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O ritual praticado pelo povo Luo, predominante na região, prevê que as mulheres mantenham relação sexual – muitas vezes com estranhos – após a morte dos maridos, no intuito de "limpá-las de impurezas".
Embora tenha sido considerado ilegal pelo governo em 2015, o costume se mantém vivo em uma das áreas mais pobres e rurais do país. E muitas vezes acontece sem o uso de preservativos, deixando as mulheres vulneráveis ao HIV, vírus causador da Aids.
A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que 1,5 milhão de quenianos são portadores da doença – e que cerca de 400 mil não sabem disso. O ritual
Pamela, de 50 anos, foi diagnosticada com HIV após ser "purificada" por um homem que se recusou a usar camisinha. E hoje faz parte do grupo de mulheres que luta para acabar com o antigo costume.
Ela explica as etapas do ritual:
"Começa com sexo no chão. Você tira a roupa e deixa no chão. Depois, vai para a cama e faz sexo de novo. Pela manhã, você tem que queimar suas roupas e os sacos em que dormiu. Em seguida, ele raspa seu cabelo."
Segundo ela, após passar quatro dias com o chamado "purificador", a mulher volta para a casa dos pais.
"Você deve cozinhar uma galinha para comer com ele. Depois, você tem que lavar tudo na casa. Então, finalmente, as crianças podem voltar", relata Pamela, que já é avó.
Até R$900 por 'purificação'
No caso de Pamela, o homem que realizou sua "purificação" permaneceu com ela após o ritual. Ele diz que fez isso para cuidar dela.
"Depois de tudo que eu passei, preferia não estar com um homem", desabafa Pamela.
Os "purificadores" chegam a cobrar mais de £ 200 (cerca deR$900) para executar a tradição.
"Elas dizem que não querem ser purificadas, mas no fundo elas querem. Algumas mulheres são forçadas a procurar um 'purificador'. E se não encontram, a vida pode ser muito difícil", diz um homem que atua como "purificador".
"A mulher deve ser 'purificada' e herdada. Porque, se não fizer isso, não terá para onde ir. É um direito que deve ser cumprido", acrescenta.
Já Pamela, que luta pela independência das viúvas, vê a situação sob outra perspectiva:
"O 'purificador' aparece do nada. Ele vem apenas de olho na propriedade que o seu marido deixou", avalia.
Terapia
Roseline Orwa, fundadora da Rona Foundation, ONG que protege e luta pelos direitos das viúvas no Quênia, realiza sessões regulares de terapia não só com as mulheres, mas também com os "purificadores", na tentativa de reeducá-los e acabar com a prática.
"Acredito que seja o início de um longo movimento feminista, particularmente para as viúvas no Quênia. Eu sou uma viúva sem filhos, então foi muito fácil para eu chegar e dizer: 'acho que isso é um abuso contra as mulheres, que se trata de estupro, que é reflexo de uma sociedade patriarcal'", diz.
"Acredito que essa cultura pode ser transformada. E acho que poderia haver leis e políticas para proteger viúvas e órfãos", completa.
Para as mulheres, as sessões de terapia são uma ferramenta importante.
"Em um grupo como esse, podemos nos apoiar mutuamente. As pessoas sabem que você perdeu um ente querido e podem dar o apoio moral que você precisa", diz Pamela.
O governo afirma, por sua vez, que a melhora na educação tem levado mais mulheres a buscarem proteção legal para seus direitos.