Correio do Estado/LD
Na semana passada, o Sistema Nacional de Meteorologia (SNM) emitiu alerta de escassez de chuvas na região da Bacia do Paraná, incluindo Mato Grosso do Sul, de junho a setembro.
Para os economistas ouvidos pela reportagem, a crise hídrica pode impactar a inflação e ocasionar a desaceleração da retomada da economia.
Segundo os especialistas, a restrição de chuvas diminui a oferta de produtos no campo, encarece a energia elétrica e, consequentemente, os produtos industrializados também sofrem impacto.
“Uma das formas que isso pode afetar a economia é na oferta de alimentos, de alguns produtos e acerca da inflação. Porque acaba ampliando os custos quando a oferta está mais restrita. Quando a gente fala que os alimentos estão com custo mais elevado por conta da crise hídrica, é porque a água é um dos principais elementos para a produção de energia elétrica e também uma fonte necessária para a plantação, para a irrigação lá no início da cadeia produtiva”, explica a economista Daniela Dias.
“E até mesmo no processo de industrialização e processamento a gente também necessita da energia elétrica, podemos ter diversos impactos inflacionários e até em aspectos produtivos”.
A pressão no índice que mede a inflação do País também pode ser grande. De acordo com o economista Marcio Coutinho, o maior impacto no bolso do consumidor será em relação ao aumento das taxas.
Em junho, por exemplo, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou a bandeira vermelha patamar 2, com custo de mais de R$ 6,24 para cada 100 kWh consumidos.
“Vejo que isso pode impactar muito mais no bolso do consumidor, a conta de energia pode ficar mais cara. Se a conta de energia sobe, temos um impacto na inflação e obviamente teremos aumento do índice”, destaca.
O secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar (Semagro), Jaime Verruck, aponta que a situação preocupa do ponto de vista de recuperação econômica do Estado.
“O impacto direto para o consumidor é no aumento do custo da energia elétrica. Mas o que nos preocupa é que qualquer recuperação econômica que esteja crescendo você vai precisar de energia e não teremos essa energia”, avalia.
Durante agenda pública na segunda-feira (31), o secretário especial da Fazenda, Bruno Funchal, admitiu que a crise hídrica é um risco e pode pressionar a inflação.
“A crise hídrica é um risco, e a gente não pode ignorar isso. É um risco que pode trazer repercussão na reaceleração da economia e na inflação. Bandeiras vermelhas podem impactar na inflação”, afirmou o representante do governo federal.
PRODUÇÃO
A Agência Nacional de Águas (ANA) atendeu ao pedido do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) e declarou nesta terça-feira (1º) a situação crítica de escassez dos recursos hídricos. O secretário Jaime Verruck explica que a partir da portaria publicada pela agência é possível tomar alguma atitude.
“O alerta chama atenção, mas a portaria da ANA permite que a gente faça algumas ações. Com essa medida, a partir de hoje, a gente vai manter os reservatórios para gerar energia ou vai manter a navegabilidade? Vai ser para a energia, que é fundamental. Também estamos aumentando a questão da energia das termelétricas, Campo Grande acionou a William Arjona essa semana”, afirma.
O maior impacto que pode desacelerar o crescimento de Mato Grosso do Sul é o encolhimento do agronegócio.
Desde o início da pandemia o setor tem sido fundamental para manter os bons resultados, como o aumento das exportações e a produção recorde de grãos.
Em 2021, MS produziu 13 milhões de toneladas de soja e já registra crescimento de mais de 10% na balança comercial.
De janeiro a abril deste ano, houve superavit de US$ 1,213 bilhão, resultado de US$ 1,954 bilhão em exportações e US$ 741,322 milhões em importações. No mesmo período do ano passado, a diferença entre exportações e importações resultou em US$ 1,095 bilhão.
Para o doutor em Economia Michel Constantino, “se faltarem os recursos hídricos, a produção no campo é paralisada e o impacto na economia é enorme”, diz.
O titular da Semagro também pondera que a escassez deve afetar a produção de grãos e, consequentemente, o Produto Interno Bruto(PIB) do setor.
“Hoje, o impacto direto que nós temos em relação à falta de chuvas é no PIB do agronegócio”.
Daniela ainda destaca a redução nas expectativas de consumo, o que também gera números negativos de movimentação financeira.
“Temos uma crise hídrica no meio de uma pandemia e o relato da possibilidade de termos o fungo negro. Isso tudo mexe com as expectativas das pessoas e elas ficam mais receosas em gastar. Pode ser que os produtos essenciais de alimentação e bebidas fiquem mais caros e isso vai pesar no bolso. Além do aumento da demanda a nível mundial, há a questão da oferta, e uma menor produção fica mais difícil principalmente para quem ganha um salário mínimo”, diz a economista.
Daniela ainda destaca que o investimento em energias renováveis seria uma solução para “desafogar” o setor elétrico. Para ela, o investimento em energia solar pode ser uma alternativa.
“Precisamos buscar alternativas, bem como resgatar a credibilidade da população para garantir uma inflação mais controlada”.