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ImprimirCom fraude na licitação, superfaturamento e desvio de dinheiro, o ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB) deixou mais de R$ 45 milhões de prejuízo nos cofres do Governo de MS. É o que aponta o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) na investigação do contrato do Sigo, sistema usado pela segurança pública estadual.
A investigação virou ação civil pública e pede nulidade de contrato de R$ 59,5 milhões e devolução de R$ 45.180.000,00 pela Compnet Tecnologia Ltda (CNPJ 14.164.094/0001-49).
Segundo as investigações, o esquema montado na gestão de Reinaldo como governador de Mato Grosso do Sul teria envolvido fraude na licitação, ilegalidades administrativas e superfaturamento. Tudo para alimentar os desvios milionários dos cofres públicos estaduais.
Apesar da gravidade dos flagrantes, a morosidade e as mudanças aprovadas pelo Congresso Federal na legislação de combate à corrupção viram ‘brecha’, já que a ação é anterior à nova Lei de Improbidade.
No entanto, vale ressaltar que, em 10 anos, o Estado pagou R$ 104 milhões à Compnet.
Segundo o promotor de Justiça Adriano Lobo Viana de Rezende, da 29ª Promotoria de Justiça do Patrimônio Público de Campo Grande, desde a licitação de Reinaldo Azambuja (PSDB) até a prestação dos serviços estão comprovados crimes de corrupção.
Reinaldo pagou valor previsto para 4 anos de contrato em 4 meses
Segundo o promotor de justiça, no ano de 2018 há pagamentos duplicados e até mesmo por serviços nunca prestados. “Importante consignar que naquele ano, em pouco mais de 4 meses, foi pago todo o previsto para 48 meses de contrato”, resume.
Para ‘esquentar’ os pagamentos que alimentavam o esquema, a gestão do ex-governador Reinaldo Azambuja efetuou pagamentos muito acima dos valores de mercado por UST (Unidade de Serviço Técnico). Assim, o Governo de MS chegou a pagar R$ 145 por UST, quando o valor de mercado estava na faixa de R$ 75.
O promotor destacou, ainda, a falta de controle do governo sobre as USTs executadas pela Compnet, com o flagrante pagamento além do contratado, entre 19 de abril a 22 de novembro de 2018. Funcionários trabalhariam 23 horas por dia para justificar horas pagas por Reinaldo
“Percebe-se que todos os funcionários incumbidos de manter e aprimorar os sistemas teriam que trabalhar 23 horas ao dia, cada um, para executarem o total de 56.860 UST’s no mesmo período. Fato este que não é crível, reforçando a prova do que já sabemos: houve desvio de dinheiro relativo ao pagamento destas UST’s”, pontua o promotor.
Segundo o relatório, somente com as horas infladas o desvio atingiu R$ 5.340.060,00.
Reportagem do Jornal Midiamax já havia tratado as denúncias de pagamentos além do contratado. Mensalmente, saem dos cofres públicos de Mato Grosso do Sul R$ 1.530.313,82 pelo contrato 32/2021/Sejusp, assinado em 22/06/2021, com valor inicial de R$ 58,4 milhões. De lá para cá, o contrato foi aditivado uma vez. Assim, o valor já é de R$ 59,5 milhões.
No entanto, A Compnet recebeu R$ 20,9 milhões do Governo do Estado a mais do que o valor do tal ‘Contrato do SIGO’, conforme informações públicas obtidas pelo Portal da Transparência. De acordo com o sistema, os valores já estão empenhados, liquidados e pagos.
“Na defesa apresentada durante o trâmite do processo, a Compnet sustenta que todas estas ilegalidades são de responsabilidade do Estado, o qual, por sua vez, silencia-se sobre os fatos”, indica o documento.
Quanto à cobrança ilícita, os empresários apenas aduzem que é problema do Estado a falta de previsão de controle, “é responsabilidade do ente contratante”.
“Serviços não realizados ou fictícios, superdimensionados ou em duplicidade são [de responsabilidade] exclusivamente da administração pública. Cabe à administração criar controles mais efetivos, e não à empresa”, crava a defesa da Compnet.
Entretanto, o promotor alega que o Estado ‘permanece silente quanto a isto’. “Esquecem os empresários que são eles os beneficiários destes pagamentos milionários, abusivos e ilegais obtidos graças à ilegal omissão do órgão público no controle de suas despesas”, pontuou Adriano Lobo.
Em resposta, a defesa da Compnet, representada pelo escritório Santana Haddad, alega que seria caso de aplicar a chamada “retroatividade da Lei Federal nº 14.230/2021” para declarar a extinção do processo, já que a ação é anterior à nova Lei de Improbidade.
Aponta ainda que o MPMS não teria ‘individualizado a conduta do réu com provas suficientes’. Ainda, a Compnet apresentou rol de testemunhas. Entre elas, oficiais da PM, servidores da Sejusp e até o ex-secretário de Segurança Pública, Antônio Carlos Videira.
Reinaldo: ‘nem faço parte do processo’
Apesar de revelar flagrantes de condutas criminais gravíssimas, a ação civil pública, por natureza, se limita a tentar reaver a fortuna desviada dos cofres sul-mato-grossenses e cessar os prejuízos.
Assim, o ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB), acionado pela reportagem do Jornal Midiamax para explicar os flagrantes de irregularidades durante a gestão dele como governador de MS, se limitou a dizer que nem faz parte do processo.
“Portanto não vou me manifestar”, esnoba o ex-governador de MS e atual presidente estadual do PSDB.
A assessoria do Governo de MS também foi acionada, mas até o momento não se manifestou sobre a ação civil pública que pede nulidade do contrato do Sigo.
No entanto, no fim de julho, a CGE-MS (Controladoria-Geral do Estado de Mato Grosso do Sul) aplicou multa de R$ 11.382.146,67 à Compnet Tecnologia Ltda. (CNPJ 14.164.094/0001-49) após detectar fraudes no contrato.
Conforme apurado pelo Jornal Midiamax, a CGE-MS teria identificado irregularidades na composição dos preços pagos pelo Estado em relação aos serviços prestados pela Compnet.
O escritório Santana e Haddad, que defende a empresa na ação, também foi procurado pela reportagem. Mas os advogados não enviaram posicionamento sobre o caso até o momento de publicação deste texto.
Todos os contatos foram devidamente documentados e o Jornal Midiamax segue à disposição para levar os posicionamentos dos envolvidos aos leitores, mesmo após a publicação da reportagem.
Conforme revelado por reportagem publicada pelo Jornal Midiamax em maio, houve obscuridades no contrato. Uma delas seria sobre pagamentos pelos bloqueadores de sinal de celular em presídios, que seria de responsabilidade da Compnet.
O que se sabe é que não funcionam.
Foi apurado pela reportagem que os bloqueadores entraram como ‘brinde’ pelo contrato milionário firmado pela Compnet com o Governo do Estado. No entanto, sem fiscalização, o serviço não foi prestado.
Já o sistema Sigo é alvo constante de reclamações. O sistema é usado por cerca de 18 mil usuários, que vão além das forças policiais, incluindo também advogados, imprensa e o próprio Ministério Público.
Assim como os bloqueadores, o sistema também vem apresentando diversos problemas e deixado a população sem acesso até ao registro de BOs em casos de violência doméstica contra mulheres.