IstoÉ/PCS
Crises de choro, resfriado constante, dores de cabeça e um problema que incomodava constantemente: o trabalho excessivo. O que parecia um simples estresse diário se tornou um pesadelo chamado síndrome de Burnout. Dois anos atrás, a administradora Helloá Regina descobriu que sofria com a doença, mas não imaginava que todos os sintomas estavam relacionados com a carreira. “Eu nunca desligava, trabalhava em média nove horas por dia e depois ia para a faculdade e morava sozinha. Começou a afetar a minha vida pessoal, todos ao meu redor falavam que eu estava estranha, triste e pra baixo”, diz.
Com poucos estudos relacionados ao tema no Brasil, ainda existem pessoas que desconhecem a síndrome ou a confundem com depressão. Segundo números da International Stress Management Association (Isma) no Brasil, 72% dos brasileiros sofrem alguma sequela devido ao nível de estresse, sendo que 32% estão em nível de burnout.
“O estresse ataca o indivíduo, o burnout vai além, pode prejudicar as organizações”, afirma Ricardo Monezi, especialista em medicina comportamental da Unifesp. “Numa instituição que tem muita gente com burnout, a produção diminui e os funcionários podem realizar a mesma atividade duas, três vezes no dia. No burnout é algo compartilhado, atinge uma grande massa do trabalho”, diz.
Sintomas do burnout
Além do estresse coletivo, a síndrome atinge vários aspectos cognitivos como a memória, podendo provocar falta de concentração, causando até mesmo acidentes no trabalho. Já no âmbito social, a pessoa começa a se isolar, o sentimento de injustiça aflora e o indivíduo acha ninguém pode ajudá-lo.
Para o médico Ricardo Monezi, em casos mais graves, se não tratado, pode-se chegar ao suicídio. “A pessoa pode ter novas doenças, e doenças que já existiam ela não enxerga ou só vê a morte como a única via. Na crise de 2008, em Wall Street, foram registrados muitos casos de burnout, mais de 20 suicídios em uma semana”.
A decisão de acabar com a própria vida foi um dos problemas de Iria de Marco, professora que foi aposentada por causa do burnout. “Eu estava muito mal, demorou muito para eu descobrir o que eu tinha, fazia diversos exames e os médicos diziam que era apenas estresse”, conta. “Precisei ser afastada do meu trabalho e tentei suicídio quatro vezes, cheguei a me separar do meu marido, porque era uma situação insustentável”, revela.
Tanto para Helloá quanto para Iria, o trabalho consumia muito tempo de suas vidas, faltava reconhecimento e a pressão era exagerada. Mas como deixar esse ambiente harmonioso e ainda ter uma vida social?
Para Gustavo Sansi, coach licenciado pelo Instituto Brasileiro de Coaching o trabalho não pode ser o principal. “O equilíbrio envolve a saúde física, mental, espiritual e ecológica. Não é só no trabalho que o indivíduo consegue realizar os desejos da vida dele, isso é só um ponto na vida”.
Como perceber que há algo errado
Terapia e a aceitação são muito importantes na hora de diagnosticar o burnout. Mas, quando a doença já está em nível avançado, um profissional de saúde realiza um teste específico chamado Maslasch Burnout Inventory (MBI), como explica Monezi. Ele é um inventário, um questionário para verificar se a pessoa está ou não em processo de burnout.
Já quando o assunto é carreira, o coach Sansi ensina um exercício chamado “Roda da vida”, que pode ajudar quem está infeliz no âmbito profissional. “ É uma ferramenta em que a pessoa se encontra dentro de vários questionamentos e começa dar nota de 1 a 10 para eles. No aspecto familiar, como você está? No quesito trabalho, o quão feliz você é? Perguntas que são feitas e são cada vez mais aprofundadas, com o objetivo de fazer com que o próprio indivíduo ache a resposta e tente melhorar aquela situação de fardo”, explica.
No caso de Iria, a professora só se deu conta do quão grave era a síndrome e como estava abalada emocionalmente após um ano.
Tratamento
Quando o burnout é descoberto, na maioria das vezes, a síndrome é tratada com medicação, além de terapia. Porém, métodos complementares também são importantes. “A pessoa tem que ser acompanhada por um bom médico, um ótimo profissional de psicologia, equipes multiprofissionais”, diz Monezi. “As práticas contemplativas, como técnicas da meditação, yoga, acumputura e mindfulness, ajudam as pessoas com burnout”, diz.
Essa foi uma das estratégias da administradora Helloá que, além de ficar afastada por dois meses do trabalho para tratar a síndorme com medicamentos, também começou a praticar atividade física. “Eu me afastei do trabalho e comecei a fazer a terapia, busquei até outras alternativas, acupuntura e esporte. Percebi que estava me ajudando, fui aceitando e vi que não era fracasso nenhum”, diz.
Pós burnout
Quase sete anos depois do primeiro diagnóstico, a professora Iria ainda não se sente a vontade com a sociedade. Por ser uma síndrome pouco conhecida, algumas pessoas de seu meio ainda encaram como frescura ou reclamação.
Porém, depois de anos de tratamento, ela está aos poucos, conquistando a confiança. “Agora estou controlada, estou super bem, mas ainda sinto receio das pessoas”, explica. Para dividir a angústia e ajudar outras vítimas da síndrome, a aposentada também criou o livro eu, professora e burnout, onde ela conta todo o processo desde a descoberta da doença até os dias de hoje.
Para a Helloá, a rotina melhorou completamente. A administradora continua com acompanhamento médico, mas com uma vida bem mais alegre. “Hoje estou muito melhor, sou uma outra pessoa, todo mundo a minha volta já percebe essa mudança, faço amigos com facilidade e não me fecho para os outros”. Ela também criou uma página no Facebook para trocar informações e ajudar pessoas que sofrem com burnout.