FP/PCS
A conversa entre Lula (PT) e Silvio Almeida que selou a demissão do ministro dos Direitos Humanos foi marcada por uma fala ríspida e direta do presidente, que afirmou que a situação do subordinado tinha ficado insustentável.
Lula falou que, diante da gravidade da denúncia de assédio sexual, Almeida não tinha mais condições de permanecer na pasta. E acrescentou que ele não tinha o direito de usar a estrutura do ministério para fazer a sua defesa pessoal.
De acordo com relatos, Lula disse que só o ministro, Anielle Franco e Deus sabem exatamente o que aconteceu entre os dois, referindo-se às acusações de que a titular da Igualdade Racial teria sido uma das assediadas. Mas que é dever do Estado a proteção das vítimas. Lula disse ainda que Almeida tem todo o direito de se defender, mas não à frente do Ministério dos Direitos Humanos.
Aliados dizem que irritou Lula o fato de Almeida ter publicado notas da pasta para negar as acusações e criticar a organização Me Too Brasil, que afirmou ter recebido denúncias de assédio contra ele.
Silvio Almeida foi chamado ao Palácio do Planalto e chegou por volta das 18h. Saiu demitido do gabinete presidencial menos de uma hora depois.
Interlocutores da cúpula do governo afirmam que a maior parte do encontro ocorreu com Silvio Almeida apresentando a sua defesa para o presidente. O ministro demitido chorou diante de Lula, lembrou que tem uma filha de um ano de idade e que recentemente foi homenageado por seus alunos. Ele também se disse vítima de armação.
A demissão de Silvio Almeida foi anunciada por meio de uma nota da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República). Em um tom duro, o texto cita "graves denúncias" e que Lula considerou "insustentável" a permanência do ministro.
"Diante das graves denúncias contra o ministro Silvio Almeida e depois de convocá-lo para uma conversa no Palácio do Planalto, no início da noite desta sexta-feira (6), o presidente Lula decidiu pela demissão do titular da Pasta de Direitos Humanos e Cidadania", diz o comunicado.
"O presidente considera insustentável a manutenção do ministro no cargo considerando a natureza das acusações de assédio sexual."
O caso veio à tona na tarde de quinta (5), após a organização Me Too Brasil afirmar ter recebido acusações de assédio contra o então ministro. O portal Metrópoles, que divulgou o caso primeiramente, informou que uma das vítimas seria Anielle. As informações foram confirmadas pela Folha de S.Paulo.
A Me Too Brasil não indicou os nomes das denunciantes.
"A organização de defesa das mulheres vítimas de violência sexual, Me Too Brasil, confirma, com o consentimento das vítimas, que recebeu denúncias de assédio sexual contra o ministro Silvio Almeida, dos Direitos Humanos. Elas foram atendidas por meio dos canais de atendimento da organização e receberam acolhimento psicológico e jurídico", diz a nota da entidade.
O comunicado ainda afirma que as vítimas enfrentaram dificuldades em obter apoio institucional para validar as suas denúncias e por isso autorizaram a confirmação do caso para a imprensa.
"Como ocorre frequentemente em casos de violência sexual envolvendo agressores em posições de poder, essas vítimas enfrentaram dificuldades em obter apoio institucional para a validação de suas denúncias. Diante disso, autorizaram a confirmação do caso para a imprensa", afirma o texto.
Também nesta sexta, Lula indicou durante entrevista a uma rádio de Goiânia (GO) que demitiria Silvio Almeida.
"O que eu posso antecipar para você é o seguinte: alguém que pratica assédio não vai ficar no governo. Eu só tenho que ter o bom senso de que é preciso que a gente permita o direito à defesa, à presunção de inocência. Ele tem o direito de se defender", afirmou o presidente.
"Então é o seguinte: vamos ter que apurar corretamente, mas eu acho que não é possível a continuidade no governo, porque o governo não vai fazer jus ao seu discurso, à defesa das mulheres, inclusive dos direitos humanos, com alguém que esteja sendo acusado de assédio", acrescentou.
Na noite anterior, Silvio Almeida divulgou uma nota e um vídeo rebatendo as acusações. O então ministro também usou as redes sociais do Ministério dos Direitos Humanos para atacar a organização Me Too Brasil, alegando que a acusação contra ele tinha relação com a recusa do ministério de permitir a atuação da organização em um processo de licitação.
"Repudio com absoluta veemência as mentiras que estão sendo assacadas contra mim. Repudio tais acusações com a força do amor e do respeito que tenho pela minha esposa e pela minha amada filha de 1 ano de idade, em meio à luta que travo, diariamente, em favor dos direitos humanos e da cidadania neste país", se defendeu o ministro.
"Toda e qualquer denúncia deve ter materialidade. Entretanto, o que percebo são ilações absurdas com o único intuito de me prejudicar, apagar nossas lutas e histórias, e bloquear o nosso futuro."