O Globo/LD
A Anistia Internacional divulgou uma nota de repúdio às declarações do comandante do Exército, general Eduardo Dias da Costa Villas Boas, que expressou no Twitter "repúdio à impunidade" e destacou que o efetivo militar estava "atento às suas missões institucionais". A atitude do general, na véspera do julgamento do habeas corpus do ex-presidente Lula (PT-SP) no Supremo Tribunal Federal (STF), marcado para ocorrer nesta quarta-feira, gerou críticas de indevida intromissão militar nos poderes republicanos.
Já o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Claudio Lamachia, afirmou nesta quarta-feira que o respeito às decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) é condição fundamental para a democracia no país, “independentemente dos vencedores e dos vencidos”. Após as declarações do comandante do Exército, Lamachia defendeu o Estado democrático de direito. No texto, Lamachia defende “mais democracia” na luta pelo combate à corrupção.
Em nota urgente publicada na manhã desta quarta-feira, a Anistia Internacional, uma das maiores organizações de defesa dos direitos humanos no mundo, destacou que vê a mensagem de Villas Boas como uma "grave afronta à independência dos poderes, ao devido processo legal e uma ameaça ao estado democrático de direito". Além disso, a manifestação de Villas Boas, na visão da Anistia, "sinaliza um desvio do papel das Forças Armadas".
"Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?", publicou o general em sua conta no Twitter, nesta terça-feira. "Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais", completou, em outro tuíte.
No comunicado divulgado em resposta ao comandante, a Anistia Internacional avalia que o avanço do militarismo no país — por meio das operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e da intervenção federal no Rio — é "ameaça crescente" e baliza a preocupação da entidade sobre o crescente uso das Forças como política de segurança pública.
A organização recordou ainda o pedido das Forças Armadas por garantias legais que impedissem julgamentos em tribunais civis no caso de ilegalidades ou abusos cometidos e citou a transferência para a justiça militar dos crimes cometidos por militares em operações de GLO. Na visão da entidade, tal cenário conduz à impunidade de ilegalidades militares e a ausência de punição a violações de direitos da Armada, como na ditadura, "é uma das feridas abertas na história recente brasileira".
"Esse foi já um passo assegurado pelos militares para garantir impunidade por crimes que possivelmente já tinham a intenção de cometer. O General Villas Boas afirmou ainda que os militares precisavam de garantias de que não haveria uma nova 'comissão da verdade' no futuro. Tal afirmação revela novamente a predisposição das Forças Armadas a alimentar o ciclo de impunidade, já que possíveis graves violações de direitos humanos ficariam sem julgamento", frisou a Anistia.
Para a organização, a impunidade dos crimes de militares e homens do estado do passado alimenta a violência dos mesmos agentes no presente.
"Este é um momento crucial na história do país. A Anistia Internacional se posiciona fortemente contra o militarismo, contra o desvio de função das Forças Armadas e abuso do uso da força, contra a impunidade das graves violações cometidas pelos agentes do estado. A sociedade brasileira precisa se posicionar a favor do estado democrático de direito, do devido processo legal e da garantia dos direitos humanos", lê-se na nota.