Folha/PCS
ImprimirCom debate polarizado e ânimos acirrados nas redes sociais, candidatos das principais capitais do país se queixam do aumento de notícias falsas na reta final das eleições. Assim tem sido a última semana de campanha principalmente no Rio de Janeiro, em Recife e em Porto Alegre. A votação do segundo turno será no domingo (29).
Nessas três cidades, apoiadores intensificaram a artilharia contra os adversários, muitas vezes com ataques pessoais, ofensas e acusações falsas ou sem provas.
Com as pesquisas indicando uma vitória de Eduardo Paes (DEM) no Rio de Janeiro, a campanha teve uma subida no tom de ataques, com fake news, manipulação do medo e agressividade por parte dos apoiadores de Marcelo Crivella (Republicanos).
Pesquisa Datafolha divulgada em 19 de novembro mostra Paes com 71% das intenções de votos válidos, contra 29% do adversário. Em desvantagem, Crivella radicalizou o discurso na tentativa de consolidar o voto evangélico e conservador a seu favor.
Recentemente, o bispo licenciado da Igreja Universal associou um eventual governo Paes à pedofilia nas escolas.
Em vídeo que circula nas redes, Crivella diz que o PSOL vai indicar o secretário de Educação em um eventual governo Paes –o que tanto o candidato como a sigla negam. Na sequência, o atual prefeito cogita "pedofilia nas escolas" como consequência da aliança.
Nas ruas, panfletos com a fake news foram distribuídos na porta de uma Igreja Universal do Reino de Deus. O material associava Paes a legalização do aborto, liberação das drogas e kit gays nas escolas. Também trazia uma foto do ex-prefeito ao lado de uma imagem do deputado Marcelo Freixo (PSOL), que não é aliado de Paes na disputa.
Paes foi às redes rebater as acusações de Crivella repetindo a expressão "pai da mentira", usada pela primeira vez em debate na TV aberta e desde então replicada nas redes por seus apoiadores.
"Agora as fake news são sobre uma inexistente aliança com o PSOL, legalização do aborto, das drogas e ideologia de gênero", escreveu o candidato junto do vídeo que nega a aliança com o partido de esquerda.
"Pai da mentira" foi usada contra Crivella pelo menos 488 vezes no Facebook e no Twitter desde o último dia 19, segundo o Buzz monitor Trends, ferramenta de monitoramento de redes sociais do Elife Group.
No Twitter, a publicação com maior engajamento é a do influenciador Felipe Neto, que tem 12,6 milhões de seguidores."Bateu onde dói, comparou o pastor com o demônio. Tá errado?", escreveu o youtuber em publicação curtida mais de 17 mil vezes. Segundo textos bíblicos "pai da mentira" significa "diabo".
Levantamento da Buzz monitor feito entre os dias 15 e 24 de novembro mostra que o atual prefeito teve mais menções no Twitter do que o adversário: foram 21.282 posts (de 16.256 usuários distintos), contra 7.430 de Eduardo Paes (feitos por 6.399 usuários).
Os dois tiveram maioria de menções negativas. Mas, proporcionalmente, Crivella teve um desempenho menos ruim: foram 3% de posts positivos, além de 28,6% de neutros e 68,4% de negativos. Paes teve 1,6%, 22,2% e 76,2%, respectivamente.
Apesar de ser proporcionalmente menos citado negativamente nas redes, Crivella está em desvantagem na disputa eleitoral, segundo as pesquisas. O levantamento sugere, então, que atuação da militância do prefeito nas redes não tem convertido votos para o bispo licenciado.
A quantidade de menção negativa sobre Paes enquanto ele lidera com larga vantagem a corrida eleitoral indica também a atuação de milícias digitais.
Desde o início do segundo turno, Crivella e Paes têm feito da campanha um vale-tudo eleitoral.
Menos de 24 horas após ter avançado ao segundo turno, o atual prefeito da cidade, Marcelo Crivella, deu o tom da campanha em um pronunciamento duro contra o adversário.
Ele acusou Paes de ter feito o governo "mais corrupto da história" do Rio de Janeiro e o relacionou a Sérgio Cabral, ex-governador do estado preso desde 2016 após denúncias da Operação Lava Jato. O candidato do DEM foi prefeito do Rio de 2009 a 2016. Na época, era filiado MDB, mesmo partido de Cabral. Dias depois, Crivella repetiu a acusação no Facebook. Escreveu que, durante debate, Paes fugiu das perguntas sobre o tema. O ex-prefeito nega as acusações e diz ser "ficha limpa".
Também na capital pernambucana, as campanhas têm sido contaminadas por fake news. Panfletos distribuídos em Recife associam a candidata do PT Marília Arraes a propostas que não aparecem em seu plano de governo, entre elas a legalização das drogas e do aborto. "Cristão de verdade não vota em Marília Arraes", diz o material.
A candidata petista conseguiu que Justiça Eleitoral determinasse a retirada de um programa eleitoral do adversário João Campos (PSB) também com citação religiosa falsa.
Na televisão, a peça dizia que a petista é contra a bíblia e o Prouni municipal. A Justiça Eleitoral considerou a propaganda descontextualizada e que tenta "confundir o eleitorado".
O candidato do PSB mudou o tom após as pesquisas mostrarem melhor desempenho da petista. De acordo com Datafolha publicado no dia 19, Arraes tinha 55% dos votos válidos, contra 45% de Campos.
Na encruzilhada imposta pelo novo desenho da disputa, João Campos passou a investir em ataques com forte teor antipetista. Nas primeiras inserções publicitárias do segundo turno na televisão, o deputado relembrou dirigentes do PT que integraram o governo durante o escândalo do mensalão.
"Você lembra quem faz parte do PT nacional? José Dirceu, Gleisi Hoffmann, Mercadante. Pense antes de votar. Eles querem voltar", diz a propaganda, que mostra um avião decolando em direção à capital pernambucana.
No Twitter, levantamento da Buzz monitor mostra que João Campos foi mais mencionado que a adversária Marília Arraes desde o dia 15.
A petista, porém, teve proporcionalmente mais publicações com mensagens positivas. Mencionada 9.037 vezes, Marília teve compartilhada 19,1% publicações positivas. Já Campos foi citado em 10.418 posts, mas com apenas 3,4% deles com comentários positivos.
Do Nordeste para o Sul, em Porto Alegre, a candidata Manuela D'Ávila (PC do B) também tem dedicado parte dos programas eleitorais na TV e no rádio na tentativa de desconstruir o impacto na campanha causado por notícias falsas.
Ela vem mostrando depoimentos de pessoas que afirmam ter recebido fake news. Nessas mensagens, Manuela é atrelada, por exemplo, à implantação de um "regime comunista" na capital gaúcha e à uma gestão que seria importada da Venezuela.
"Até que eu ia derrubar a igreja inventaram esses dias", afirma Manuela no programa.
No início da campanha, a candidata se viu obrigada a se manifestar sobre notícia falsa que circulou nas redes sociais e a vinculava a uma peça de campanha no Dia das Crianças com foto de foice e martelo de brinquedo.
Ela também tem sido vítima de montagens de cunho religioso. Uma imagem falsa mostra a candidata vestindo uma camisa com a mensagem "Jesus é travesti".
A Justiça Eleitoral determinou a retirada de meio milhão de compartilhamentos de conteúdos falsos compartilhados contra Manuela no Facebook, Instagram, Twitter e YouTube. No total, as postagens somaram 529.075 compartilhamentos.
Manuela tem forte participação nas redes sociais. No Twitter, o levantamento da Buzz monitor mostra que a candidata teve mais engajamento que o adversário desde o dia 15. Ela foi citada em 5.065 publicações, enquanto Sebastião Melo (MDB) teve 1.947 menções.
Embora tenha tido o nome mais citada nas redes, a exposição da candidata do PC do B, porém, conferiu a ela mais menções negativas que as do adversário -87,2% contra 63,1%, respectivamente.
Na TV, Sebastião Melo (MDB) tem reclamado na propaganda eleitoral sobre o comportamento da adversária, que segundo ele faz afirmações fora de contexto para prejudicá-lo na corrida eleitoral. Ele nega, por exemplo, que tenha a intenção de acabar com a passagem de ônibus grátis para quem tem mais de 65 anos e responsabiliza Manuela pela informação falsa.
"E mais uma vez a Manuela, do partido comunista do Brasil e do velho PT do mensalão e da Lava Jato, está tentando confundir você", afirma um narrador em uma de suas peças exibidas no horário eleitoral.
No Twitter, desde que começou a campanha no segundo turno, os candidatos às prefeituras do Rio de Janeiro, Recife e Porto Alegre receberam mais de 50% de menções negativas.