos Habib Chater, condenado a dez anos de prisão pelo juiz Sérgio Moro na Operação Lava Jato. Chater é dono do Posto da Torre, em Brasília, onde funcionava uma casa de câmbio e um lava jato de automóveis, que acabou emprestando o nome para a Operação Lava Jato, a maior devassa ao meio político da história do País. No hotel, os agentes encontram o empreendimento em situação de “abandono” e “com mais da metade do complexo desativado”, de acordo com relatório obtido por ISTOÉ. Apesar disso, nove prédios com total de 810 apartamentos estão em construção no local.
A Operação Perfídia investiga documentos apreendidos com a família Chater que apontam que eles “lavaram” mais de U$ 2 bilhões para políticos de Brasília, cujos nomes ainda estão sendo investigados. E a PF quer saber porque o Bay Park, que aparece nessa investigação, está em nome de Sebastião, um homem que ainda usa uma velha TV com tubo em seu apartamento. Para a PF, ele é “laranja” dos familiares do dono do Posto da Torre.
Mas, afinal, o que é o Bay Park? A reportagem obteve documentos da PF revelando que ao menos quatro empresas funcionam no mesmo endereço do Setor de Hoteis e têm o nome fantasia ou endereço eletrônico indicando “Bay Park” perante a Receita Federal: Brasil Hospedagens, Correia Hospedagem, Marina Tour e Lago Paranoá. As duas primeiras estão em nome de Sebastião e a terceira já esteve em nome dele. A Marina está em nome de Arolita, a filha de Sebastião, e do marido dela, Tony Chater. A Lago Paranoá está registrada em nome de Arolita e da prima Raimunda Neves. O emaranhado de empresas logo foi percebido pela PF. “Foi constatado que a família possui um estranho hábito de constituir empresas e alternar seus quadros sociais entre os familiares, encerrando e criando razões sociais distintas para explorar o mesmo segmento com o mesmo nome fantasia”, analisa o relatório do delegado Renato Pagotto.
Quem é dono do Bay Park?
Segundo a PF, Sebastião “tem ou já teve participação societária na maioria das empresas do grupo” investigado na Operação Perfídia. A hipótese dos agentes e delegados é que ele “supostamente participa da abertura de empresas de fachada e da movimentação financeira do grupo”. No relatório de busca e apreensão, os policiais afirmam que Sebastião “controla precariamente a contabilidade da empresa Bay Park Hotel”. No mesmo dia 26 de abril, houve buscas contra o filho dele, Airam Corrêa. “Ficou evidente que o padrão de vida ostentado por ambos os alvos de investigação é infinitamente inferior ao volume de recursos movimentados pela família e suas empresas”.
E quem é o dono do Bay Park? O advogado de Sebastião, Arolita e Airam, Luiz Philipe Resende, diz que o hotel é da empresa Lago Paranoá, pertencente à mulher de Tony. Sebastião administra essa firma?
“Diretamente não”, responde o advogado. Segundo ele, o homem leva vida simples e não tem nenhum sócio ou investidor informal. “Ele trabalha 24 horas, é incansável, tudo o que ganha é reinvestido”, descreve.
“Ele não tem vaidade, tem vontade de trabalhar e fazer patrimônio. É isso que tem feito a vida toda”. Mas, para a PF, a situação de Sebastião não é bem essa. Ele é suspeito de ser “laranja” da família Chater e de estar sendo usado para “lavar” dinheiro de operações fraudulentas, que encobrem quem mandou para o exterior pelo menos U$ 2 bilhões nos últimos tempos.
Sebastião é sogro de Tony Chater, acusado de movimentar dinheiro ilegal. PF desconfia que seja laranja
A PF tenta descobrir qual a relação do Bay Park com o resto da Operação Perfídia. Philipe Resende e o advogado de Tony e Cláudia, Ennio Bastos, dizem que não há ligação.
Na casa de Cláudia, foram encontrados documentos mencionando o envio de cerca de US$ 5 bilhões da Venezuela para a Dinamarca. Mas Bastos afirma que aquilo era apenas um “modelo de contrato” que se encontra na internet. A assessoria da PF afirmou à ISTOÉ que a Perfídia “é uma investigação em andamento e na qual foram encontrados documentos que carecem de explicação”. Cláudia Chater foi solta pelo juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara, em 6 de julho.
Segundo Bastos, ela e o irmão foram envolvidos indevidamente no caso. “É uma peça de ficção científica”, critica. Por telefone, Tony Chater negou quaisquer ilegalidades e afirmou que a Operação Perfídia não tem provas contra ele. A PF diz que este caso da família Chater pode se transformar numa nova operação, tão importante como foi a Lava Jato. É esperar para ver.
Um patrimônio sob suspeição
• O Bay Park, à beira do Lago Paranoá, fica no Setor de Hotéis e Turismo Norte e está em situação de “abandono”, “com mais da metade do complexo desativado”. Apesar disso, nove prédios com total de 810 apartamentos estão em construção
• Ao menos quatro empresas funcionam no mesmo endereço e têm o nome fantasia ou o endereço eletrônico indicando “Bay Park”: Brasil Hospedagens, Corrêa Hospedagem, Marina Tour e Lago Paranoá. Duas estão em nome de Sebastião Corrêa, uma já esteve em nome dele, duas estão em nome da filha dele, uma está em nome também de seu genro Tony Chater
• No apartamento de Sebastião, a PF encontrou “mobiliários simples e um tanto desorganizados”, além de “peças de roupas simples, puídas e manchadas”, um revólver 38 com seis balas, sistema de segurança com câmeras, US$ 25 mil e R$ 125 mil em dinheiro vivo
• Para a PF, Sebastião “controla precariamente a contabilidade da empresa Bay Park Hotel, mas “o padrão de vida ostentado” foi considerado “infinitamente inferior ao volume de recursos movimentados pela família e suas empresas”