VERSÃO DE IMPRESSÃO
Geral
13/02/2013 06:21:49
Advogados criticam lei que incentiva delação de crimes
Treze anos depois que a legislação brasileira passou a prever a delação premiada, alguns dos principais criminalistas do país se recusam a aceitar clientes que denunciam esquemas criminosos.

Folha/PCS

\n \n Treze anos depois que a legislação brasileira passou a prever a delação\n premiada, alguns dos principais criminalistas do país se recusam a aceitar\n clientes que denunciam esquemas criminosos. \n \n A legislação estimula criminosos a colaborar com investigações criminais em\n troca de benefícios como redução da pena em até dois terços e até o perdão\n judicial. \n \n "Eu não trabalharia para ninguém que fizesse a delação", afirma o\n advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, que tem entre seus clientes\n governadores e parlamentares. "Não sou do Ministério Público e não sou\n polícia." \n \n O caso mais notório de delação premiada no Brasil permitiu comprovar o\n envolvimento do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda e de\n dezenas de políticos no esquema de corrupção conhecido como mensalão do DEM, no\n fim de 2009. \n \n O ex-secretário do governo Durval Barbosa filmou durante meses encontros em\n que distribuiu propina aos políticos beneficiados pelo esquema, e depois\n entregou o material às autoridades. \n \n Barbosa obteve nove perdões judiciais, oito na área criminal e um na cível,\n por ter colaborado com a investigação. "O caso é sem precedentes no Brasil\n e desafiador", diz a advogada Margareth Almeida, que defende Barbosa. \n \n O desembargador George Lopes Leite, do Tribunal de Justiça do Distrito\n Federal, escreveu que concedeu os perdões para incentivar "a delação\n premiada de organizações que não possam ser alcançadas pelos sistemas\n tradicionais de investigação". \n \n Traição \n \n Para o ex-ministro da Justiça Marcio Thomaz Bastos, o Estado não deveria\n incentivar alguém a trair seus pares, mesmo que para denunciar um esquema\n criminoso. \n \n "Não gosto da instituição da delação premiada. Mexe com os piores\n instintos do ser humano", afirma Thomaz Bastos, que no ano passado\n defendeu o ex-executivo do Banco Rural José Roberto Salgado, um dos condenados\n no julgamento do mensalão. \n \n O doleiro Lucio Bolonha Funaro, dono de uma empresa que repassou recursos do\n mensalão, foi excluído do processo após concordar em colaborar com a\n Procuradoria-Geral da República. \n \n Outros advogados que atuaram no caso criticam o instituto da delação\n premiada por considerá-lo ineficaz. "Quem troca a liberdade vai dizer o\n que quer que digam", afirma Arnaldo Malheiros, que defende o ex-tesoureiro\n do PT Delúbio Soares. \n \n O advogado José Luís de Oliveira Lima, que defende o ex-ministro José Dirceu\n no mensalão, também considera a eficácia da lei duvidosa. "Procuro não\n atuar [com o instrumento]", diz. "Não é algo com que me sinta\n confortável." \n \n Para o desembargador Fausto De Sanctis, do Tribunal Regional Federal de São\n Paulo, que já homologou diversos acordos de delação premiada, a resistência dos\n advogados tem outra razão. "A opção pela não delação passa a ser vantajosa\n porque sabe-se que, de alguma forma, o processo criminal não vai ser\n eficaz", afirma. \n \n Há dezenas de projetos no Congresso para reformar a legislação sobre o tema.\n O mais avançado está em discussão no Senado e cria mecanismos que podem\n incentivar os acordos com os delatores. \n \n Se o projeto for transformado em lei, na maioria dos casos caberá aos juízes\n apenas homologar os acordos feitos pelo Ministério Público, sem que possam\n rejeitá-los como hoje, e réus poderiam se tornar colaboradores mesmo após a\n sentença judicial.\n \n \n