Sheila Forato
A operação Grilagem de Papel, deflagrada pelo Gaego (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) na manhã desta quarta-feira (13), com o objetivo de desarticular um esquema criminoso na Prefeitura de Coxim, responsável por transferências ilegais de imóveis, revela detalhes da organização e seus integrantes.
A investigação do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) apura denúncias de uma suposta organização criminosa constituída por servidores municipais de Coxim, dentre outros, com o propósito de obterem vantagens indevidas com as transferências ilegais de imóveis urbanos de seus legítimos proprietários para terceiros através do Reurb (Regularização Fundiária Urbana).
O promotor de Justiça de Coxim, Michel Maesano Mancuelho, responsável pela investigação, acredita, conforme consta no processo, que o expressivo número de transferências de imóveis realizadas de forma fraudulenta não teria sido alcançado sem que houvesse uma estrutura ordenada, com divisão de tarefas entre os agentes públicos de diversos órgãos municipais e do cartório de registro de imóveis, o que evidencia a prática do crime de organização criminosa.
Ainda de acordo com o MPMS, as condutas também tipificam crimes contra a ordem tributária, uma vez que, diante da simulação de operação de regularização fundiária, impediam o recolhimento de tributos devidos (IPTU e ITBI), omitindo informação ou prestando declaração falsa e falsificando ou alterando documento relativo à operação tributável.
Como funcionava o esquema, segundo o MPMS:
O então gerente de Receitas e Tributos, Rodrigo Ferreira Lima, que ocupou o cargo de janeiro de 2021 a setembro de 2024, assessorado pelo policial civil Marcio Rodrigues da Silva, cedido para a Prefeitura e lotado na Procuradoria, identificava terrenos de propriedade de pessoas falecidas ou mesmo imóveis vazios, tendo por base aqueles que estavam sem recolher IPTU, informações privilegiadas, disponíveis a ambos.
A escolha recaia normalmente sobre esses imóveis - vazios ou com proprietários falecidos - já que seria menos provável que as vítimas pudessem se opor tempestivamente. De acordo com a investigação, quando havia questionamento por parte de herdeiros, o chefe da gerência de Habitação, Thiago Cruz Cassiano da Silva, em conjunto com a Procuradoria, cuidavam de conduzir as vítimas como se fossem resolver o problema, até que, com o passar do tempo, deixavam de atendê-las ou de retornar seus contatos.
Depois, as vítimas eram simplesmente encaminhadas ao Cartório de Registro de Imóveis, porém, não tinham as situações resolvidas. Consta no processo que lá eram atendidas por Nayara Paniago Teodoro da Silva, esposa de Márcio que, apesar de ser lotado na Procuradoria Jurídica, trabalhava com Rodrigo na Tributação. Ela informava as vítimas que a transferências eram legítimas, desestimulando que as mesmas buscassem seus direitos.
O MPMS também trata como investigado o diretor de Planejamento Urbano, Américo Pereira de Moraes, por ser chefe de Thiago, responsável pela Habitação. Outra funcionária do setor, Liliam Fernandes da Silva, também está sendo investigada. Thiago e Liliam seriam os responsáveis pelas emissões das Certidões de Regularização Fundiária.
Esses documentos eram enviados ao Cartório de Registro de Imóveis, onde as transferências eram feitas por Nayara. Por fim, eles averbavam na nova matrícula, ainda, a Guia de Informação do ITBI, expedido pela gerência de Receitas e Tributos, por parte dos investigados Rodrigo e Márcio, com sonegação.
Segundo o MPMS, a atuação do grupo veio à tona quando Rodrigo transferiu um grande volume de imóveis para Viterbio Gabriel Mariano e Maria José Pereira Mariano, seus sogros. Por meio desse esquema fraudulento, transferiram aos parentes 10 imóveis, que totalizam 7.320 m² em área nobre de Coxim. Apesar do alto valor desses imóveis no mercado imobiliário, constou nas matrículas que tais imóveis teriam sido avaliados em valores entre R$ 8 e R$ 20 mil.
Operação Grilagem de Papel
O Gaeco cumpriu 15 mandados de buscas e apreensões, sendo 14 em Coxim e um em Várzea Grande (MT). Eles apreenderam celulares, computadores e documentos nas casas de todos investigados, assim como em órgãos públicos e no Cartório de Coxim. Agora, o MPMS vai analisar o material apreendido para dar continuidade a investigação.
Rodrigo e Thiago estão sendo monitorados por tornozeleiras eletrônicas e não podem se ausentar de Coxim sem autorização judicial.
Até o fechamento desta reportagem a Prefeitura de Coxim não tinha se manifestado sobre a operação. A administração de Edilson Magro (PP) é a primeira na história centenária de Coxim a ser alvo de uma operação do Gaeco. O grupo já esteve em Coxim, em outras oportunidades, em investigações de tráfico de drogas.
O espaço para que investigados e suas respectivas defesas se manifestem segue aberto.