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22/10/2020 18:29:00
STJ enquadra estupro de menina pelo pai na Lei Maria da Penha
Mesmo determinando a remessa da ação penal à vara especializada, a prisão preventiva do pai acusado de estuprar a filha foi mantida.

EC/PCS

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A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça reconheceu a incidência da Lei Maria da Penha sobre um caso de abuso sexual contra uma menina de quatro anos e determinou o envio do processo para o Juizado Adjunto Criminal e de Violência Doméstica.

O pai da criança foi preso preventivamente sob suspeita de estupro de vulnerável, sendo que o Tribunal de Justiça manteve a medida cautelar, assim como o trâmite do processo na vara criminal comum. Os ministros do STJ reformaram o acórdão.

Os juízos de primeira e segunda instância entenderam que, embora o crime tenha sido praticado por pai contra filha, no contexto familiar e doméstico, o crime não teria motivação de gênero para justificar a incidência da Lei Maria da Penha. Para eles, a agressão teria ocorrido em razão da idade da vítima, e não da vulnerabilidade decorrente do gênero feminino.

No entanto, os desembargadores da Sexta Turma apontaram que a Lei Maria da Penha não faz distinções quanto à idade das vítimas ou quanto à motivação do agressor, mas tão somente exige, para sua aplicação, que a vítima seja mulher e que a violência seja cometida em ambiente doméstico e familiar, ou no contexto de relação de intimidade ou afeto entre agressor e agredida.

As informações foram divulgadas pelo STJ. O caso corre sob segredo de Justiça.

Critério etário

Em seu voto, o relator do caso, ministro Rogerio Schietti Cruz, lembrou que a Lei Maria da Penha foi editada para proteger mulheres - sejam crianças, jovens, adultas ou idosas.

No caso, o ministro destacou que a agressão sexual teria ocorrido não apenas em ambiente doméstico, 'mas também familiar e afetivo, entre pai e filha, eliminando qualquer dúvida quanto à incidência do subsistema da Lei Maria da Penha, inclusive no que diz respeito ao órgão jurisdicional competente - especializado - para processar e julgar a ação penal'.

O relator ainda ponderou que há alguns precedentes sobre estupro de vulnerável em que o STJ afastou a incidência da Lei Maria da Penha com base na idade da vítima, por entender que não se configuraria uma motivação de gênero. No entanto, segundo o relator, seria descabido adotar um fator meramente etário para justificar a não incidência da Lei Maria da Penha e o afastamento de todo o seu arcabouço protetivo.

"As condutas descritas na denúncia são tipicamente movidas pela relação patriarcal que o pai estabeleceu com a filha", disse, ressaltando que o controle sobre o corpo da filha, a ponto de o agressor se considerar legitimado para o abuso sexual, é típico da estrutura de violência contra pessoas do sexo feminino.

Para Schietti, a prevalecer o entendimento do tribunal de segunda instância, 'crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica - segmento especial e prioritariamente protegido pela Constituição da República (artigo 227) - passariam a ter um âmbito de proteção menos efetivo do que mulheres adultas'.

"A Lei Maria da Penha nada mais objetiva do que proteger vítimas em situação como a da ofendida destes autos. Os abusos por ela sofridos aconteceram no ambiente familiar e doméstico e decorreram da distorção sobre a relação decorrente do pátrio poder, em que se pressupõe intimidade e afeto, além do fator essencial de ela ser mulher", afirmou.

Manutenção da prisão

Mesmo determinando a remessa da ação penal à vara especializada, Rogerio Schietti manteve a prisão preventiva do pai acusado de estuprar a filha. O ministro disse que o reconhecimento da incompetência do juízo criminal comum não torna nulos os atos processuais já praticados - como a decretação da prisão -, os quais podem ser ratificados ou não pelo juízo especializado.

O relator citou precedentes para demonstrar que, para a jurisprudência do STJ, a modificação da competência não invalida automaticamente a prova produzida de forma regular.

Quanto à prisão em si, o ministro considerou que a decisão que a determinou possui fundamentação idônea, baseada especialmente na reiteração de crimes sexuais imputados ao acusado e na maneira como o delito teria sido praticado, sendo 'plausível o prognóstico de que a liberdade do réu implica perigo não apenas à vítima, mas também a outras pessoas'.

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