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O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu essa semana que o porte de maconha para uso pessoal não será considerado crime. No entanto, estabeleceu limites de 40 gramas para essa posse. De acordo com o ministro Ricardo Lewandowski, a iniciativa possui entre os pontos principais aliviar a superlotação das prisões brasileiras, porém, em Mato Grosso do Sul, essa queda no índice de presos não deve ser notada.
Um levantamento feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta que em MS, a quantidade média de maconha apreendida com pessoas que se tornaram réus por porte de drogas no tribunal de justiça comum do Estado, é de 1.140 gramas, índice acima da média brasileira, que é de 85 gramas, e do que foi estipulado pelo STF como de uso próprio, que é de 40 gramas.
Entretanto, o Ipea também informa que Mato Grosso do Sul está abaixo da média nacional, de 67%, em relação à porcentagem de casos na justiça, em que teve apreensões de maconha, sendo de 64% no Estado.Ou seja, em MS, as pessoas que se tornam réus por tráfico de drogas, geralmente estão com grandes quantidades de ilícitos.
O advogado criminalista Gustavo Scuarcialupi, informa que como MS é um local onde há grandes apreensões de drogas, possivelmente esse índice está elevado devido a soma dessas quantidades.
“Como a gente tem muitos casos de grandes quantidades, por exemplo, toneladas, pode ser que alguns casos, por ter essa questão da média, e ela ser feita com o peso, um (caso) tem uma tonelada e outro só 10 gramas, essa média pode ter uma implicação”, comenta Scuarcialupi.
Dados da Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen), destacam que no mês de maio, dos 21.430 presos no sistema carcerário do Estado, 7.782 eram devido a tráfico de entorpecentes, o que representa 36% do total. De janeiro de 2024, até maio, esse índice não sofreu grandes alterações. No primeiro mês do ano 7.626 pessoas estavam presas em MS por tráfico de drogas; em fevereiro eram 7.439 detidos; em março 7.632 e em abril, 7.935.
A pesquisadora Milena Karla Soares, do Ipea, apresentou estudos sobre os impactos no sistema de justiça e prisional brasileiro, relacionados à descriminalização do porte de cannabis e cocaína, e apontou quedas consideráveis nos gastos anuais para manter presos pessoas que poderiam ser consideradas usuários desses entorpecentes.
“A depender dos parâmetros considerados, entre 23% e 35% dos réus processados por tráfico portavam quantidades de cannabis e/ou cocaína compatíveis com padrões de uso pessoal e, com critérios objetivos, poderiam ser considerados usuários. No sistema prisional, se houvesse critérios objetivos para cannabis e cocaína, entre 5,2% e 8,2% dos presos poderiam ser considerados usuários, o que resultaria em uma economia anual de R$1,3 bilhão a R$2 bilhões”, relata a pesquisadora.
DESCRIMINALIZAÇÃO
A decisão do STF prevê que o porte de até 40 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas de cannabis será considerado como para uso pessoal. Entretanto, o advogado Gustavo Scuarcialupi alerta que em casos de comprovação de venda desse entorpecente, o indivíduo pode sim responder por tráfico de drogas, independente da quantidade que ele for flagrado.
“O STF estabeleceu parâmetros que a legislação nunca estabeleceu, e isso é muito importante, porque tendo parâmetros a gente pode definir pelo menos de forma abstrata, o que vai ser um usuário e o que vai ser um traficante. Claro, independentemente da quantidade, se o indivíduo está atuando no sentido de mercância, isso foi colocado de forma bem clara pelos ministros, ainda que ele esteja com 1 grama de maconha, mas esse 1 grama é acompanhado de elementos que demonstram que ele estava fazendo a traficância, ele vai responder por tráfico de drogas do mesmo jeito”, esclareceu o advogado.
Scuarcialupi informou que a discussão sobre a jurisprudência do tipo penal previsto no artigo 28 da Lei de Drogas, que fala da posse ou porte para uso pessoal, sempre existiu, e que o Supremo Tribunal Federal analisou a questão e trouxe essas configurações para deixar mais claro o que pode ser considerado um usuário e um traficante. Mas, mesmo que seja considerado um usuário, esse indivíduo apesar de não estar cometendo um crime, ainda está cometendo um ato ilícito, e se for visualizado por uma autoridade, a maconha será apreendida.
Entretanto, o que os ministros como Ricardo Lewandowski, alegou em sua justificativa de voto, que é o alívio para a superlotação de presídios, também está estabelecido nesta decisão do STF.
“A partir do momento que tem um precedente vinculante do STF no sentido de que até 40 gramas pode ser considerado a posse para uso pessoal, parte, e aí foi isso que o STF colocou também, uma vinculação que a autoridade policial, a autoridade acusatória, o Ministério Público, tem que demonstrar de forma concreta o porquê de não ser aplicado a questão do porte e da posse para uso pessoal. Então a autoridade policial sempre teve que fazer isso, mas agora é mais efetivo”, explicou Scuarcialupi.
Em seu voto, o ministro pontua que “o Judiciário como um todo e o Supremo Tribunal Federal perceberam que, quando se trata de alguém de cor negra, da periferia, ele é preso em flagrante com drogas e é considerado um traficante, e quanto se trata da prisão de alguém de cor branca, que mora em um bairro de classe média ou alta, é considerado um usuário”, disse Lewandowski.
Para o advogado, a decisão do STF foi positiva, pois impôs medidas, que vão sair da questão racial, social e econômica, como formas de decisão do que é um usuário e um traficante.
Saiba
Os elementos que demonstram tráfico de drogas incluem acessórios, balança de precisão, instrumentos para dividir a droga, caderneta para controle de vendas, e o celular, após apreendido, demonstrando contato com cliente.