O Globo/LD
ImprimirO ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, confirmou que vai se licenciar do cargo para voltar à Câmara dos Deputados e apresentar um pedido de impeachment contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso. Em entrevista ao canal governamental "NBR", Marun destacou que está em processo de redigir o pedido de afastamento do magistrado, que modificou o indulto natalino do presidente Michel Temer. A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) classificou os ataques do governo como uma "estratégia para constranger o STF" e rejeitou "a represália a magistrados no processo de limpeza das instituições".
Na segunda-feira, Barroso determinou que condenados por crimes do "colarinho branco", como corrupção e peculato, não podem ser beneficiados pelo indulto de Natal. No despacho, o ministro autorizou a libertação de presos que não tenham cometido crimes de forma violenta. A avaliação do governo é de que o indulto é prerrogativa do chefe de Estado, Temer, e que o magistrado feriu esta competência ao reescrever o benefício. O juiz, por sua vez, alegou que a punição aos corruptos é importante para coibir a prática.
"(Essa decisão) Quebra, agride, é um desrespeito à Constituição. Os ministros do STF não existem para inventar a Constituição. Estão ali para cumprir a Constituição (...) Tenho a convicção de que o pleno (da Corte) vai fazer com que esse absurdo seja revogado. Fazer um novo decreto é síndrome de Luís XIV que avança pelo Brasil e que tem que ser contida", ressaltou o ministro da Secretaria de Governo, que ressaltou a possibilidade de os ministros, "no máximo", declararem a inconstitucionalidade do indulto.
Até domingo, o indulto estava integralmente suspenso por decisão da presidente do STF, Cármen Lúcia, que já havia considerado inconstitucional a concessão do indulto aos corruptos. Marun acusou Barroso de ser incoerente porque não teria se posicionado contra os indultos natalinos da ex-presidente Dilma Rousseff. Segundo o ministro, as medidas da petista beneficiaram petistas condenados por corrupção, como José Genoíno e José Dirceu.
"Em base da lei do impeachment, nós passamos a redigir esse pedido baseado na evidente atuação politico-partidária e na sua falta de decoro no momento em que se sentiu no direito de desrespeitar os três poderes da República. O cidadão pode pleitear. Para que não se estabeleça essa confusão, me licenciarei e farei a entrega no Senado desse pedido", confirmou.
O ministro ainda negou que a reação do governo seja uma forma de constranger o magistrado. Na visão de Marun, que disse não ter ouvido a manifestação da Ajufe, trata-se de "deter o espírito absolutista e até mesmo messiânico" na atuação de Barroso.
'GRAVÍSSIMO', DIZ ESPECIALISTA
O professor Daniel Sarmento criticou a decisão de Carlos Marun. Titular da cadeira de Direito Constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Sarmento classificou de "absurda" e "gravíssima" a ameaça do auxiliar do presidente Michel Temer contra um ministro do STF. Barroso é relator do inquérito em que Temer é investigado por suposta irregularidades na edição do decreto dos portos.
— Li a entrevista que ele fala isso. É um absurdo. É uma violação grave do princípio constitucional de independência dos poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) querer afastar um ministro pelo conteúdo das decisões que ele profere. Um juiz não pode ser punido porque uma maioria discorda de uma decisão dele — disse o professor.
Para ele, a manobra contra Barroso tem uma motivação nada republicana. O ministro estaria sendo atacado porque tem uma atuação muito forte contra a corrupção.
— É gravíssimo — afirma Sarmento.