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O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, admitiu nesta sexta-feira (18) que “tem conversado” com a presidente Dilma Rousseff sobre a sua possível saída do governo e disse que não quer “criar nenhum constrangimento”.
“A gente [Levy e a presidente Dilma] tem conversado, eu acho que eu tenho que falar o que eu já falei", afirmou o ministro, ao ser questionado, durante café da manhã com jornalistas em Brasília nesta sexta-feira (18), se já havia acertado sua saída com a presidente. "A gente sempre teve um relacionamento muito respeitoso."
"O ano Legislativo já se encerrou e a gente pode, isso abre umas tantas alternativas. Evidentemente meu objetivo não é criar nenhum constrangimento ao governo, agora é lógico que é importante, tem que ter clareza de quais são as prioridades até em função de todas as demandas sobre o governo, sobre a presidente. E eu acho que o caminho vai ser em função disso”, disse ele.
Rumores
A saída do ministro já vem sendo especulada há meses, mas os rumores ganharam força esta semana, depois que o governo decidiu reduzir a meta de superávit primário (economia para pagar os juros da dívida) de 2016 para 0,5% do PIB. A decisão contrariou diretamente Levy, que vinha insistindo na necessidade de manter a meta de 0,7% do PIB, como último estandarte para garantir a retomada da confiança no Brasil e a estabilidade para a volta do crescimento econômico.
Questionado se se sentia traído por não conseguir colocar em prática, ao longo de 2015, alguns dos projetos voltados para o ajuste fiscal, Levy negou, mas afirmou estar “decepcionado” – algumas propostas do ministro enfrentaram resistência do governo e do PT.
“O colega [jornalista] me perguntou se eu me sentia traído. Eu não vou dizer que me sinto traído, mas eu me sinto um pouquinho decepcionado pelas principais medidas de aumento da justiça tributária, da progressividade do Imposto de Renda, não tenham tido pleno curso”, disse.
Derrotas
Durante o café da manhã desta sexta, Levy admitiu que algumas propostas para a economia não foram bem-sucedidas.
"A gente apresentou um número significativa de propostas. Em nem todas a gente teve sucesso. Eu acho que a maior parte daquilo que pus como sendo uma primeira rodada de coisas importantes ao longo do ano, com o auxílio dos secretários, não se conseguiu concluir, mas encaminhou de uma forma bem completa. Isso não necessariamente implica numa ação específica e imediata. O sentido de algumas observações é o que foi feito já está tendo resultados. Os desafios continuam", disse.
"Algumas coisas não têm encaminhamento esperado. Às vezes, há um foco excessivo na questão fiscal. Esse boom que a gente está vivendo é resultado da política anticíclica dos nossos parceiros".
Questionado se Dilma está comprometida com as reformas estruturais da economia propostas no ajuste fiscal, Levy disse que a presidente tem estado preocupada com o processo de impeachment e que isso tira “liberdade” para o governo dar seguimento às reformas.
“A presidente tem estado envolvida em outro processo, que não tem natureza puramente econômica, e isso evidentemente subtrai alguns graus de liberdade para tocar uma agenda de reformas mais intensa nesse momento”, disse o ministro.
“Mas não tenho dúvida nenhuma que ela tem uma sensibilidade, inclusive em setores em que as condições mudaram de uma maneira muito forte, como o setor de óleo e gás”, complementou ele.
Levy afirmou, porém, que se sentiu “sempre confortável” para executar as políticas do ministério. Sobre sua relação com a presidente Dilma, disse que sempre foi “um relacionamento muito respeitoso.”
Rebaixamento
Levy voltou a falar sobre a decisão da agência de classificação de risco Fitch de rebaixar a nota de crédito do Brasil, que agora é considerado grau especulativo. Usando uma metáfora do futebol, o ministro disse que, com trabalho, o país pode voltar à “primeira divisão” dos mercados.
“Você voltar à primeira divisão dá um pouquinho de trabalho, mas sempre é possível”, disse o ministro, torcedor do Botafogo, time carioca que foi rebaixado à série B no ano passado, mas que em 2015 garantiu a volta à série A do futebol brasileiro.
Levy apontou que o impacto do rebaixamento da nota de crédito do Brasil é principalmente para as empresas, já que leva ao aumento do custo do crédito. Por isso, disse ele, o governo deve tomar medidas para reverter essas consequências.
“É importante tomar todas as medidas no âmbito público e fiscal e para evitar, e agora reverter, as consequências do rebaixamento e não apenas se conformar com a situação”, disse.
“Precisamos continuar com as reformas. O país não pode ficar parado. Ficar parado nesse momento é andar para trás”, continuou ele, citando exemplo de países vizinhos ao Brasil, como Chile, Colômbia e Uruguai, que vêm adotando medidas para ajudar suas economias a crescer.
Meta de superávit
Sobre a redução da meta de superávit (economia para pagar juros da dívida), de 0,7% para 0,5% do PIB em 2016, aprovada pelo Congresso após intervenção do governo, o ministro disse que é preciso agora garantir recursos para que seja cumprida.
“Vai ser um desafio no começo do ano considerar receitas necessárias para dar total lastro ao Orçamento”, disse Levy.
“É uma sinalização importante o Orçamento que foi votado, a meta que foi decidida com total independência pelo Congresso, mas é evidente que tem que haver uma coerência entre a meta escolhida e as receitas que são disponibilizadas para o poder executivo executar o Orçamento decidido”, completou.
Além de corte de gastos, para cumprir a meta no ano que vem o governo propôs medidas para aumentar a arrecadação, entre elas a volta da CPMF, que ficou conhecida como imposto do cheque. A proposta de Orçamento prevê, porém, que ela seja aprovada pelo Congresso e comece a gerar arrecadação a partir de setembro.
Tom de despedida
É a primeira vez que Levy fala diretamente sobre a possibilidade de deixar o cargo. Na quarta-feira, em entrevista à TV Globo, o ministro afirmou que estava "bem" no comando da pasta.
"Estou bem aqui à frente do ministério", disse Levy, ao ser questionado se ele pode deixar o governo. "Eu tenho dito que o folhetim, a novela, não é muito importante. O importante é o que a gente está conseguindo fazer para ter um Brasil melhor".
Na quinta-feira, no entanto, ele adotou um tom de despedida em conversas reservadas que teve com parlamentares, de acordo com o colunista do G1, Gerson Camarotti. A interlocutores, Levy explicou que há uma pressão cada vez maior da própria base aliada para uma flexibilização da política econômica.
A presidente Dilma Rousseff já estaria em busca de substitutos para o comando da Fazenda. A opção pode ser por uma "solução doméstica", segundo a colunista do G1 Cristiana Lôbo, com o deslocamento do ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, para a Fazenda; e no Planejamento, um nome político, como o do senador Romero Jucá (PMDB-RR).
Também estariam na lista de Dilma o do ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro, e até Alexandre Tombini, do Banco Central.