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ImprimirO ex-executivo da empresa Torneos y Competencias, o argentino Alejandro Burzaco, disse em depoimento no Tribunal Federal do Brooklyn, em Nova York, que pagou propina para diversos altos executivos de Confederação Sul-americana de Futebol (Conmebol) - entre eles dois ex-presidentes da CBF (José Maria Marin e Ricardo Teixeira) e o atual presidente da entidade, Marco Polo Del Nero.
Disse também que fez parcerias com outras empresas de mídia, acrescentando que quase todas pagaram propina para cartolas - citando a TV Globo, a Media Pro (Espanha), a Fox Sports (EUA) e a Televisa (Mexico) e duas empresas de intermediação - a Traffic (brasileira) e a Full Play (argentina). O depoimento foi dado no processo em que Marin - que está em prisão domiciliar nos EUA desde 2015 - está sendo julgado ao lado de Juan Manuel Napout (ex-presidente da Conmebol e da federação paraguaia) e Manuel Burga (ex-presidente da federação peruana).
De terno cinza, camisa branca e gravata azul marinho, Burzaco falou por mais de três horas e confessou que cometeu os crimes de lavagem de dinheiro, fraude e conspiração. E disse que pagava propina para dirigentes em troca de apoio na negociação de contratos.
Perguntado pelo promotor Samuel Nitze se havia alguém no tribunal a quem pagou, ele foi direto:
Juan Napout, Manuel Burga, José Maria Marin. Paguei propina para todos eles.
Quando?
Para Marin, de 2012 até 2015. Para Burga, de 2010 a 2013. Para Napout, de 2010 e 2015.
Napout presidiu a Federação Paraguaia de Futebol de 2007 a 2014 e a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) entre 2014 e 2015. Já Burga foi presidente da Federação Peruana de Futebol entre 2007 e 2010. A seguir, o promotor perguntou se a Torneos tinha feito parceria com outras empresas de mídia. Burzaco respondeu:
Sim.
Com quem?
Várias. Fox Sports dos Estados Unidos, Televisa do México, Media Pro da Espanha, TV Globo do Brasil, Full Play da Argentina, Traffic do Brasil, Grupo Clarín da Argentina. Várias.
Alguma delas pagou propina?
Todas. Com exceção do Clarín. Todas.
Burzaco não deu detalhes sobre a acusação que fez à Globo. O promotor perguntou se as empresas parceiras eram informadas sobre o pagamento de propina citando o contrato da Copa Libertadores. Na resposta, o executivo citou apenas a Fox Sports panamericana:
A Torneos mantinha informado algum de seus parceiros sobre o pagamento de propina relacionada ao contrato da Copa Libertadores?
Sim. A Fox Panamericans.
Segundo Burzaco, a Fox Panamerican Sports comprou 50% da Torneos amp;amp; Traffic. Em 2005, a empresa subiu sua participação na Torneos para 75%. E ficou assim até 27 de maio de 2015, quando o FBI prendeu dirigentes da FIFA em Zurique. Mais tarde no julgamento, Burzaco disse que pagou propina também para Ricardo Teixeira.
- De 2006 a 2012, pagamos US$ 600 mil por ano, em contas bancárias indicadas por ele ou seu secretário pessoal, Alexandre [Silveira].
Burzaco declarou ainda que era o argentino Julio Grondona, ex-presidente da AFA, quem gerenciava a distribuição dos subornos entre os dirigentes da Conmebol.
– Depois que Grondona morreu, em julho de 2014, as pessoas que conheciam todo o esquema de pagamento de propinas eram Juan Angel Napout e Marco Polo Del Nero.
O promotor perguntou então:
– Entre os anos de 2006 e 2015, a quem você pagou propina na Conmebol?
– Para todos. Presidente, integrantes do comitê executivo, vice-presidentes, secretário-geral, presidentes de federações nacionais. Todos.
Nesse período, os presidentes da CBF foram Ricardo Teixeira (2006-2012), José Maria Marin (2012-2015) e Marco Polo Del Nero (2015 até hoje). Os brasileiros no Comitê Executivo da Conmebol foram Ricardo Teixeira e Marco Polo Del Nero.
A Torneos y Competencias (TyC) é uma empresa argentina fundada em 1982 que sempre teve posição de destaque no mercado sul-americano de direitos. Burzaco era o principal executivo da empresa quando o FBI prendeu vários dirigentes da FIFA em Zurique em 27 de maio de 2015. Depois, a TyC criou, junto com a Traffic, a empresa Tamp;amp;T, responsável por negociar os direitos da Libertadores e Sul-Americana.
Burzaco, que estava em Zurique, escapou por pouco da prisão - acabou demitido da TyC poucos dias depois. No dia 10 de junho de 2015 ele se entregou às autoridades americanas.
- Quando eu soube que estava indiciado pelo governo dos Estados Unidos, passei 48 horas pensando no que fazer. Pensei: Você tem que ir para os EUA, se entregar, enfrentar as consequências e tentar limpar o que for possível.
Na véspera do depoimento de Burzaco, os três advogados de defesa (de Marin, Napout e Burga) fizeram críticas ao fato de o governo dos Estados Unidos terem feito acordos "benéficos" a pessas que confessaram ter cometido crimes.
A segunda parte do depoimento de Alejando Burzaco, ex-executivo da Torneos y Competencias, trouxe novas informações sobre as acusações a dirigentes brasileiros - e a citação a um ex-executivo da TV Globo - Marcelo Campos Pinto, que até 2015 era o responsável pela negociação de direitos da emissora. Burzaco detalhou como se deu a transição do pagamento de propina depois que Ricardo Teixeira renunciou à presidência da CBF em 2012.
Burzarco disse que Teixeira o orientou a repassar o que recebia para José Maria Marin e Marco Polo Del Nero. Campos Pinto, ainda segundo o depoimento, teria presenciado a reunião em que o "acerto do repasse" aconteceu. Algum tempo depois, , Marin e Del Nero teriam pedido "aumento" na cota de propina.
O promotor Samuel Nitze perguntou a Burzaco como ficou a distribuição de propinas para dirigentes brasileiros depois que Ricardo Teixeira renunciou, em março de 2012.
– José Maria Marin virou presidente da CBF e Marco Polo Del Nero assumiu o lugar de Teixeira no Comitê Executivo da Fifa. Na Conmebol eu não lembro quem estava, porque eles eram como gêmeos siameses,estavam sempre juntos, recebiam o mesmo tratamento.
Burzaco contou que, desde 2006, pagava US$ 600 mil anuais a Ricardo Teixeira de propina relativa ao contrato de transmissão da Copa Libertadores e da Sul Americana. E que houve uma reunião para detalhar como esse dinheiro seria repassado a Marin e Del Nero.
– Em abril de 2012, houve uma reunião em Buenos Aires com Del Nero, Marin, Julio Grondona (então presidente da AFA) e Alexandre da Silveira, secretário da CBF e eu. Ricardo Teixeira não estava, mas falou por telefone com Grondona para explicar que havia renunciado, que Marin e Del Nero o substituiriam e que deveriam ter o mesmo poder que ele tinha na Conmebol. Disse que os US$ 600 mil deveriam ser pagos a eles.
Sempre segundo o delator, houve um novo encontro em Buenos Aires, "dois ou três meses depois", desta vez no restaurante "Tomo 1". Estavam presentes nesse encontro Marin, Del Nero, Alexandre, Grondona,
Burzaco e Marcelo Campos Pinto, então executivo da Globo, que segundo Burzaco "deu a bênção ao acordo".
Nessa segunda reunião, Burzaco informou a Marin e Del Nero que havia mais US$ 2 milhões de propina – neste caso relacionada ao contrato de transmissão da Copa América – dinheiro que não havia sido coletado por Teixeira. Ficou decidido ali que esses US$ 2 milhões seriam divididos entre Del Nero e Marin.
– Marin me deu um abraço e fez um discurso de agradecimento. Del Nero abriu um caderno e anotou os valores. Os dois disseram que dariam instruções sobre como queriam receber o dinheiro – detalhou Burzaco.
O promotor Samuel Nitze perguntou como as propinas eram pagas para Marin e Del Nero. Burzaco respondeu:
– O primeiro pagamento, em 2012, foi da mesma maneira que fazíamos para Ricardo Teixeira: em contas bancárias em lugares distantes (como Ásia e Oriente Médio), em nome de pessoas que nunca tínhamos ouvido falar. O dinheiro inicialmente saía de contas da própria Conmebol. Depois isso mudou. Criamos empresas que transferiam o dinheiro para eles.
Burzaco relatou que, em dezembro de 2012, foi novamente abordado por Grondona, Marin e Del Nero, desta vez em Assunção, no Paraguai, durante um evento da Conmebol.
– Grondona me disse que o Brasil é poderoso, que eles [Marin e Del Nero] são dois e que os US$ 600 mil já não eram suficientes, pois tinham que dividir o dinheiro. Então me pediu para aumentar o valor da propina para US$ 900 mil, ou US$ 450 mil para cada um. E eu concordei. Nós criamos empresas e começamos a transferir o dinheiro.
O presidente da CBF emitiu uma nota rebatendo as declarações de Burzaco. Del Nero também disse que jamais foi membro do comitê executivo da Conmebol - a página da Fifa, porém, diz que ele fez parte do Comitê Executivo da entidade sul-americana, assim como há registro no próprio site da CBF.
"Com referência à citação feita à sua pessoa pelo delator premiado Alejandro Burzaco na Corte de Justiça do Brooklin, New York, EUA, o presidente da CBF, MARCO POLO DEL NERO, vem a público esclarecer que nega, com indignação, que tivesse conhecimento de qualquer esquema de corrupção supostamente existente no âmbito das entidades do futebol a que se referiu. As investigações levadas a efeito naquele país não apontaram qualquer indício de recebimento de vantagens econômicas ou de qualquer outra natureza por parte do atual presidente da CBF. Igualmente, o que ali ficou apurado foi que os contratos sob suspeita não foram por ele assinados nem correspondem ao período de sua gestão na presidência da CBF. Esclarece, ainda, que jamais foi membro do Comitê Executivo da Conmebol, mostrando-se também falsa essa informação. Por fim, reafirma que nunca participou, direta ou indiretamente, de qualquer irregularidade ao longo de todas atividades de representação que exerce ou tenha exercido.”
Ex-presidente da CBF, Ricardo Teixeira afirmou que não recebeu dinheiro algum e que tinha pouco contato com Alejandro Burzaco. Disse que nunca participou de reunião de negócios com ele. Alega que saiu da CBF, da Fifa e da Conembol em março de 2012 e que, por isso, não poderia ter se reunido com Burzaco em junho de 2012. “Quem acusa tem que provar. Ele tem que provar tudo isso”, disse Teixeira ao GloboEsporte.com.
A TV Globo divulgou a nota abaixo sobre o caso:
"Sobre o depoimento ocorrido em Nova York, no julgamento do caso FIFA pela justiça dos Estados Unidos, o Grupo Globo afirma veementemente que não pratica nem tolera qualquer pagamento de propina. Esclarece que, após mais de dois anos de investigação, não é parte nos processos que correm na justiça americana. Em suas amplas investigações internas, apurou que jamais realizou pagamentos que não os previstos nos contratos. O Grupo Globo se surpreende com o relato envolvendo o ex-diretor da Globo Marcelo Campos Pinto. O Grupo Globo deseja esclarecer que Marcelo Campos Pinto, em apuração interna, assegurou que jamais negociou ou pagou propinas a quaisquer pessoas. O Grupo Globo se colocará plenamente à disposição das autoridades americanas para que tudo seja esclarecido. Para a Globo, isso é uma questão de honra. Os nossos princípios editoriais nem permitiriam que seja diferente. Mas o Grupo Globo considera fundamental garantir aos leitores, aos ouvintes e aos espectadores que o noticiário a respeito será divulgado com a transparência que o jornalismo exige"
O ex-presidente da CBF José Maria Marin não se manifestou. O GloboEsporte.com tentou contato com Marcelo Campos Pinto, mas não obteve resposta.