Estadão/PCS
ImprimirCom o anúncio do governo dos Estados Unidos enquadrando o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), na Lei Magnitsky, na tarde desta quarta-feira, 30, essa se torna a primeira vez que uma autoridade de país democrático é punida pela lei.
Desde a semana passada, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que tem trabalhado ativamente nos Estados Unidos contra os interesses econômicos brasileiros e a soberania nacional, vinha afirmando que sanções também poderiam atingir os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). A afirmação de Eduardo estenderia os ataques americanos contra os Poderes brasileiros também ao Legislativo, do qual o próprio filho de Bolsonaro faz parte.
Até o momento, a norma só havia sido aplicada para violadores graves dos direitos humanos, como autoridades de regimes ditatoriais, integrantes de grupos terroristas e criminosos ligados a esquemas de lavagem de dinheiro e de assassinatos em série.
Entre os casos emblemáticos estão:
assessores diretos do príncipe Mohammed bin Salman, da ditadura da Arábia Saudita, responsabilizados pelo assassinato do jornalista Jamal Khashoggi;
o ditador da Chechênia, Ramzan Kadyrov, acusado de execuções extrajudiciais; integrantes de grupos terroristas do Iraque e do Afeganistão;
dirigentes do Partido Comunista Chinês punidos por comandar políticas de repressão sistemática no país.
Na América do Sul, foram punidos:
membros de facções criminosas com conexões no Brasil;
envolvidos em lavagem de dinheiro e evasão de divisas;
o ex-presidente do Paraguai Horacio Cartes, punido após deixar o cargo, sob a acusação de envolvimento em esquemas de corrupção e lavagem de recursos.
Quais são as punições estabelecidas pela Lei Magnitsky?
Proibição de entrada nos EUA: o punido pela Lei Magnitsky é impedido de ingressar no território norte-americano. Caso o alvo da medida já possua um visto de entrada, o documento é revogado.
Bloqueio de bens e propriedades: a Lei Magnitsky prevê o bloqueio dos bens e propriedades do punido que estejam localizados no território norte-americano.
Proibição “extraterritorial” de prestação de serviços: a medida também impõe sanções que devem ser cumpridas por todas as entidades que operem sob leis americanas ou mantenham relações econômicas com os Estados Unidos. Isso significa que todas as empresas que possuam ativos nos Estados Unidos devem restringir o acesso do alvo da sanção aos seus serviços, o que inclui instituições financeiras e plataformas de tecnologia. Dessa forma, o punido é impedido de acessar serviços bancários e de ter contas em redes sociais. O texto da Lei Magnitsky expressa que a sanção é “extraterritorial”, ou seja, o bloqueio deve ocorrer mesmo que a prestação de serviços ocorra fora dos limites territoriais dos Estados Unidos.
Quantas vezes a Lei Magnitsky foi usada?
Segundo um levantamento da entidade Human Rights First, que atua na promoção de direitos humanos, a Lei Magnitsky foi aplicada 48 vezes durante o segundo semestre de 2024. O rol de punidos inclui violadores graves de direitos humanos, como autoridades condenadas por tráfico humano, torturas e repressão violenta de protestos.
A mais recente aplicação da Lei Magnitsky é de 9 de julho. Membros do Partido Comunista da China foram punidos pela violação de direitos humanos dos uiguris, povo que habita o oeste do país asiático.
Como é o trâmite desta lei?
A iniciativa de sanções pela Lei Magnitsky parte do presidente dos Estados Unidos e deve ser aprovada pelo Congresso do país. O Partido Republicano detém maioria nas duas Casas do Poder Legislativo.
Para deixar o rol de punidos pela Lei Magnitsky, o alvo da medida deve provar ao governo norte-americano que não possui relação com os fatos que levaram à punição, que já respondeu na Justiça pelos atos ou que mudou de comportamento de forma significativa.
Uso da Lei Magnitsky contra uma democracia é inédito
O uso da Lei Magnitsky contra uma autoridade de um país democrático é inédito. O Brasil é considerado uma democracia pelo próprio Departamento de Estado dos Estados Unidos, que realiza relatórios anuais sobre direitos humanos e liberdades políticas ao redor do mundo. A última edição disponível do relatório é do ano de 2023. O verbete sobre o Brasil destaca que o país registra “judiciário efetivo, sistema político democrático e funcional e garantia de direitos de expressão, incluindo membros da mídia”.