G1/LD
ImprimirO ex-presidente Evo Morales, exilado no México, começou a ser investigado por "sedição e terrorismo", em uma ação do governo provisório que pode acirrar ainda mais os ânimos e complicar a solução para a violenta crise na Bolívia.
Nesta sexta-feira (22), o Ministério Público (MP) abriu o processo contra Morales a partir de uma denúncia apresentada pelo ministro do Governo (Interior), Arturo Murillo.
O funcionário foi ao tribunal com um áudio como prova. Na gravação revelada na quarta-feira, Morales é supostamente ouvido dando instruções a um plantador de coca para cercar as cidades e interromper o fornecimento de alimentos, bloqueando estradas.
"Estamos pedindo a penalidade máxima por sedição e terrorismo", afirmou Murillo.
O ex-presidente de 60 anos enviou um tuíte no dia anterior, denunciando os planos do governo Jeanine Áñez de envolvê-lo em um "julgamento internacional" baseado em uma "montagem".
Já o procurador-geral, Juan Lanchipa, disse que pedirá ao Ministério das Relações Exteriores que "informe as autoridades mexicanas do início da investigação" contra Morales, que em princípio seria investigado sem jurisdição especial, na condição de ex-presidente.
Se um julgamento for adiante, ele pode receber sentença de 30 anos de prisão. O ministro Murillo também denunciou o ex-ministro Juan Ramón Quintana, um ex-homem forte do antigo governo, pelas mesmas acusações. Seu paradeiro é desconhecido.
Novas eleições
A nova reviravolta que a crise boliviana pode tomar coincide com a expectativa de uma convocação de eleições e a anulação do processo de 20 de outubro.
Com maioria no Congresso bicameral, o partido Morales, o Movimento ao Socialismo (MAS), busca um acordo com as antigas forças da oposição para renovar o Supremo Tribunal Eleitoral e autorizar novas eleições, após a renúncia do ex-presidente no dia 10 de novembro.
O governo provisório e o MAS apresentaram duas propostas para isto.
O primeiro presidente indígena da Bolívia deixou o poder que exerceu por 13 anos, após o surto social que se seguiu às alegações de fraude durante o processo eleitoral. Os militares e a polícia retiraram seu apoio, depois do qual Morales foi exilado para o México, denunciando um golpe de Estado.
No entanto, a sucessão não trouxe calma.
Pressionada pelos protestos dos seguidores de Morales, a ex-senadora Áñez colocou lenha na fogueira do descontentamento do setor indígena e camponês que apoia Morales e que, nos últimos dias, enfrentou fortes confrontos com a polícia e os militares.
Em um mês de crise, já são 32 bolivianos mortos nas ruas, pelo menos 17 deles baleados em confrontos com forças oficiais. Os protestos geraram escassez em La Paz, onde os preços dispararam e as filas se multiplicam para conseguir comida e combustível.
Na quinta-feira, uma multidão que desceu da cidade vizinha de El Alto a La Paz, com os caixões de algumas das vítimas, foi dissipada com gás lacrimogênio nas imediações da sede do governo.
Nesta sexta-feira, Áñez, em comunicado à imprensa, pediu para seus oponentes deixarem ela fazer seu trabalho pelo "curto período de tempo" em que estará no poder, diante dos protestos que sufocam La Paz, a capital administrativa.
"Este é um governo de rigoroso caráter provisório e tem como objetivo a pacificação do país e a convocação de eleições livres e transparentes no menor tempo possível", afirmou ela mais tarde em um ato perante o corpo diplomático.
Crise diplomática
Na quinta-feira, o governo interino protestou contra o México pela suposta violação dos "princípios que governam a instituição do asilo político" de Morales.
La Paz está furiosa com a administração de Andrés Manuel López Obrador por permitir ao ex-chefe de Estado fazer declarações que, em sua opinião, mostram uma "atividade de conspiração" contra Áñez.
Do exílio, Morales criticou severamente o novo governo pela repressão aos protestos e disse repetidamente à mídia que está disposto a retornar à Bolívia para concluir seu mandato em 22 de janeiro.
Ele até citou a opção de não ser candidato novamente, por uma questão de contribuir para a pacificação de seu país, fraturado entre os "leais a Evo" - principalmente camponeses indígenas - e as classes média e alta urbanas que rejeitam sua tentativa de se manter no poder.
O governo López Obrador não se pronunciou sobre o protesto.