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ImprimirEm vez de passar um rolo compressor em uma montanha de eletrônicos contrabandeados, a Receita Federal agora encaminha os equipamentos falsificados apreendidos para um tipo de reciclagem que vai transformá-los em novos produtos.
A tarefa é feita pela Sinctronics, empresa criada em 2012 justamente para reaproveitar produtos da indústria eletrônica, dentro de uma lógica de economia circular.
"A gente transforma em matéria-prima nova produtos falsificados que antes a Receita mandava para destruição. É um cliente que nos apoia", explica Carlos Ohde, diretor-geral da empresa, que é uma unidade de negócios da norte-americana Flextronics no Brasil. O executivo será um dos participantes do debate "Economia Circular - Um Jeito Novo de Produzir e Consumir", nesta terça-feira (18), no auditório da Folha, no primeiro evento da série Diálogos Transformadores de 2017.
Desde 2013, 12,4 mil toneladas de equipamentos já foram processadas. O modelo de negócio da Sinctronics surgiu para explorar um nicho em um contexto bem brasileiro, o de ser um grande consumidor e, ao mesmo tempo ter, uma grande indústria de eletroeletrônicos.
"Com as duas coisas geograficamente próximas, a gente achou que o certo a se fazer era transformar o resíduo eletroeletrônico em matéria-prima para produtos novos", explica Ohde, sobre o fato de a empresa ter ido além da simples reciclagem e ter se tornado referência mundial em economia circular.
"Na época, a gente nem conhecia o termo, mas ao descobrirmos essa teoria circular isso nos ajudou a aprimorar alguns processos. Reaproveitar matéria parece uma ideia natural. Economicamente faz sentido, ambientalmente também."
Nos Estados Unidos, o cenário é diferente, pois embora seja um grande consumidor de eletrônicos, os equipamentos são produzidos na Ásia. "Então para reaproveitar o material, teria que fazer um transporte intercontinental. E aí fica muito caro. Economicamente é muito mais desafiador criar um modelo desses, seja dos EUA, ou da Europa, para Ásia, do que fazer aqui no Brasil."
Segundo Ohde, por conta da lei de informática, o país tem uma base de produção grande, com várias empresas de peças, equipamentos, embalagens. "E essa matéria-prima retorna para economia local", explica.
CLIENTES
A Sincronics tem cerca de 30 clientes, entre eles gigantes como a HP. "É uma empresa que sempre lidera essa questão ambiental e chegaram para a gente com o desafio: 'Criem um plástico reciclado branco'. Uma coisa inédita. Eles nos incentivaram, e a gente foi atrás pra desenvolver um processo. E no final, viraram nossos clientes."
A empresa hoje é a única que usa plásticos de uma impressora usada para fazer uma nova ou o plástico de um cartucho de toner para fazer notebook. "Isso é único aqui do Brasil", diz.
O diretor da Sinctronics relata ter recebido visitas de vice-presidentes de sustentabilidade de duas grande fabricantes globais. "Eles falaram que aqui é a operação mais completa que viram no mundo. Não é uma operação grande, já que emprega cem pessoas, mas é única quando consideramos de ponta a ponta, já que a gente transforma o eletrônico usado em peça nova. Isso não existe em lugar nenhum no mundo."
Esse ano, a empresa brasileira recebeu um reconhecimento do Fórum Econômico Mundial, pela contribuição na economia circular.
"Também recebemos um convite para apresentar nosso caso em Helsinque, na Finlândia, num congresso de economia circular. Apesar da teoria lá na Europa fazer muito sentido –e a teoria de economia circular é fantástica–, do ponto de vista prático quem conseguiu montar alguma coisa nessa área de eletroeletrônicos fomos nós. Outros países não têm ainda as condições necessárias."
INÉRCIA
Ohde explica que, embora algumas empresas sejam parceiras, outras só se mexem quando há uma lei que as obrigue. "Tem muitas empresas que preferem ficar na inércia", afirma.
A regulação, nesse caso, segue a Política Nacional de Resíduos Sólidos, sancionada em 2010. O problema é que, para entrar em vigor de fato, é preciso que cada segmento crie seu próprio acordo setorial. Na área de eletrônicos, a previsão é a de que o acordo seja firmado até o final deste ano.
"Com o aumento de volume, não vai precisar da lei, porque vai ficar economicamente viável. Vai ser uma coisa natural", explica Ohde. A lei é uma coisa que força as empresas a fazerem, mas quando você tem um apelo econômico o modelo se puxa sozinho", complementa.