O Globo/LD
O Ministério da Educação ( MEC ) anunciou nesta quarta-feira que em 2020 vai aplicar o Exame Nacional do Ensino Médio ( Enem ) digitalmente para 50 mil candidatos, em 15 capitais do país. Os planos do MEC são de que em 2026 já não haja mais a prova impressa. Os estudantes que prestam a prova nesse ano, no entanto, não serão afetados com nenhuma mudança. Durante o anúncio, o ministro Abraham Weintraub afirmou que, 'salvo algo fora do script' o presidente Jair Bolsonario 'não leu e não lerá a prova do Enem 2019.
— A ideia é fazer vários Enems ao longo do ano por agendamento — anunciou o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Alexandre Lopes, em coletiva de imprensa.
No ano que vem, 50 mil candidatos já poderão optar se farão o modelo piloto digital ou se farão a prova tradicional impressa. No caso dos candidatos que forem fazer a prova nos moldes tradicionais, a prova continuará sendo aplicada em dois domingos consecutivos, segundo o Inep, em 11 e 18 de outubro.
O número de aplicações aumentará progressivamente. Em 2021, serão feitas duas aplicações digitais da prova. Depois, a partir de 2022 a ideia do MEC é viabilizar a aplicação da prova em quatro ocasiões em datas diferentes agendadas ao longo do ano.
De acordo com o Inep, a versão digital da prova viabilizará questões que utilizem games, vídeos e infográficos.
O governo cita como argumento central para a mudança na prova a economia de dinheiro, já que, segundo dados oficiais, a aplicação da prova impressa supera R$ 500 milhões de reais. Outra justificativa é que a mudança traria ganhos para o meio ambiente.
Matriz do Enem ainda é dúvida
Ex-presidente do Inep e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE), Chico Soares afirma que a iniciativa é positiva, mas que há questões mais urgentes a serem tratadas sobre o Enem.
— Com a Reforma do Ensino Médio, precisamos saber o que o Enem vai cobrar. O que está sinalizado seria um primeiro dia de conteúdos gerais e um segundo dia de conteúdos específicos relacionados à área da carreira escolhida, mas isso não está definido e é uma decisão absolutamente necessária e essencial — argumenta Soares. — Antes de pirotecnias do que utilizar para aplicar a prova, precisamos saber o que vai estar no Enem. O que as escolas precisam é da matriz de referência da prova e menos do formato. Isso é urgente.
A Reforma do Ensino Médio foi sancionada em 2017 e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da etapa foi aprovada em 2018 e havia uma previsão de que as mudanças nos currículos e avaliações sejam implementadas até 2020.
De acordo o educador, é importante garantir que a prova digital não seja apenas uma reprodução do exame impresso. Para ele, a mudança só faz sentido se servir para explorar ferramentas que tornem a avaliação mais dinâmica.
— Hoje há a possibilidade de se fazer questões que vão muito além da múltipla escolha. O melhor exemplo disso é o Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes).Se o que está sendo pensado é fazer o mesmo Enem de múltipla escolha mas no ambiente digital isso é automatizar o jurássico — afirmou Soares, dizendo ainda que a mudança deve ser debatida com as escolas. — O Inep precisa criar canais de comunicação com as escolas e ouvir quem tem algo a falar e quem vai ser afetado pela mudança. É preciso pensar no impacto que teria para alunos que estão em escolas com sistemas de informática ainda muito defasados.
Infraestrutura deficiente
A avaliação de quem está presente no dia a dia de quem se prepara para o Enem é semelhante. Para o coordenador de vestibular do colégio Q.I, Renato Pellizzari, a aplicação digital do Enem pode favorecer uma avaliação mais completa das habilidades dos alunos, mas por outro lado, poderá encontrar obstáculos devido à pouca infraestrutura das escolas do país.
— O Enem ser 100% digital já era algo previsto há algum tempo, porque o modelo de avaliação baseado na Teoria de Resposta ao Item (TRI) acaba sendo mais bem aplicado se tivermos uma prova nesses moldes, já que permite descobrir as habilidades dos candidatos de forma mais adequada que uma prova feita no papel, pois pode utilizar ferramentas como vídeos, jogos e conduzir a aplicação da prova de acordo com as aptidões do aluno — afirma Pellizzari.
No entanto, o professor considera irreal a proposta do governo de fazer a prova totalmente nesse modelo até 2026:
— Não sei se vamos conseguir em pouco tempo a inclusão digital de toda população brasileira que tem interesse de ingressar em uma universidade. É arriscado fazer uma previsão como essa para 2026. Se paralelamente fosse uma pauta do governo desenvolver um processo de inclusão digital no brasil, levando internet e capacitação para todas as escolas públicas, com infraestrutura de computadores, talvez essa meta pudesse ser alcançada. Mas isso não está dentro das propostas do governo.
Veja as capitais que terão aplicação da prova digital já em 2020:
Belém (PA)
Belo Horizonte (MG)
Brasília (DF)
Campo Grande (MS)
Cuiabá (MT)
Curitiba (PR)
Florianópolis (SC)
Goiânia (GO)
João Pessoa (PB)
Manaus (AM)
Porto Alegre (RS)
Recife (PE)
Rio de Janeiro (RJ)
Salvador (BA)
São Paulo (SP)