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08/05/2018 06:50:00
Após uma semana, o que se sabe sobre o desabamento do prédio no Centro de SP?
Poder público diverge sobre qual esfera deveria assumir Edifício Wilton Paes de Almeida, e lideranças da ocupação irregular se esquivam.

G1/PCS

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Bombeiros trabalham nos escombros do prédio que desabou após incêndio no Largo do Paissandu, em São Paulo (Foto: Marcelo Brandt/G1)

Sete dias após o desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida, no Centro de São Paulo, muitas dúvidas ainda pairam sobre a pilha de escombros que se formou ao lado do Largo do Paissandu.

Até o momento, os bombeiros confirmam apenas uma morte, de Ricardo Pinheiro, o Tatuagem, cujo corpo foi encontrado na última sexta-feira (4). As buscas por sobreviventes continuam, e muitos dos moradores cadastrados pela Prefeitura não foram localizados após o desabamento.

Entre as lideranças do movimento que coordenava a ocupação, muitas questões permanecem sem resposta, sobretudo o papel de Ananias Pereira dos Santos, apontado como líder da organização (o que ele nega).

Prefeitura, União e Ministério Público também divergem sobre as responsabilidades de cada um quanto ao edifício.

Veja o que se sabe até agora e o que precisa ser explicado:

De quem era o prédio?

Edifício Wilton Paes de Almeida, no Largo do Paissandu, quando já era ocupado por moradores sem-teto (Foto: Reprodução/TV Globo)

O edifício Wilton Paes de Almeida pertencia ao governo federal desde 2002. A Secretaria do Patrimônio da União (SPU) é o órgão responsável por gerir os imóveis de propriedade federal, subordinado ao Ministério do Planejamento.

Projetado em 1961 pelo arquiteto Roger Zmekhol, era considerado um dos prédios comerciais mais luxuosos da época. Foi construído para ser sede da Cia. Comercial Vidros do Brasil (CVB). De estrutura metálica e lajes em concreto, tinha 24 andares e ficava na região do Largo do Paissandu. Foi um dos primeiros da cidade a adotar o estilo “pano de vidro”, que se difundiu nas décadas seguintes em prédios comerciais.

Após passar para as mãos do Estado, em razão de dívidas dos proprietários, foi sede da Polícia Federal e do INSS.

Em 1992, o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) havia tombado o prédio.

O edifício foi colocado para leilão em 2015, por R$ 24 milhões, mas ninguém o adquiriu. Em 2017, o imóvel foi cedido para a Prefeitura de São Paulo para a instalação da Secretaria da Educação e Cultura da cidade, segundo o Ministério do Planejamento. No entanto, o processo de transferência não havia sido finalizado.

Desde quando o prédio era ocupado por moradores sem-teto?

Varal em frente a janela do edifício Wilton Paes de Almeida, ocupado por moradores sem-teto (Foto: Reprodução/TV Globo)

O edifício ficou totalmente vazio a partir de 2003, quando a Polícia Federal se transferiu para a atual sede, na Lapa, Zona Oeste, e sofreu diferentes ciclos de ocupação irregular desde então.

A Prefeitura de São Paulo informou que foram cadastradas 248 pessoas, de 92 famílias, no local. Imagens mostram que, ao menos entre 2015 e 2017, havia ali uma faixa do Movimento Social de Luta por Moradia (MSLM).

O Ministério Público (MP) confirmou que o grupo, de fato, ocupava o edifício. Após o desabamento, porém, integrantes do movimento e moradores divergem sobre quem exercia a liderança e como o imóvel era gerido (leia mais abaixo).

Como o fogo começou?

O incêndio que provocou o desabamento do prédio na madrugada de terça-feira (1º) foi causado por um curto-circuito em uma tomada no 5º andar, segundo depoimento de uma sobrevivente à polícia.

Walkiria Camargo dos Nascimento disse em depoimento que o fogo começou na tomada do espaço em que morava e onde estavam ligados três aparelhos eletroeletrônicos: micro-ondas, geladeira e TV.

Na hora do incêndio, por volta de 1h30, todos dormiam. Walkíria contou que, ao ver o fogo, ela pegou o bebê de dez meses e desceu para a rua. O marido dela foi salvar a filha de 3 anos e foi atingido pelas chamas. Está com 75% do corpo queimado. A menina está internada na UTI do Hospital das Clínicas.

Inicialmente, moradores levantaram a possibilidade de o fogo ter começado devido a uma briga de casal ou ao estouro de uma panela de pressão.

Quantas pessoas morreram? Quantas estão desaparecidas?

Ricardo Pinheiro, que estava prestes a ser resgatado quando o prédio desabou, é único morto confirmado até o momento (Foto: Reprodução/TV Globo)

Oficialmente, o Corpo de Bombeiros confirma a morte de Ricardo Oliveira Galvão Pinheiro, conhecido como Tatuagem. Ele estava prestes a ser resgatado por bombeiros posicionados no prédio vizinho quando o prédio desabou. Seu corpo foi encontrado na sexta.

Também oficialmente, o Corpo de Bombeiros trabalha com seis desaparecidos:

Selma Almeida da Silva, 40;

Welder, 9, filho de Selma;

Wender, 9, filho de Selma;

Eva Barbosa Lima, 42;

Walmir Sousa Santos, 47;

Artur Hector de Paula, 45.

Dados do Corpo de Bombeiros apontam também que outros 44 moradores do prédio não se apresentaram para o recadastramento e são consideradas não localizadas - o que não quer dizer, porém, que estejam debaixo dos destroços.

Uma pessoa passa a ser considerada desaparecida oficialmente quando algum parente ou conhecido reporta o fato às autoridades.

Bombeiros afirmam que ainda há chances de encontrar sobreviventes.

O poder público sabia das condições de segurança do prédio?

Sim, mas houve uma sucessão de transferência de responsabilidades. Segundo um relatório da Prefeitura, obtido com exclusividade pela TV Globo e finalizado pela Secretaria Municipal de Licenciamento em 26 de janeiro de 2017, o prédio não tinha condições mínimas de segurança contra incêndio.

Veja o que o documento indicou:

Ausência de extintores;

Sistema de hidrantes inoperante;

Ausência de mangueiras;

Ausência de luzes de emergências;

Ausência de sistema de alarme;

Instalações elétricas irregulares: fios sem isolamento adequado e expostos, além entrada de energia improvisada;

Elevadores inoperantes e fechados por tapumes;

Ausência de corrimão nas escadas;

Instalações do sistema de para-raios não puderam ser avaliadas, pois acesso estava bloqueado.

Em 13 de novembro de 2017, o Ministério Público Federal havia recomendado à Superintendência do Patrimônio da União em São Paulo (SPU) que providenciasse uma reforma estrutural emergencial no prédio, preservando suas características arquitetônicas, e que fossem instalados equipamentos de segurança e proteção contra incêndio.

Em resposta, no dia 21 de novembro de 2017, o superintendente da União, Robson Tuma, afirmou que "priorizou a destinação do imóvel ao ente municipal (Prefeitura), que manifestou interesse em nele instalar equipamentos voltados às atividades culturais".

A SPU também afirmava que a Prefeitura poderia providenciar a desocupação do imóvel e que comunicaria as recomendações do MPF à administração municipal, solicitando providências para a desocupação do imóvel e da apresentação de um projeto.

Na última quarta-feira, o Ministério Público Federal instaurou um inquérito para apurar a responsabilidade pelo incêndio e desabamento do edifício.

Agora, a dúvida é quem deveria ter dado um destino ao prédio. O governo federal, que é o dono do imóvel, e a Prefeitura da capital, que cadastrou os moradores num programa de moradia, tentavam chegar a um acordo sobre isso.

A (Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) afirmou que havia feito uma avaliação do imóvel em 2003, quando recebeu uma proposta da União para assumir o edifício, que constatou problemas na estrutura.

Quem são os líderes que tomavam conta da ocupação?

Foto: Reprodução/G1

Ananias Pereira dos Santos, de 48 anos, foi apontado por moradores como o líder do movimento por moradia responsável pela ocupação. Ele é acusado de embolsar e não reverter para os moradores em serviços e reparos os até R$ 400 mensais pagos por família de taxa de manutenção, mas afirma que trabalha como autônomo.

Após prestar depoimento no 3º Distrito Policial (DP), que é responsável pela investigação da tragédia, Ananias negou ter envolvimento com qualquer movimento por moradia. Ao Fantástico, disse que conhecia moradores do Wilton Paes de Almeida porque já tinha morado em ocupações e que chegou a visitar os desabrigados que permanecem acampados no Largo do Paissandu.

Os moradores negam a versão de Ananias, afirmando que ele não foi visto na região desde o incêndio.

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