Correio do Estado/LD
Apenas 2,3% dos cursos a distância no país tiveram nota máxima no indicador de qualidade do governo federal. Esse índice é de 6,2% entre as graduações na modalidade presencial. O conceito é calculado a partir da média da nota dos estudantes na prova do Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes).
Os resultados da última edição, aplicada em novembro de 2021, foram divulgados pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) nesta segunda-feira (12).
As notas divulgadas mostram que o percentual de cursos a distância avaliados com a nota máxima é inferior ao de cursos presenciais. Apesar disso, é na modalidade EAD que mais tem crescido o número de matrículas no ensino superior.
As graduações a distância atualmente já recebem mais ingressantes que o ensino presencial.
Em 2019, havia 1,5 milhão de ingressantes nessa modalidade, número que saltou para pouco mais de 2 milhões em 2020, alta de 26%. Ao mesmo tempo, a quantidade de pessoas que ingressam na educação presencial recuou quase 14% no mesmo período.
Além de só 2,3% dos cursos a distância conseguirem nota máxima, quase metade deles (47,8%) ficou com conceito 1 e 2, abaixo do mínimo exigido pelo Ministério da Educação, que é a nota 3.
As faculdades particulares, que concentram mais de 70% das matrículas no ensino superior, também têm um percentual de cursos com nota máxima bem menor do que as da rede pública. Entre as faculdades privadas com fins lucrativos só 1,5% obteve nota 5. Entre as universidades federais, 11,4% obtiveram essa nota.
Em anos anteriores, as duas modalidades apresentavam resultados similares no conceito Enade. A expansão dos cursos a distância foi intensificada a partir de 2017, quando o então presidente Michel Temer (MDB) assinou decreto flexibilizando normas que facilitaram a abertura de polos.
A pandemia de Covid-19 também acelerou esse processo, já que muitos alunos migraram de cursos presenciais para a distância. Muitos estudantes também optaram por entrar na modalidade a distância quando as aulas presenciais estavam suspensas.
Para integrantes do MEC e Inep, o pior resultado entre os cursos a distância não pode ser "necessariamente atribuído à má qualidade", mas também às condições de estudo dos alunos. Eles destacam que estudantes de graduações nessa modalidade, em geral, são mais velhos e trabalham.
"As duas modalidades apresentam desempenho diferente, mas elas também têm um perfil de alunos diferente. Os alunos que estudam a distância costumam trabalhar, estão a mais tempo longe da escola. Então, as condições de estudo são mais difíceis", disse Ulysses Teixeira, coordenador-geral de controle de qualidade da educação superior do Inep.
Os dados da prova mostram, por exemplo, que 49% dos concluintes em cursos presenciais têm até 24 anos e 37% deles não trabalham. Já na modalidade a distância, apenas 16% têm menos de 24 anos e 23% não trabalham.
Para Rodrigo Capelato, diretor do Semesp (Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior, a diferença de desempenho, tanto entre as duas modalidades, como entre as públicas e privadas, pode ser explicada também pela forma de seleção dos alunos.
"As universidades públicas têm um processo seletivo rigoroso, selecionam os alunos com melhor desempenho. Os cursos a distância e as faculdades particulares recebem a grande maioria dos alunos, muitos deles com desempenho menor.
Por isso, não podemos afirmar que os cursos têm uma qualidade ruim só olhando pra esse resultado do Enade", disse Capelato.
O resultado do Enade é utilizado para compor o CPC (Conceito Preliminar de Curso), que é a nota de cada graduação. Além do desempenho dos alunos no exame, o CPC leva em consideração fatores como a organização pedagógica, a infraestrutura e titulação de professores. Uma nota ruim no CPC (abaixo de 3) pode resultar em punição para as instituições.
O Inep disse que o CPC só será divulgado em dezembro, já que os outros componentes da avaliação ainda estão sendo coletados.
O Enade faz parte do sistema nacional de avaliação do ensino superior, no entanto, o formato e o objetivos da prova são há anos criticados por especialistas. Em 2018, um relatório da OCDE, encomendado pelo próprio MEC, concluiu que o exame falha na tarefa de testar a qualidade dos cursos e que o gasto de recurso público não justifica sua aplicação.
O governo Temer pensava em fazer alterações na prova, mas o governo Bolsonaro parou todos os estudos sobre essas mudanças.
"É uma prova que não diz nada para o aluno nem para a instituição. O aluno acessa o resultado individual dele e não sabe se aquela nota significa que ele aprendeu o adequado ou não. A prova não serve para dizer se um curso tem qualidade ou não, apenas para dizer que um é pior que o outro", disse Simon Schwartzman, que já foi membro do Conselho Nacional de Avaliação da Educação Superior.